sexta-feira, março 19, 2010

Então tá!

“Ai, fiquei pelada!”, disse ao atravessar a Prudente de Morais, perto da Texeira de Melo. Um sopro de ar quente vindo da tubulação subterrânea me pegou de surpresa e levantou meu vestido. Na verdade ninguém teve tempo de prestar atenção nas minhas pernas de fora, mas a indiscrição na voz fez meu namorado sorrir.

“Até parece que você não gosta de ficar pelada...”

“Adoro, mas não de modo inesperado.”

“Lembra o início do nosso namoro?”

“Claro que lembro, amor”, respondi dengosa.

“Me conta então como foi.”

“Namorávamos muito à vontade, e algumas vezes cheguei à sua casa inteiramente nua.”

“E você nunca me contou como fazia para as pessoas não perceberem”, sua voz soou plena de desejo e curiosidade.

“É segredo”, sussurrei.

“Você me contou sobre um outro homem, disse que ele nunca viu você vestida, é verdade mesmo?”

“Já vem você de novo introduzindo outro homem entre nós dois.”

“É apenas curiosidade, nada mais; gostaria tanto que você me contasse.”

“Já contei”, sorri com certa malícia.

“Não contou o principal; nada falou sobre o dia em que você perdeu a hora. Queria tanto saber o final verdadeiro...”

“Conto, mas há um pequeno problema.”

“Qual?”, perguntou ainda mais curioso.

“Se de tanto falar nesse homem eu sentir falta dele, você sabe que vou procurá-lo, aí você não vai poder reclamar.”

“Sei que você me ama, isso não vai acontecer”, sentenciou como um magistrado.

“Vou contar mais uma vez, mas vamos do começo.”

“Mais uma vez e com o verdadeiro final.”

“Sobre o final, mais adiante decido. A história foi a seguinte. Escute, já que você sente tanto tesão nisso. Eu sempre passeava por aquela rua quando descobri aquele homem jovial e muito bonito. Pensei num artifício para tentar conquistá-lo. Em primeiro lugar observei-o chegar em casa durante uns dias; certifiquei-me sobre seu apartamento, investiguei se ele morava com alguém. Ao concluir que tudo ia a meu favor, comecei a investir. Certo dia, em torno da uma hora da manhã, vinte minutos após ele ter entrado em casa, subi pela escada e bati à sua porta. Quando abriu, pude notar que soube disfarçar a estupefação que ameaçou explodir em seu rosto. Houve uma ponta de vexo em seus olhos, enquanto era eu quem chegava nua. Vestia apenas botas pretas até os joelhos, um colar que imitava perolas e uma pequena bolsa de verniz. Mais nada. ‘Posso entrar?’, perguntei sorrindo. ‘Não se surpreenda, não vou lhe fazer mal’, completei. Permitiu que eu entrasse. Pegou uma bebida, acho que uísque, ofereceu-me. Já não lembro o que conversamos, mas o assunto foi animado. Em apenas um quarto de hora já estávamos excitadíssimos, apenas devido à conversa, porém. Não perguntou como nem por que eu chegara nua em seu apartamento. Naquele dia não fizemos nada. Nem nos tocamos. Aliás, beijei-o antes de ir embora, exatamente às quatro da manhã. Não se surpreendeu ao me ver sair da mesma forma que entrei. Nem me ofereceu roupa alguma. Não combinamos outro encontro. Dois dias depois, voltei. Tudo se deu de modo semelhante. Ele ficou muito feliz com o meu retorno. Voltei da mesma forma: nua. Você mesmo já disse, jamais apareci vestida na frente daquele homem. Na segunda visita, namoramos e fizemos amor. Parti às cinco, antes que o sol nascesse. E sempre nua. Os encontros se repetiram durante dois meses, mais ou menos duas vezes na semana. Nosso namoro entrou por um viés muito romântico. Bebíamos vinho, comíamos no mais alto requinte. Demonstrávamos estar apaixonadíssimos. Acho que adorou a minha invenção. O fato de chegar e partir nua, sempre no começo e no final da madrugada, fez que nosso namoro se mantivesse na sua casa. Jamais me convidou para ir a lugar fora dali, nem insinuei outro programa. Numa madrugada de sexta, lembro-me bem, adormeci em seus braços. Quando acordamos eram sete horas da manhã. Perdêramos a hora. ‘Como você vai fazer?’, perguntou apontando o meu corpo. Foi a única vez que fez esse gesto. ‘Não se preocupe’, respondi, ‘resolvo; e vou como vim’. Três dias depois ficou surpreso ao me ver chegar nua de novo. Namoramos muito naquela noite. Mas foi a última. Parti no horário costumeiro, ainda sob um restinho de sombras. Nem me perguntou como fizera para deixar sua casa com o sol já alto dias antes. Então conheci você, lembra? Apareci também nua, mas depois me vesti. E estou aqui, feliz e ao seu lado.”

