sábado, dezembro 14, 2019
Veio sentar ao meu lado
Essas aventuras são tão boas, que se deseja permanecer no
enlevo, como se o momento fosse eterno. O namorado me olhava,
eu pensava. Meus seios. Conheci-o fazia algumas semanas. Passeávamos, apenas.
Eu, como já não sou jovem – digamos, vou pela meia idade –, deveria ser um
tanto mais atirada? Acho o motivo inconsciente, ou mesmo porque sou
escolada. Já passei por tantas situações, melhor a precaução. Mas como a precaução
diante do impulso amoroso, sexual? A paixão sempre vence. Caso o resultado
fosse o contrário, o mundo seria outro, menos conflituoso. Insensatez dizer que
sempre deve vencer a razão. É o que desejamos, ou melhor, o que quer o
conjunto das opiniões. Cada um, no entanto, arrefece diante da sua tentação.
Não há, aqui, vencedor. O namorado me olhava. Eu sorria. Havíamos passeado durante
a tarde, um parque arborizado, imenso, verdejante. A primavera. Procurava eu
uma árvore, isso mesmo, estranho num lugar de tanta vegetação eu procurar
precisamente uma árvore específica. Explicação: florescia pouco, por isso a
raridade. As flores tão bonitas. Andamos de norte ao sul, leste a oeste. Onde a
árvore? Descobrimos várias, mas não tive certeza se era a dita. Tantas
flores sobre muitas. No final, entardecia. O namorado abraçou-me. Que tal um
café, ou um suco, um copo d’água, não sei? Procuramos, encontramos numa das
extremidades, a pequena cantina, digamos assim. Tão bom o ar, sussurrei ao seu
ouvido. Beijou-me. Não sou beijada em público faz tempo. Beijo demorado, bocas,
línguas. As pessoas envolvidas nos seus prazeres não tinham tempo de nos olhar. Melhor assim. Andamos pela avenida, anoitecia, ruídos de automóveis,
pessoas a passear, famílias a terminarem o domingo, felizes. Entramos numa rua
transversal, atravessamos, pessoas nas calçadas. Voltávamos. Que tal
descansarmos lá em casa?, sugeriu. Sim. Estava calor, anunciava o verão. Seria
quente o verão. O namorado conduzia-me, mãos dadas, beijos ocasionais, sorrisos
cúmplices. Como arranjara o homem? Ah, uma palestra, sobre filosofia. As pessoas
procuram a filosofia, querem explicações. Eu também procurava. Ele pesquisava.
O sentido da vida? Não sei. Não há sentido para a vida. Não há explicação ao amor. Eu
vinha num namoro comigo mesma, mas apareceu o homem. Que tal a tentativa?
Desafiei-me. Aceitei. Pensei na Deia nua, envolvida pelas próprias mãos. Chegamos ao prédio
onde morava o homem. Um edifício alto. Dois elevadores. Oitavo andar. O ruído
de chave a destravar a fechadura, a porta aberta, uma saleta. Sentei no
estofado de dois lugares. Você mora aqui, exclamei. Aconchegante. Trouxe uma
garrafa d’água, o vidro suado, dois copos. Ou seriam dois corpos? Enchi o meu até
a metade. Adoro ficar nua, pensei sem motivo. Quem sabe o motivo? Todas gostamos de ficar nuas. Não ia, no entanto, tirar a roupa na casa do
namorado, de repente, à primeira vez. Mas estava tanto calor. Ele trouxe o
ventilador, apertou uma tecla, o vento começou a rondar da esquerda à direita,
da direita à esquerda, procurava-me, movimentos mecânicos. O homem continuou
premendo teclas. Agora, o aparelho de som, música instrumental. Posso tirar a
blusa?. Ele deu de ombros. Surpreso. Feliz. Tirei-a. Livrei-me também do sutiã.
Calça comprida, apenas, deixara o tênis à entrada. Seios nus. Fiz de conta que
era a coisa mais natural do mundo. Meus seios de fora, não sei se são caídos ou
rígidos, depende de quem olha, depende do ponto de vista. Nua da cintura para
cima. Grande prazer. Pus-me a rir. Por que você está rindo? Não sei, estou tão
feliz, feliz mesmo. Meus seios apontaram à face do namorado, espelho da minha
felicidade. Veio sentar ao meu lado.
segunda-feira, dezembro 02, 2019
Torce por mim
Oi, Janete, tudo bem? Você tá acostumada às minhas
mensagens escritas, mas agora achei melhor gravar, é mais rápido. Sempre me
contas tuas paqueras, não é mesmo? Hoje aconteceu uma coisa boa comigo, acho
que estou com sorte. Escuta, vou tentar resumir, depois te conto melhor,
pessoalmente. Vim à praia, aqui atrás da pousada, sabes qual é. Uma praia
deserta, o mar, o céu e, principalmente, o sol. Então, aconteceu. Surgiu um
homem. Lembra aquele que gerou a história do cavaleiro negro, num baile de máscaras,
no verão, acho que faz uns dois anos? O tal que surgiu aqui, parecidíssimo, achei
que fosse o mesmo. Nas areias, o homem imenso, de bermuda e sem camisa. Eu
quietinha no meu canto. Sabe quando a gente sente um frio no estômago, não se
imagina o que pode acontecer, ao mesmo tempo teme e deseja? Que situação.
