Isaura, veja que maravilha esse mar, a praia. Ainda não amanheceu direito, mas já se pode perceber o contorno vermelhado do amanhecer no mar.
Clara, às vezes penso que estou delirando. Como isso foi possível, tão de repente? Estamos aqui no Rio, em Copacabana, aproveitando a beleza do lugar.
Isaura, feche os olhos e sinta na pele a brisa vinda do mar. É um arrepio, mas feche os olhos. A gente sente a sensação de maneira mais forte.
Clara, sim, é um tesão a sensação de que você fala. Deve acontecer porque estamos nuas, esqueceu?
Isaura, claro que não. E veja como a cidade é tão maravilhosa. Tudo deu certo, ninguém reparou até agora. Acho que nem vai reparar.
Clara, tudo começou com o teu namorado lá em Cotia. Ele ia todos os dias no mercadinho, comprava alguma coisa e falava contigo. Passou a fazer questão de ir à tua caixa. Depois vieram os presentes.
Isaura, não espalhe. Pode dar azar. Um homem assim não encontroem lugar nenhum.
Clara, não estou espalhando. Falo apenas para você. Ele é dez!
Sim, Isaura, o homem é dez. Quando soube que teríamos dias de folga, sugeriu e pagou nossa viagem. Vocês não querem passar uns dias no Rio? Vocês conhecem o Rio? Trouxe as instruções, as passagens, aonde iríamos nos hospedar e tudo mais.
Clara, estou sentindo a sensação de que você falou. A brisa sobre a minha pele, parece que o mar, com suas pequenas ondas, quer falar alguma coisa conosco. É tudo maravilhoso.
Isaura, você fala como um poeta. Por falar em poesia, gostou da festa? Ele ainda nos presenteou com uma boate num apartamento, uma festa particular. Melhor, impossível. Festa com DJ. Além disso, ninguém a nos incomodar, dançamos soltas e leves.
Clara, era o que eu queria falar, a festa. Nunca fui a uma festa assim. Umas bebidinhas super bem-preparadas, umas comidinhas especiais, aqueles estofados para a gente se sentar, descansar, a vista para o mar.
Isaura, o mais engraçado foi que ninguém nos viu descer, não é mesmo? A gente saiu do apartamento e do edifício despercebidas, atravessamos a avenida e estamos aqui. Ninguém notou.
Clara, você não ficou preocupada de aparecer alguém? De um homem nos surpreender enquanto descíamos as escadas? Talvez haja câmeras espalhadas pelo edifício, na rua. Se alguém está nos monitorando?
Isaura, se há alguém nos monitorando, é o namorado que pagou a viagem. Se pagou, tem direito, não é mesmo? Mas eu acho que ninguém notou nem está nos espionando aqui na beira d’água. Já pensou quando voltarmos, caso a gente conte a alguém? Ninguém vai acreditar.
Clara, você é muito atirada. Você ainda disse: não podemos esquecer a pequena bolsa e nossos celulares, o restante a gente consegue. Até me lembrei de um namorado que tive em São Paulo, morava o homem nos arredores de Cotia. Certa vez fomos ao parque municipal, lembra? Eu contei a você. Tirei toda a roupa, coloquei numa pequena mochila, levei a mochila às costas e passeei com ele pelo parque. Às vezes eu parava, ele me abraçava. Num momento percebi o namorado tremendo. Perguntei o que era. Ele estava mais envergonhado do que eu, e estava vestido. A nua era eu! Não sei por que lembrei do homem agora.
Isaura, deve ser porque inventamos a aventura de descer nuas para a praia.
Clara, será que não vamos ter problemas? Já está claro, é dia. Veja o sol, que beleza.
Isaura, esqueça os problemas. Já que você observa a beleza do sol, não pense nisso. Tudo vai dar certo.
Clara, vi uma mulher passar. Acho que olhou para gente com uma cara de surpresa.
Isaura, não repare nas pessoas. Finja que somos as mulheres mais vestidas do mundo, com vestidos de grifes célebres. Agindo assim, as pessoas ficam longe. Tudo vai dar certo.
Sim, Clara, estou tentando. Estou tentando. E como você confia tanto no namorado, o homem que sempre vai pela manhã no mercadinho à tua caixa, te dá presentes, foi ele que programou tudo. Então, sim, você tem razão. Vamos esperar. Daqui a pouco ele aparece e tudo vai dar certo!
Isso, Isaura. Agora, sim, estou ouvindo a amiga do coração. Hum, sinta, meu amor, sinta a brisa na pele. Ela está um pouquinho mais intensa, está a nos acariciar com mais ardor. Aproveite e ouça também o marulhar. É o paraíso.