Beijei-lhe uma das faces. Chegávamos à avenida Viera Souto. Atravessamos e sentamos num quiosque. Pedi à garçonete água de coco.

“Mas você não contou o principal”, lembrou insatisfeito.

“O principal?”, fiz-me desentendida.

“Como você fez para ir embora nua da casa dele às sete a manhã...”

“E como fiz nas outras vezes tanto para chegar como para sair?”

“Era de noite e, além disso, você também nunca quis contar.”

“Já não queres saber?”

“Quero, sobretudo o fato que se deu sob a luz do sol.”

“Agora nada posso dizer, é meu segredo, é assim que enfeitiço os homens.”

“Você iria lá de novo?”

“Sentes tesão nisso?”

“Sinto”

“E se eu não voltar?”

“Não tem problema. Acompanho você até as proximidades, tira a roupa e a deixa comigo.”

“Queres me deixar nua?”

“Quero você apenas com o pequeno cordão de ouro que vou colocar em volta do seu pescoço. O cordão, as botas negras e a carteira transparente.”

“Nua e com um cordão de ouro?" Pergunto mais uma vez: "e se eu não voltar?”

“Não faz mal, pode deixar que não vou atrás de você.”

“Jura?”

“Juro.”

“Então ta!”

quinta-feira, março 11, 2010

Arrepio

Vou contar a você. Na verdade, é um arrepio. No começo a gente fica meio temerosa, mas depois toma confiança. Chega um dia em que não se vive mais sem isso. Eles começam com algum tipo de galanteio e não demoram a fazer o convite. Primeiro, finjo que não entendi; mas, com o passar das horas, dependendo de como agem, aceito. Quando saí pela primeira vez com um homem que conhecera momentos antes, tremi de medo. Hoje, tremo, mas por outros motivos. O normal é eles nos levarem para um hotel, desses que nem são muito caros mas permitem o prazer. Ouça como é a primeira vez com um estranho, já que você diz não ter coragem. Deixei a boate às quatro. Me despedi das amigas. Beijei uma delas. “Não vai querer que eu fique de sobreaviso?”, perguntou arregalando um pouquinho os olhos.“De que adianta?”, perguntei, “salvarás minha vida?” Ela riu e insinuou: “às vezes não é a vida que corre perigo, mas outro imprevisto que se pode contornar com um simples telefonema.” Não pensei mais no que ela falou. Agarrei-me ao homem e fui com ele. Acho que todo ser humano tem tendência a confiar em alguém. Ninguém imagina que está ao lado de um fora da lei, de um tarado ou mesmo de um maníaco. Entrei com ele no hotel. Já no elevador, tacou-me um beijo na boca e apertou meus seios. Queria arrancar minha roupa antes de entrarmos na suíte. “Calma, vamos devagar”, falei preocupada. “Você vai fazer tudo o que eu pedir?”, perguntou ainda eufórico. “Não sei”, fiz charme, “só se não doer”. “Às vezes uma dorzinha é bom”, completou. Tremi um pouquinho. Será que me machucaria? Tirou toda a minha roupa. Nem me preocupei onde a colocou. Depois, ao contar para umas amigas, reparei que muitas têm preocupação com suas roupas, temem não encontrá-las após tudo acabar. Mas nem pensei nisso. Deixei que me envolvesse com seus grandes braços; permiti que fizesse tudo que desejava. Foi