domingo, abril 29, 2012

Silêncio do amor

Gosto muito de tranquilidade. Nada melhor do que uma casa onde reina a paz e o silêncio, onde se possa apreciar a beleza da decoração, dos quadros, onde seja possível repousar sobre estofados, experimentar um ou dois livros numa poltrona confortável. É tudo de que preciso. Caso se ouça algum ruído, é o rumor do mundo lá fora, que arranha em desarmonia.

Tive um homem que também adorava a vida silenciosa. Em nosso amor, não havia ruídos. Entendíamos um ao outro através de sorrisos e olhares. Concordávamos com aquele verso de Bandeira: “os corpos se entendem, as almas não”. Se elas, as almas, não se entendem, para que tanta conversa? Vivíamos numa cumplicidade muda, envoltos em atitudes de nossos corpos. Atitudes compostas, na maioria das vezes, de carícias. Palavras, muito poucas, só o essencial. Fomos felizes. Mas como na vida nada é para sempre, ele se foi. Definitivamente. Abati-me a princípio; depois, recuperei-me. Não deixei, no entanto, de amar a vida silenciosa.

Um dia desses saí para dar uma volta na orla da lagoa Rodrigo de Freitas. Num trecho, onde muitos caminhavam, observei um homem. Ele também se pôs a me apreciar. Continuei a marcha. Não demorei a chegar ao parque da Catacumba, que era o meu destino. O homem me seguiu. Quando vou a passos módicos, ali perto dos patinhos de aluguel, ele me aborda. Ou melhor, não foi uma abordagem comum, mas quase um desembarque. Como aquele na Normandia. Fiz sinal que concordava com sua companhia, mas que permanecesse em silêncio. Não se ofendeu, continuou ao meu lado. Sorriu. Quando fez menção de falar, cobri seus lábios com o indicador, tomei o homem pelo braço e passamos a caminhar juntos.

Você é surda?, foi a pergunta natural que ele podia fazer. Chegou até a ensaiar alguns gestos, uma espécie de mímica.

Fiz que não com uma das mãos.

Depois de uma volta inteira, paramos para descansar. Sentei num banco e lhe fiz sinal de quem pede um lápis. Não tinha. Corri até o quiosque mais próximo e voltei com o bilhete pronto. Caso quisesse, poderia permanecer ao meu lado. Mas nenhum som de voz. Terminei escrevendo que ele parecia simpático, e não lhe escapava uma ponta de beleza. Leu com atenção e demorou a entender meus meneios literários.

Tomei-o mais uma vez pelo braço e continuamos a caminhada. Andamos mais vinte minutos.

Não entendo por que você não fala, suspirou no final.

Nada melhor do que a amizade em meio ao silêncio, saquei outro bilhete que já prepara no quiosque. Já sabia, pois, o que me aguardava.

Beijei-o e parti. Posso assegurar que foi um beijo quente.

Espere, como faço para ver você de novo?, ele quis saber.

Meneei os ombros e apontei a pista onde caminháramos.

No dia seguinte lá estava eu de novo na mesma orla da lagoa. Foi só passar pelo ponto onde o encontrara na véspera, que meu recente admirador já me aguardava.

Esqueci de dizer, seu nome é Sérgio. E para ele não pensar que sou muda, não escondi o meu. Mas falei apenas isso.

Tomei-o de novo por um dos braços e fomos nós. Uma volta inteira. Depois apontei as bicicletas da Bike Rio. Destravei uma e esperei por ele. Saímos os dois. Eu ia à frente. Entrei pelo jardim de Alá e escapuli para a orla marítima: Leblon, Ipanema, Arpoador, Copacabana. Sérgio sempre atrás. Pedalávamos à velocidade moderada. Assim que chegamos ao Leme, desmontei e aguardei por ele. Recostamos as bicicletas. Abracei Sérgio, puxei seu pescoço e lhe dei um beijo na boca. Beijo demorado. Ele me apertou contra o seu corpo.

