sexta-feira, abril 20, 2007

Amores físicos em tempo real

Hoje vamos à aventura em tempo real. Munida dos mais recentes avanços da tecnologia, tento viver experiências de amor físico e relatá-las ao mesmo tempo. O local é Copacabana. Apesar de a praia ser muito iluminada, há um trecho onde a areia é comprida e permite a quem fica próximo ao mar algum esconderijo. É bem ali, por contraditório que possa parecer, diante do Meridien. Vou daqui a pouco, em torno da uma da madrugada. Quero viver fantasias, correr riscos. Algumas amigas chamam-me louca; talvez o seja, ao menos em parte, quem sabe...
posted by Margarida57 at 12:03 am

Já estou no local que, como ensaiei, me deixa anônima. Os encontros já foram agendados; são três os candidatos; que tenham sorte e sucesso. É possível ver as pessoas que andam sobre o calçadão, mas creio que não conseguem avistar-me. Sobre o corpo, trago apenas ligeira canga, que também há de me servir de forro, pois não quero grãos de areia pregados a meu corpo. Desenrolo o pano e sento-me sobre. Vento fresco alisa-me a pele enquanto espero amante que não tarda. O marulhar suave embala-me em doce modorra. Céu de estrelas fugidias derrama luz azulada. Ao me aconchegar nas sombras, surpreende-me voz masculina. Boa noite. Boa noite, respondo; morango?, dou a senha. Com chantilly, ele devolve. É este. Transamos. Antes me unta o corpo com óleo que diz afrodisíaco, depois desliza a ponta dos dedos sobre meu ventre, acaricia-me os seios, morde meus lábios e não demora a penetrar-me. Sinto-o quente, vibrante. Ele demora sobre meu corpo, pulsa pesado e enfim despeja-me líquido de homem pleno, viril. Beija-me uma das faces, toca-me o queixo; quer me pagar. Não sou prostituta, transo por prazer, às vezes por amor. Ele se vai; antes pergunta por outro encontro, talvez num apartamento suntuoso. Digo que vou pensar; não sei, não é bom repetir. Agora espero o próximo, virá às duas e meia.
posted by Margarida57 at 1:01 am

À hora marcada, descortino um vulto. Não cumprimenta. Morango?, pergunto. Com chantilly. É ele. Apresenta-se violento. Atira-me sobre a areia. Pega-me pelo meio das pernas, estica meus poucos pêlos, morde-me um dos ombros. Vaca, me xinga. Quero rir, mas não consigo. Acerta-me tapa vigoroso. Dou a outra face. Salpica-me areia, penetra-me áspero, me arranha. Perco a pele, sou carne viva. Sinto que não demora a explodir. A violência, porém, arrebata-me. Quero acompanhá-lo; sou amazona que cavalga atrasada sobre potro bravio, percorro terreno pedregoso, penetro densas florestas, salto obstáculos, protejo-me de galhos salientes, de armadilhas ocultas; quando o alcanço, arremesso-me, assalto-lhe as rédeas, emano meu rastro sobre seu corpo luzidio, lava de mulher madura, raras e provisórias pérolas violáceas que logo se dissolvem em líquido prateado, rio caudaloso que reflete o gozo das estrelas. Depois de satisfeito, parte abrupto. Leva-me a canga. Ei, volte aqui, não foi esse o combinado. Combinado?, só o preço. Lança as notas e foge. Não faço sexo por dinheiro, tento dizer, mas ele não escuta; como surgiu, desaparece. Às três e meia tenho outro. Espero? Não tenho alternativa.
posted by Margarida57 at 2:37 am