ótimo. Naquela noite nada se insinuou que me despertasse algum temor. Adorei seus afagos e beijos. Nas vezes seguintes, sempre que saía com alguém que conhecera momentos antes em alguma boate ou em outros lugares como restaurante, casa de espetáculo ou cinema, só sentia uma ponta de temor no começo, depois lhe depositava inteira confiança. Mas houve uma ocasião em que um deles rasgou minha roupa. Acho que fez aquilo porque vira num filme. A diferença é que, no filme, a mulher tinha um casaco comprido para sair do hotel. Eu, imagina, tive de sair nua. Se eu não deixara alguém de sobreaviso? Não, não deixara. Como fiz? Depois conto, mas ouça só. De início, jurei de pés juntos que a partir daquele dia (ou daquela noite, sei lá), não mais me deixaria seduzir por nenhum desconhecido. Mas quem disse que consegui cumprir o prometido? Não passou uma semana e já estava sentindo a maior falta. Confesso que o primeiro que apareceu me despertou temor. Mas, em seguida, senti uma certa atração pelo perigo. Hoje, continuo saindo, nunca mais me aconteceu nada de mal. O arrepio, porém, não deixa de estar presente. Ouça mais uma coisa, é sobre a Lurdinha, lembra dela? Com a Lurdinha aconteceu e continua a acontecer coisas muito engraçadas. Ela conheceu um fazendeiro, do interior de São Paulo. Viajou para a fazenda do homem. Parece que está apaixonadíssima. Ela não é como eu: é um pouco mais louca. Me contou que ele gosta de levá-la para passear inteiramente nua, à noite, calçada apenas de botas que vão até os joelhos. Aí ele pede a ela para dirigir o jipão deles até algum lugar deserto, manda-a saltar, passa ao volante e arranca com o automóvel deixando-a nua e só. Acaba sempre voltando para resgatá-la. Ela conta que certa vez pregou-lhe uma peça. Durante uma madrugada inteira escondeu-se no mato e não permitiu que ele a encontrasse. Voltou para a fazenda pela manhã, ainda nua e muito feliz. O homem a amarrou e ameaçou chicoteá-la caso não contasse o que fizera durante toda noite. Ela não abriu a boca. E diz que até gozou quando via a ponta do chicote prestes a estalar sobre seu corpo de mulher madura. Os dois continuam apaixonadíssimos. As brincadeiras não acabaram depois disso, não. Diz ela que até se multiplicaram!

quinta-feira, março 04, 2010

Um homem a me olhar

Em dias normais já gosto de andar nua, no Carnaval então nem se fala! Vou pelo Posto Seis, em Copacabana, atravesso a Joaquim Nabuco. Reparo um homem a me olhar, mira com insistência na direção das minhas pernas. São quase oito da noite, o sol ainda permanece, a claridade do dia insiste em nos iluminar. Em meio a um ambiente intensamente urbano, visto apenas um biquíni mínimo, cintura baixíssima, e o top. O restante vai numa minúscula carteira plástica transparente que trago amarrada num dos ombros. Sigo ao meu apartamento. Não para encerrar-me e terminar o dia. Apenas para descansar um pouquinho e depois me aprontar para sair de novo, pois a folia e um amor novo me esperam.