Ficamos ali uns vinte minutos. Depois subimos nas bikes e retornamos ao Leblon. Deixamos as bicicletas na estação da João Lira. Caminhamos então lado a lado até o final da praia. Abracei-o mais uma vez, beijei-o longamente e parti.

Fiquei uma semana inteira sem sair de casa. Li Vício Inerente, de Thomas Pynchon. Também aproveitei para escrever o conto "Filme", que postei alguns dias atrás.

Por falar em Pynchon, trata-se de um escritor muito interessante. O livro que menciono é bastante extenso, como a maioria dos seus outros livros. A história é ambientada numa Los Angeles pós-psicodélica, assim se costuma dizer. A vida livre dos hippies está em declínio. O protagonista, que vivera toda a liberdade daqueles anos, precisa trabalhar. Mas o seu trabalho é ser um confuso detetive particular. Ele precisa da polícia e também acaba por auxiliá-la nas investigações de alguns crimes. Há muita praia, maconha, amor livre e surfistas que esperam ondas gigantescas. A principal cidade do oeste americano é multicultural, com pessoas de todas as partes do mundo. E também é muito musical. Deixei-me levar pela leitura envolvente, (vício inerente!) e só saí de casa na quarta da semana seguinte.

Ao iniciar a marcha na orla da lagoa, sinto alguém me apertar o braço esquerdo. Olho sobressaltada e me deparo com Sérgio. Diz de um jato que me procurou desesperadamente todos os dias em que não apareci. Pensou até que eu tivesse morrido. Pusemo-nos a caminhar. Eu, mergulhada no costumeiro silêncio. Andamos bastante, pedalamos também. Quando fiz menção de ir embora após beijá-lo, ele me segurou firme e falou:

Quero saber onde você mora. Com todo esse silêncio, não dá para confiar.

Continuou agarrado a mim. Fomos então até o prédio onde moro, no final do Leblon. Passamos pela portaria e entramos no elevador. Saltamos no quinto andar. Abri a porta do apartamento e fiz um longo e convidativo gesto. Que entrasse. Apontei o sofá. Depois, sempre no mais profundo silêncio, pedi que esperasse. Fui ao meu quarto por uns instantes.

Quando voltei, ele estava ainda sentado no mesmo lugar. Prestava atenção nos quadros, nos móveis até que... Sobressaltou-se quando me viu!

Eu era um nu de Mondigliani, ou mesmo de Picasso, na parede de museu famoso. Fiquei estática a observar a expressão de Sérgio. Foram longos os segundos. Duraram metade de todo o século 20 e mais o início do 21.

Depois? Deixei o meu corpo falar. Se o leitor não entende, explico. Deixei o meu corpo nu falar.

quinta-feira, abril 26, 2012

Filme

Colocou o CD no computador para vermos o filme que ele próprio fizera sobre mim. Sempre gostou de me ver nua, por isso no filme apareço pelada. Para completar, converso com alguém que está do outro lado da tela do notebook. Tenho esse corpo de mulher mignon, corpo perfeito, admirado e adorado por todos, mas há um pequeno detalhe. Não sou mulher. Isso, contudo, não tira a graça. Faz as pessoas gostarem ainda mais de mim. Estou sentada, de pernas cruzadas. Depois desfaço a posição e deixo meu pênis pouco a pouco aparecer. Sei que todos são loucos para vê-lo. Não apenas os homens, mas muitas mulheres também. Tive um cliente que me levava para trepar com sua mulher. Morria de tesão ao me ver metendo nela. Pela frente e por trás. Mas deixemos essa história para outra hora. Seguro meu pênis e começo a me masturbar. Ele começa a crescer. Destoa das minhas curvas femininas e de meus seios volumosos. O que fazer? Há gosto para tudo. Meu papel é insistir até o gozo. Vocês sabem, para a maioria das travestis a masturbação através do pênis é penosa e demorada. O filme, porém, tem no roteiro que a masturbação deve desaguar na ejaculação. Isso mesmo, eu tenho que desaguar. E lá vou eu. Fricciono a mão ora devagar, ora veloz. Sorrio para o meu interlocutor e, a seguir, faço cara de mulher sensual. O meu pinto já vai grande. Durante alguns segundos deixo-o solto e em exibição. Logo depois escondo-o entre as pernas fazendo de conta que sou fêmea. Então afasto as coxas devagar e deixo que escape. Pego-o de novo com uma das mãos e continuo a fricção. Ah, não sei se vou conseguir. Já estou a suar.