Às três horas vejo aproximar-se um jovem; deve ter pouco mais de vinte anos. Boa noite. Boa noite, digo. Morango? Ele parece não entender. Você gosta de morango?, insisto. Oh, prefiro abacaxi. Tento me conter; trata-se de um visitante imprevisto. Você está nua, diz. Parece, tento ser natural. E o que você faz aqui, nua? É melhor você não saber, vá embora, caso contrário a coisa pode ficar feia para o seu lado. Feia, como?, quer saber. Não vou dizer, aqui não é o seu lugar, espero um homem terrível, e tenho de estar assim, pelada, se ele descobrir algum estranho a meu lado é capaz de matá-lo, por favor, vá embora, não quero que você corra riscos. Ele olha amedrontado, vira-se tentando descobrir alguém que lhe venha pelas costas. Ainda insisto: vá, saia, agora; e fique calado. Ele se afasta.
posted by Margarida57 at 3:02 am

Transo com o terceiro da noite após as identificações de praxe. Ele sua. Parece que o fato de me ter encontrado nua o tornou mais excitado. Nada comenta sobre os arranhões ou a vermelhidão de meu rosto. Escala-me e permanece longo tempo. Gostou de me encontrar melada e suja de areia. Faz movimentos lentos, parece estar cavalgando. Sorri. Depois que goza, escorrega. Acende um cigarro, chega a chama do isqueiro próxima à minha cabeça, arranja-me os cabelos em desalinho. Quer pagar, chega a tirar o dinheiro. Não aceito, transo por paixão à vida, às vezes por amor a algum homem. Do jeito que você está, vai precisar de algum dinheiro. Sou rica, respondo. Sorri. Peço-lhe a camisa. A camisa?, não posso. Não tenho outra; arremessa longe o cigarro e parte. Não sei se o assustei.
posted by Margarida57 at 3:47 am

A madrugada se esvai. Não tenho mais ninguém programado. Sinto frio o estômago. Como faço para ir embora? Não posso voltar para casa andando nua pelas ruas de Copa, nem correr em direção ao calçadão e gritar aos caminhantes que já esporádicos aparecem: meu reino por uma calcinha! O jeito é não me desesperar; já saí de situações piores. Respiro fundo, tento controlar-me, ainda tenho algum tempo.
posted by Margarida57 at 4:27 am

Eis que reaparece o garoto das três horas. Ei, diz, quero falar com você. Você de novo?, finjo surpreender-me. Ele já se foi, você espera mais alguém? Não, venha cá. Ele se aproxima e eu o abraço, beijo-lhe a boca; sinto sua temperatura alta, seu coração se acelera. Você quer namorar comigo? Quero, responde animado. Então venha. Excito-o, solto-lhe o cinto, tiro-lhe as calças e agarro seu pinto. Está mais do que duro. Brincamos, esfregamo-nos. Ele quer me penetrar a todo custo. Deixa eu botar, quero gozar, diz. Seguro seu membro com firmeza. Sinto que ele não demora a ejacular; prendo-lhe então a extremidade com o polegar e tapo-lhe o canal por onde jorrará o seu prazer. Não posso deixar que ele goze, caso isso aconteça estarei perdida. Você quer ter uma transa completa comigo?, pergunto melosa. Quero. Então vamos lá pra casa, faço o convite. Eu já estou quase gozando e com você assim, nua, fico ainda mais louco. Sou sua pelo tempo que você quiser, mas vamos lá pra casa; minhas palavras soam imperiosas. Concorda. Onde estão suas roupas?, pergunta. O gato comeu, digo e lhe mordo carinhosa o lábio inferior. Ele treme mais excitado e avança sobre meu corpo. Minha destemperança quase põe tudo a perder; tento equilibrá-lo, disfarço. Me empresta a camisa, vai, me empresta e vamos. Ele, enfim, atende. Estou salva. Vamos, amor, guarde sua excitação, digo já vestida enquanto espero que ele abotoe as calças; depois, levo-o pelo braço. Não demoramos. No horizonte, já é possível notar que o amanhecer, róseo, se anuncia.
posted by Margarida57 at 5:23 am