Na verdade, a surpresa instalou-se a partir das duas da tarde de hoje, sábado de Carnaval. Um estrangeiro aproximou-se e falou comigo, em inglês. Pensei que ele fosse americano, desses que desejam mulheres brasileiras fáceis. Mas tratava-se de um australiano. Reparei quando percorreu com um golpe de vista meu corpo magro, quase nu, e o desejou. Não me importei caso quisesse apenas o corpo, porque eu poderia fazer o mesmo em relação a ele. Duas estátuas louras em pé de igualdade sob um sol que não nos perdoava. Conversamos. Entendeu-me perfeitamente, apesar do longo silêncio a que meu inglês estivera confinado. Falou alguma coisa sobre seu país. Lá também há belas praias, bonitas mulheres, as pessoas são interessantes e bebe-se muito. Admirou-se do colorido do Rio; de Copa e de Ipanema; da alegria das pessoas; das faces juvenis sorridentes; e da quantidade de latas de cerveja que todos aqui consomem. Perguntou-me se não entraria na água. Respondi que preferia ficar sob o sol. Mergulhou mas não demorou a voltar. Comprou duas latas de cerveja e me ofereceu uma. Não aceitei; desculpei-me, mas não queria começar a beber àquela hora. Gostei da companhia dele. É bonito, chama a atenção, é possível perceber que é estrangeiro. As pessoas olhavam para ele e depois para mim. Às cinco horas me convidou a acompanhá-lo. Disse estar hospedado no Sofitel. Acenou com a perspectiva de comermos alguma coisa, bebermos, enfim. Ele disse que tinha tudo que precisava e que podíamos usufruir juntos. Acabei por acompanhá-lo. Na rua, ao me ver caminhar apenas com os mesmos trajes da praia, admirou-se de que em nossa cidade uma mulher pode andar nua sobre o passeio. “Não estou nua, estou de biquíni, assim você me deixa constrangida”, é lógico que falei em inglês. Ele riu e ajudou-me a lembrar a palavra “constrangida” em sua língua. Depois sorriu e se desculpou. Apontei outras pessoas que caminhavam vestindo somente trajes de banho. Também sorriu, mas descobri o que ele pensava: “você é mais nua do que todos as outras mulheres”.

Não tive dificuldade em subir com ele ao último andar do Sofitel. A gerência do hotel se ocupa com coisas mais importantes. A suíte em que está hospedado é de frente para a praia de Copacabana. Permanecemos um pouco na varanda. Foi até a geladeira e voltou com uma garrafa de uísque. Trouxe dois copos, apenas um com gelo. “Vocês não bebem uísque puro, não é mesmo?” Acenei que não movimentando a cabeça. Sorri. Bebemos contemplando a praia, o céu, todo o colorido da orla, as pessoas felizes lá embaixo.

Após encerrarmos a primeira dose, senti um de seus braços por trás do meu corpo. Abraçou-me, virou-me de frente e me beijou na boca. Com toda aquela paisagem paradisíaca às minhas costas, pegou-me no colo e me levou para cama. Acariciou-me demoradamente, percorreu grande parte do meu corpo com os lábios e a língua. De repente estava nua e subjugada à sua total vontade. Mordeu meus seios com tal impetuosidade que cheguei a tomar um ligeiro susto. Mais algumas carícias e procurou meu sexo, primeiro com a boca, num movimento vigoroso de sucção. Senti tudo que havia em meu ventre querer saltar e se transferir para dentro dele. Depois subiu vagaroso, até que defrontamo-nos rosto a rosto. Beijamo-nos mais uma vez; seu sexo procurou o meu, natural e confortável. Absorvi-o como uma das maravilhas da natureza. Meu australiano também era fã de mágicas e fetiches. Quando sacolejávamos à deriva, sem o anúncio de qualquer tipo de vela ou leme que nos levassem a porto seguro, reparei o meu raso biquíni em uma de suas mãos: num movimento rápido, levou-o por inteiro dentro da boca, mastigou-o com esmero. Fechei os olhos, o coração a bater mais acelerado; nada falei nem protestei, apesar de não ter nada mais do que aquele minguado paninho para voltar para casa. Namoramos durante mais uma boa meia hora, Ao acabarmos nossa dança sensual, pediu pelo telefone uma refeição para dois. O alimento requintado repôs todas as energias que deixáramos para trás tanto na praia como no exercício duplo do amor.

Agora atravesso a Joaquim Nabuco, caminho rápido, quero chegar logo em casa. Vou pegar algumas roupas, todas bem curtinhas e sensuais, entre elas mais alguns biquínis – exigências dele num inglês de sotaque asiático meridional. Vou ficar todo o Carnaval no Sofitel. Convidou-me. Vamos à praia, a diversos blocos e em tudo mais que aparecer. Sei que se trata de um amor de Carnaval. Mas, quem sabe, no mundo de hoje o longe é um lugar que não existe. Mesmo quando se trata da Austrália.