Fale alguma coisa bem tesuda para mim, vai, peço à imagem fria do homem que há do outro lado.

Você vai vestir depois um vestido curtinho, bem justo ao corpo; e nada de calcinha; vamos sair para passear, mas você não pode deixar seu pinto escapulir por baixo da barra do vestido.

Como os homens gostam de deixar uma travesti nua... Gostam de vê-la com o pinto de fora, de não ter onde escondê-lo. Há homens que adoram abandonar travestis totalmente nuas em vias públicas, tarde da noite. Sentem verdadeiro prazer só em imaginar como elas fazem para sair dessa situação. Enquanto divago, continuo a me masturbar. Sinto-me mais excitada com o assunto, percebo que posso gozar caso continue com o pensamento nesse rumo. Meu interlocutor, do outro lado da tela, retoma sua fala.

Realizarei todos os seus desejos; vou levar você nua, tratar você como mulher, farei de conta que você tem xereca, vou chupar tua xereca até você gozar.

Sinto então que vem alguma coisa lá de dentro, meu pênis dá o sinal.

A voz masculina continua.

Se o teu pinto aparecer de repente no lugar da xereca, coloco ele na minha boca e faço você gozar. Assim, acho que será até melhor. Quando sair toda a porra, engulo; prometo que engulo.

Estou por um triz, o gozo cada vez mais próximo. Lambuzo a palma da mão direita com saliva e insisto em fricções cada vez mais rápidas.

Você se agacha e abre as pernas, deslizo minha mão sob teu bumbum, com a ponta de um dos dedos toco a extremidade do teu ânus; você treme forte, de prazer, acrescenta ele.

Ai, já não posso mais. A onda há de arrebentar na praia. Surfo inteira na ponta do meu pinto.

Não deixa cair no chão, não deixa, ele fala, ejacula no braço, na mão, vai, goza e depois molha a boca com tua porra quente.

A ejaculação salta forte, esguicha uma, duas vezes. Cumpro o seu pedido. Despejo todo o sêmen sobre o braço esquerdo. Pressiono a cabeça do meu pênis encostando-a no dorso da mão. Quero aproveitar minha porra até a última gota. Pego então com a ponta dos dedos uma parte do líquido pegajoso e introduzo na boca. Saboreio-o. Movimento os lábios. Permaneço sentada, as pernas entreabertas, o pênis à mostra. O homem continua falando:

Agora você vai ficar com vergonha, seu pênis está murchando, tente fazer que ele mantenha o volume.

Não sinto vergonha, digo; quanto à perda da ereção, não posso evitar; mas ainda tenho muito tesão; e continuo bem safadinha, veja.

Tomo na ponta de dois dedos mais um pouco da porra que ainda me resta sobre o braço e a enfio na boca. Mostro a língua para ele, junto os lábios e engulo tudo. No filme dá para ver minha garganta contraindo-se, o pomo de adão em movimento. Sorrio de satisfação. Quanto ao pênis, está pequeno. Aponto na direção dele com face de ingênua, escondo-o entre as pernas e, mais uma vez, faço de conta que sou mulher. Por fim, deixo que reapareça. Sei que do outro lado da tela meu admirador está apaixonadíssimo. Não exatamente por mim, mas por algo que está soltinho, bem entre às minhas pernas.

