quarta-feira, novembro 05, 2008

Copacabana

A avenida Nossa Senhora de Copacabana é uma via atraente. Não só a taxistas que trafegam lentos, quase acompanhando o pedestre distraído, mas também a homens ou mulheres que vão às compras ou a passeio. Várias lojas alinham-se disformes, múltiplos os tamanhos, e às vezes há as galerias. Exibem de preferência roupas, mas se este não for o desejo, encontra-se todo tipo de produto. Poucos olham acima; e se o fazem surpreendem-se com os altos edifícios. Onde o céu?, onde o sol?, mas não é impossível a claridade. Esta vai no brilho dos olhos das mulheres e dos jovens, para quem são transparentes as torres de concreto. Perto do Posto Seis, nas ruas que atravessam a avenida, predomina uma atmosfera de bairro rico, morada de senhores e senhoras filhos da fortuna. Descendo, seguindo em busca do comércio popular e de corpos de maior temperatura, o bairro arrefece, encontra o homem comum, o passeante solitário, a mulher freqüentadora dos pequenos salões de beleza, os bares sempre cheios, o incógnito bebedor de cerveja. E no espaço aéreo, amontoa-se em conjugados o sangue quente, o pulsar constante. Andando pelo Posto Quatro é preciso ter cuidado. As tentações são várias, as cores se multiplicam, sente-se na boca amálgama lustroso, licor tentador que embriaga e embaraça. Então a roupa torna-se leve, sobretudo à mulher lívida; a saia ou o vestido sobe, o tecido parece que foge, e às vezes não se resiste a mergulho repentino em teia disfarçada e envolvente. Desliza-se da rua movimentada a prédios de corredores compridos, confunde o labirinto de portas e escadas; elevadores lentos, de sons arranhados, transportam a universos perfumados. Então não se sabem nomes, identidades ou procedências; mãos ávidas procuram a pele branca, os poucos pêlos, desfazem as amarras; e corpos antecipando suores, em meio a lâmpadas de dourado arredio, embebedam-se de caldo andaluz, vinho pleno de volúpia. Mas a rua me dá remate de sobrevida; meu coração, em ritmo de dançarina eslava, transpõe o primeiro obstáculo, vitória ainda que precária; deixo para despejar enzimas acre-doces em hora de mais valia. Um café expresso detém-me próxima à entrada de um hotel. Desfraldam-se as bandeiras sobre as marquises, um funcionário em traje a rigor abre a grande porta de vidro à comitiva estrangeira. Delicio-me na bebida de pó escuro, encorpada, quase amarga. Levanto os olhos em meio a sorrisos e espelhos, aprecio a silhueta de ator americano. Deixo-o em meio a fitas de outros tempos e, sobre o passeio, sou levada por torvelinho de rapazes sorridentes; cuido da bolsa e da carteira, mas sei que desperto interesses submersos. O ar da praia!, agora o percebo, chega-me em boa hora, aguça-me os sentidos, excita-me. Uma dúvida feliz arrebata-me. O que faço?, rumo à beira-mar?, ou engalfinho-me nos arredores urbanos da noite que se anuncia? Desfaço-me das dúvidas diante de loja requintada. Modelos e fazendas escarlates sobem-me como caldo que incendeia. Observo a blusa de fazenda leve, talvez algodão quase transparente. Visto uma saia comprida, argolas como cinto, dourada de espelhos. No pescoço, não dispenso um colar que parece fantasia, mas arrebata-me artesanato em ouro. Sou outra pessoa. Não mais desejo mergulhar no novelo urbano da ante-noite, mas na suíte de meu hotel. Aconchegada, sobre tapete de pétalas, envolta em cortinas e ar-fresco, na entre-sombra que antecede o crepúsculo, quero olhar-me no espelho. Depois, de roupa nova luzidia, inundar-me do calor próprio dos amantes, enquanto diplomata estrangeiro admira-me entre as mesas do salão de chá, no hotel que tem nome de palácio.

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