Em meu apartamento, tentei conter-lhe o ímpeto viril e pedi que me ajudasse no banho. Ensinei a ele como uma mulher deve ser acariciada, como torná-la ferina, como levá-la ao máximo delírio. Pedi que me percorresse a pele, que ajudasse na remoção dos grãos de areia e que cuidasse da vermelhidão de meu rosto. Depois lhe dei as costas, as nádegas à flor d'água, pedi que me massageasse. As partes que me ardiam foram pouco a pouco se tornando entradas vulneráveis, portais por onde trafegavam a sensação de bem-estar e gozo. Sobre a cama, ao desfazer-me de toalha rica em algodão, rolamos juntos; ele inteiramente nu recendendo a macho voraz; eu, exalando perfume original, embebida em seiva que me amenizava as feridas. Tateou-me então por entre as pernas e encontrou aquele filete sempre em carne viva. Mergulhamos em oceano vasto e profundo, povoado de peixes inomináveis, mar abundante em cores sutis, cortinas translúcidas possíveis a olhos de amantes e poetas. Quando partiu, deixou-me em sonhos de menina recatada.

Acordei apenas no meio da tarde. Sobre a mesinha, largou poema original: o nome, endereço e telefone.

sexta-feira, abril 13, 2007

Desata-me

"Ah, sabes como eu sei, a dor é tão saborosa...
mais a ampulheta eu via fatal se esgotar,
mais sentia a tortura áspera e deliciosa"
Baudelaire

Tens meus braços atados, algemas prateadas, presos por sob meu dorso. Assim não me dás chance alguma. Exibes-me nua, mulher ainda encoberta, mas por manto que é apenas a noite que foge, sombra que se apressa a ocidente. Desata-me, prometo que não fujo; quero os braços para cobrir-me; se houver luz, tenho minhas vergonhas; se quiseres posso usá-los para te abraçar. Ah, por que me queres nua, por que tomas meu vestido curto? Tenho apenas essas duas peças. Na verdade não as desejas? É só para utilizá-las contra mim? Para ter razão ao me prenderes? Sei que me proíbes andar nua sob céu de estrelas, sobre areias prateadas; mas, vê, uma coisa é ser nua provisória, mesmo que estreitos os panos e a poucos metros das mãos; outra, é ter como capa apenas o lampejar dos vaga-lumes, tecido de gotas nervosas que transpiro toda trêmula ante o porvir. Põe-te no meu lugar, imagina o vexo que vou passar. Queres-me prisioneira, e depois? Nada roubei, apenas instantes de prazer em uma praça que à noite é deserta. Dizes que terei como castigo uma cela, mulheres estranhas em companhia, rolarei nua entre suas mãos, como troféu; deverei luzir sob sol revelador, sob dia que me haverá de roubar a fantasia, que mostrará as marcas em minhas nádegas avantajadas. Levar-me-ás nua ao distrito, mas não poderei de lá sair sem fibra a me cobrir o corpo; caso o faça, cometerei nova infração. Se tiver sorte, poderei ligar a alguém – é o que dizes –, tentativa vã de obter seda escarlate alugada, porque a que vai em tuas mãos já não mo pertence, deporá contra mim. Vai, desata-me, deixa que eu parta; prometo que te darei prazer maior, moro só; prometo que sempre serei perfume para que me sorvas, licor para que te embriagues... Permito que me tortures, sei que gostas de ouvir o estalar do açoite sobre o corpo níveo, mas não me deixes marcas; só a dor é saborosa... A dor e a ameaça de me levares prisioneira, mas apenas a ameaça. Vê meus seios: apontam intumescidos à espera de prazer maior. Vem, apalpa-me, sou úmida, sou portas abertas para teu desejo, escorrega... Se ainda quiseres, deixo em tuas mãos minhas duas peças; mas como lembrança. Vem, também transpiras, tens a respiração ofegante, o pescoço sangüíneo. Desata-me!