quinta-feira, abril 19, 2012

Informática

Quando vejo alguém que me agrada, não faço cerimônia, lanço um olhar sedutor. Quase sempre é infalível. Espero, enfim. Todos se aproximam. Alguns vagarosos; outros, tímidos supondo algum engano. Não decepciono. É você mesmo, como vai? Então, ouço a voz: conheço a senhorita, não? Ou: a senhorita me conhece de algum lugar. Isso mesmo, somos velhos amigos ou, quem sabe, amantes. Passeamos. Sentamos em alguma cafeteria. Tudo muito requintado. Tilintar de xícaras, porcelana. O líquido fumegante e escuro, um biscoito. Não são necessárias muitas palavras. Apenas sorrisos e olhares, reciprocidade. Meu novo homem acaba de se dar por vencido. Não te preocupes, temes a mim, uma mulher? As conversas não são muito alentadoras. A maioria não tem assunto. Artista algum deles? Não. Quase todos homens de negócio, talvez gerentes, ou mesmo financistas. Ah, tão bom tivesse à mão algum poeta. Mas estes são raros. Mais fácil encontrá-los nos livros. Dizem que de corpo presente são complicados, contraditórios. Estou a sair da cafeteria com o meu mais novo amante. Sim, amante. Não no sentido que as pessoas dão à palavra, mas com aquele que estou prestes a amar. Isso mesmo, não posso dizer que estou apaixonadíssima. Uma palavra a mais, um engano e ponho tudo a perder. A avenida Rio Branco ainda tem o sol às cinco da tarde num dia de julho. Entro, ele sempre ao meu lado, um edifício, ou mesmo um arranha-céu. Sou eu quem o guio. Vamos, faço-te uma surpresa. Subo ao seu lado as escadas rolantes. Sobrelojas e mais sobrelojas, boxes com produtos de informática. Não gosto muito da informática, mas tenho uma amiga que trabalha em um desses boxes. Atrás dela há um fundo falso, uma espécie de depósito para as mercadorias. Eu e ela devemos muitos favores uma à outra. Encosto no balcão, pisco um dos olhos. Ela já sabe a senha. O problema é este meu novo namorado. Ele pensa que vou aplicar-lhe um golpe. Vê, quero apenas estar a sós contigo; não te apraz? Ri o homem um tanto incrédulo. Nada teme, aqui é um lugar público e esta é a Lúcia. Entrem, diz Lúcia levantando a tampa de um dos cantos do balcão. Fiquem à vontade. Eu e ele deslizamos para trás da cortina. Entendeste o que desejo? Terás muito o que contar a teus amigos nas conversas de botequim. Mas assim tão de primeira?, surpreende-se. Pensas que deveria ser tu a tomar a iniciativa, não? Aprecio a mulher quando atirada, responde-me. Então, está feito. Sento-o numa cadeira, dessas dobráveis, de mesa de bar. Só há a cadeira e um cabideiro. Em uma das hastes está o casaco de Lúcia. Em um segundinho eis o meu vestido ao lado do casaco da minha amiga. Sou amazona sagaz, monto sobre meu alazão. Eu conduzo, sou boa no galope, deito minha voz lânguida no seu ouvido. Nada mais preciso dizer. Vou cada vez mais veloz. Quando o sinto à beira do abismo, poupo-lhe o salto. Quero-o inteiro até a explosão, leite a condensar-se na minha boca, a lambuzar meus lábios, a garganta a ferver... Se o encontro de novo? Quem sabe.

quinta-feira, abril 12, 2012

Faltam-te os peixes?