Ele, a distância; eu, com minha revista. Não parecia ser perigoso, lógico que o
homem não ia me agarrar. Búzios é lugar civilizado, você conhece. Não demorou, veio
falar comigo, perguntou se me podia fazer companhia. Imagine se preciso de
companhia. Lógico que não disse assim a ele. Entonou a frase com uma ponta de
formalidade. Pois não, respondi, tentei fazer aquela fisionomia de enfado, de
quem não quer ser incomodada. Depois me arrependi, achei que podia entender como
uma recusa definitiva. Escutei o que tinha a dizer e, pouco a pouco, abri ligeiro
sorriso. Você deve estar doidinha pra saber o que ele disse, e mesmo o que
aconteceu, não? Não disse nada de mais, apenas que estava naquela praia pela
primeira vez, achava tudo muito bonito, queria comprar uma bebida mas não sabia
onde. Dei a dica, atrás, perto da pousada, uma venda. Mas ele não foi
imediatamente. Agradeceu, olhou demorado na direção do mar, não imaginava que
aqui fosse assim, tão encantador. Achei encantador mesmo o homem, porque, você
sabe, com a praia já estamos acostumadas. Disse volto já e subiu na direção da
rua. Desapareceu. Quando eu já me distraía de novo com a revista, ele voltou,
quase de repente, não cheguei a me assustar, mas foi por pouco. Trazia uma
garrafinha de suco, disse que estava fresca, eu não tinha aparência de beber
refrigerante, com a pele tão bonita, bem tratada. Elogios. Imagine, não
precisava se incomodar, sorri, bebi um gole. Uma mulher acenou pra ele lá de
cima. Ah, não, uma mulher, vai ver o homem tem compromisso. Me senti furiosa. Ele
atendeu, mas voltou rápido, com uma bebida vermelha nas mãos. A moça também
prepara coquetéis, mirou o copo. Ah, que bom, não era conhecido na cidade, eu
podia aproveitar. O que fazer, dali pra frente? Se eu der confiança, ele me
escapa, conheço os truques. Trabalho no Rio, não vivo quase aqui, pareceu
sincero. Ficou calado durante alguns minutos. Será tão, assim, sem assunto? Eu
também não queria assunto, você me conhece, sabe mais que ninguém o que desejo.
Mas melhor me manter comportada. Lembra minha aventura com o motociclista? Foi numa
praia mais pra baixo. Faz dois meses. Te contei. Fui passar o dia e conheci o
cara. Acabei saindo com ele, dar umas voltas de moto, de biquíni, na garupa. Meus
pertences na praia, minha preocupação. Não tem problema, aqui ninguém pega nada
dos outros, falou. Passeamos e passeamos, que tonta eu, logo fica noite, eu
pelada na garupa. É lógico, o homem não me quis só pra passear. Viver a mesma
coisa agora, não. Mesmo ardida como sou. Se venho à praia, é pela praia, eu
tentando me convencer. Conversamos, sim. Acabamos encontrando assunto. Fumou um
cigarro, me ofereceu. Se fumo? Fumei. Bebi um gole do seu segundo coquetel.
Comecei a ficar soltinha. Reparei o volume do pênis dentro da bermuda. Minhas carnes todas tremeram. Ui, quase perco o controle. Mesmo tendo molhado o biquíni, consegui me
segurar. Hoje, se dou alguma coisa, é só o número do telefone. Nada mais. Entrei
n’água, saí d’água, ele comigo. Não me tocou. Mais elegante, assim. Ele também se controlava. Os outros
querem logo deslizar as mãos. À tardinha, me despedi. Agora, vou
esperar ele telefonar. Acho que telefona, sim. Melhor, não é mesmo? Comportada.
Até estou me desconhecendo. Este não tinha moto. Mesmo que tivesse, não ia,
bastou aquela vez. Quem sabe aparece à noite. Hoje ou amanhã. Mais certo
amanhã. Prometeu. Beijo, Janete. Desculpe ter partido a mensagem em três ou quatro. Mas foi o jeito que arranjei pra te contar. Torce por mim, viu. A gente
se encontra.
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