Querido amigo, eu de novo, mas não para te pedir que venhas me recolher nua, como o fizeste em madrugada recente. Mas para contar a ti nova artimanha, dessa vez deliciosa e bem sucedida. Meu namoradinho novo, outro, já não é o que me despiu na Lagoa, adora uma pescaria. Então combinamos a dita ida aos peixes. Mas não sabia eu que a praia onde, ao menos na cabeça turra desse homem, aportam os cardumes era tão distante. Quase uma viagem. Noite adentro e a praia nada de clarear nos faróis do automóvel. Ao chegarmos, eu a cochilar no banco ao lado. Mas entusiasmei-me ao ver o deslizar das espumas no topete das ondas, a sentir quente a brisa noturna. O namoradinho armou os apetrechos, fixou anzóis, iscas e molinetes. Mas faltaram vir os peixes. “Pescaria é uma espécie de loteria”, dele a profecia. E também as tantas pobres rimas. Lá pelas altas horas, entre caniços e linhas, segredei-lhe: “sou eu a sereia, já que te faltam os peixes, veio-te a rainha deles”, e corri para o mar. Pleonasmo dizer que mergulhei nua. Se já o fiz à luz do dia, por que temeria à sombra da lua? Ou melhor, nem lua havia. O homem espantou-se e afirmou: “com tua algazarra, há de afastar os peixes”. “Oh, se já andam tão afastados, talvez em costas d'África. Pesques a mim”, reafirmei, “assim não voltas de mãos a abanar”. Ele não entrou no mar. Mas deixou-me em paz a nadar. Lá pelas tantas, outro carro resolveu nas proximidades estacionar. José, o namoradinho, pôs-se da areia a agitar os braços, que saísse d'água porque estranhos havia nas proximidades. Não saí, nada tenho a temer. Mas ele lançou-se à obra e correu a mim com minhas roupas nas mãos. Resultado: além de lhe faltarem os peixes, mostrou-se o rei da trapalhada. Meu vestido ficou encharcado e, dali, as águas não mostrei a intenção de abandonar. Coitado do homem, tão desesperado. Tive de acalmá-lo, na surdina, “quieto, a nua sou eu, teu escândalo é capaz de pôr tudo a perder, volta à tua pescaria, finge que estás a sós.” Muito contrariado, foi segurar caniço e molinete. Saí d'água, ainda em pele, quando já quase raiava o dia. Corri e sentei no banco do carona. “Não te vais vestir?”, indagou-me já mais calmo. “Como? Por demais úmido todo o meu vestido”. “Vais nua, então?” Respondi-lhe amorosa, “veste-me a carroceria!” Quando chegamos a casa, louvei a falta dos peixes; afirmei convicta: “segura a mim, bem forte, não deixa em outras mãos escapar a tua sereia!”

Espero que tenhas gostado da aventura, assim que viver outra, narrar-te-ei. Sei que morres excitado ao resgatar-me em pelo. Não te faltará a oportunidade.
Beijos,
de tua Célia

quarta-feira, abril 04, 2012

Temporários

Quando abri aquele e-mail, exclamei a mim: não é possível! Um arquivo mostrava eu mesma inteiramente nua. Não precisei fazer esforço mental para me lembrar daquelas fotos. Um namorado de ocasião me fotografou quando estive no Rio, e isso já fazia algum tempo. Lá estava eu: de pé; sentada; de costas; com os braços ora sobre o ventre, ora sobre os seios. Em uma delas, eu estava em desalinho. Ele ameaçara me fotografar antes que eu fizesse a pose. Então, atabalhoada, tentei esconder minha nudez, rodopiei sem encontrar abrigo; as mãos soltas, num último esforço, convergem em vão na direção dos seios, fiquei um tanto cômica na foto. Mas, afinal, ao me mostrar ainda quando éramos namorados, acabei achando-a engraçada.

O problema todo surgiu porque abri o arquivo no computador de trabalho e, como se sabe, esse tipo de arquivo permanece gravado temporariamente em algum lugar do disco. Tentei descobrir o caminho que me levaria ao local onde tais arquivos ficam depositados, mas o acesso me foi negado. Restava recorrer ao pessoal da informática. Eu teria, porém, coragem para isso? O que deveria fazer?, pensei comigo. Optei pelo silêncio, ficaria quieta no meu canto. Quem sabe ninguém se desse ao trabalho de olhar arquivos temporários? Mas não se passaram nem três dias e um funcionário da informática veio falar comigo.

“Rita, quero mostrar uma coisa a você”, convidou-me para ir até sua sala. “Olhe o que encontramos?”

Depois de me ver mais uma vez nua, perguntei: “encontramos?”, minha surpresa era o plural.

“É, encontramos. Você sabe que se fosse apenas eu, resolveria, mas há outra pessoa nisso.”

Na verdade eu não confiava nele. A conversa visava me impressionar e permitir que ele, cujo nome era Josias, e o chefe alcançassem seus objetivos.

“Você sabe que isso dá demissão”, silenciou depois da última palavra.

“Basta que você, ou melhor, vocês, não passem adiante.”

“Essas coisas não são tão simples assim. A outra pessoa que está a par das fotos é o chefe da seção”, falou em tom sério, como se ele próprio nada tivesse com isso.

“Falo com ele”, afirmei convicta. “Ele vai compreender e acabará por deletar essas fotos.”

“Não acho que isso será fácil”, afirmou e desviou os olhos a um ponto indefinido, longe da tela do monitor.

“Onde está o Ivo?” Era o chefe da informática, um homem gordo, sempre descomposto, contínuo no ar de deboche.

“Não se encontra no momento.”

“Não? E quando volta?”

“Assim que voltar chamo você,” acabou de falar, virou as costas e se foi

Passaram-se mais ou menos duas horas, recebi uma mensagem do chefe da informática. Devia comparecer à sua sala.

Em resumo: apagaria o arquivo, mas não me sairia barato. Teria de trepar com ele e com Josias, o seu funcionário. O pior de tudo foi seu ar de escárnio e sua grosseria. Eu teria, ainda segundo ele, dois dias para lhe dar a resposta.

Saí furiosa da sala, não mais falei com ninguém naquela tarde e deixei o serviço antes da hora.

O primeiro dia transcorreu sem que eu desse resposta alguma. No segundo, exatamente às quinze para as cinco, faltando poucos minutos para o encerramento do expediente, fui à sala de Ivo.

“Como fazemos?”, tentei ser eu a debochada.

“Ah, a mocinha. Pensou direitinho?”, perguntou sorridente, mas não era sorriso de gente de bem.

“O que você acha?”, falei com o rosto inclinado, como se o achasse um lixo.“Primeiro quero apagar o arquivo, sei como funciona”, afirmei convicta.

“Apagar o arquivo?”, repetiu minhas palavras tentando imitar-me a pronúncia e caiu na gargalhada.

“Mesmo assim não sei se posso confiar em vocês dois, já o devem ter salvado em outro lugar.”

“Oh, a mocinha não confia em nós? Tenho esse aspecto gorducho, escrachado, mas tenho caráter. Meu funcionário também. Aqui na informática, sabemos de coisas que você nem imagina”, falou e me olhou nos olhos. “Caso não confie em nós dois”, nesse momento apontou para Josias, “é melhor pedir demissão”.

“Como vamos fazer?”, perguntei querendo resolver logo a questão.

“A senhorita não vai querer cumprir o trato aqui, não é mesmo?”

“Não sei. Só digo que não tenho muito tempo.”

“Aguarde alguns minutos após o expediente, vamos chamá-la assim que for possível, ok?”, agora, pode nos deixar sozinhos”, fez sinal para que eu saísse, permanecendo na sala ele e o seu funcionário.

Assim que todos saíram após as cinco horas, meu telefone tocou. Era Ivo de novo.

Ao voltar, os dois me esperavam. A primeira palavra que o chefe disse foi: “se quiser que o arquivo seja apagado, vá tirando a roupa. Pelo que entendi, você deixou em nossas mãos a decisão sobre o local.”

“Mas assim...”, deixei escapar.

“Quer que cantemos uma musiquinha para você se despir?”

Virei de costa. Tirei primeiro a blusa; depois, a calça comprida.

“Continue.”

Inteiramente nua, ainda permaneci de costas para eles. Percebi que um deles aproximou-se e recolheu toda a minha roupa. Eu a havia deixado numa poltrona ao lado.

“Vire de frente”, ordenou.

Virei, sempre o olhando de modo enviesado.

Primeiro tive de me agachar e abocanhar o pênis de Ivo. Quando abriu a calça, já estava praticamente enrijecido. O gorducho sentia tesão por mim. Pouco a pouco introduzi todo o seu sexo na minha boca. Passei a friccioná-lo com os lábios, apressadamente, fazendo-o diversas vezes desaparecer. Quando isso acontecia, eu olhava desdenhosa para seu rosto. Ao perceber que ele dava ares de que iria gozar, deslizei meus lábios quase permitindo que aquela ponta de músculo se soltasse da minha boca. Mas, num último instante, mantive-me atada; com a ponta dos lábios prendia-lhe a ponta do pênis.

“A mocinha entende da coisa”, falou através de um suspiro.

Depois agi do mesmo modo com Josias. Mas este tinha o sexo menor e mais estreito, o que me proporcionou mais conforto. Enquanto isso, Ivo nos olhava.

A seguir, foi minha vez de deitar para que novo ritual se realizasse. Novamente, o primeiro a se apresentar foi o chefe. Subiu sobre meu corpo tentando não me esmagar com seu peso de brutamontes; depois veio Josias, bem mais delicado.

No final de tudo aquilo, Ivo, sempre insaciável, ruminou:

“Acho que vamos deixar você em casa, mas peladinha.”

“Vocês querem namorar comigo, não é mesmo?”, acabei sugerindo e sorrindo.

“Acho que ela gostou da gente”, o chefe falou e olhou para o funcionário. “Sabe”, continuou, “não é má a ideia de namorar você”, concluiu.

“Vocês são tão ágeis”, ironizei sobre a trepada que deram, “será que são capazes de uma segunda vez?”

“Ouviu isso, Josias? Ela está querendo mais.”

“Estou mesmo, já que vocês me excitaram...”

Fiz que o chefe continuasse despido. Sentei-o numa das cadeiras, abri as pernas e montei sobre seu pênis. Rapidamente fiz que escorregasse para dentro de mim. Comecei então a me mexer, meus olhos sempre revirados e desdenhosos.

Depois que acabamos essa segunda rodada, Ivo me chamou ao computador.

“Venha cá, vou mostrar como isso funciona. Está vendo suas fotos aqui na tela? Veja onde estão arquivadas. Há dois arquivos, o temporário e mais outro, onde as guardamos. Delete você mesma.”

“O que garante que vocês não as copiaram e as guardaram em um disco externo?”

“Você não falou que queremos namorar você? Não vamos fazer uma coisa dessas com nossa namorada.”

Deletei os arquivos. Depois sentei numa das cadeiras, cruzei as pernas e olhei para eles.

Ivo acendeu um cigarro e me ofereceu: “depois do expediente não é proibido, fume.”

“Então, vamos?”, falou quando acabamos.”O expediente está encerrado”, decretou.

Levantei e os segui, ainda nua, fazendo-me de esquecida. Quando íamos quase saindo do escritório, ele, o chefe, sentenciou: “se não fosse pegar para nós três, até que seria bom ter você nua passeando com a gente, ia fazer o maior sucesso.”

“Se vocês me querem nua, quem sabe no carro?”, insinuei e sorri mais uma vez dissimudada.

Naquele momento ele não debochou, percebeu que me poderia ter por mais vezes.

“Você gostou da gente, não?”

“Gostei”, afirmei com convicção. “Nunca pensei em ter dois namorados, sair com os dois, trepar com os dois, e ter sempre os dois aos meus pés.”

Eles riram.

A partir daquele dia, tornei-me namorada de ambos. Passaram-se alguns meses prestei concurso público e pedi demissão da empresa. Ainda assim saímos mais algumas vezes. Depois, no entanto, fui transferida de cidade. Foi aí que desapareci, sem dizer nada a eles.