quinta-feira, março 15, 2007

Águas do entardecer

O mar denunciava-me através do seu rugir milenar. Estava sentada sobre a pedra, as costas rijas, os braços como grosso cordão envolvendo as pernas, os joelhos encostados aos seios; tentativa vã e provisória de esconder minha nudez. À direita, algumas crianças corriam sobre as areias num jogo à péla; à esquerda, embarcação sem tripulantes tinha a popa sacudida pelo ir e vir das vagas. Ligeiro arrepio correu-me o corpo: ora o saliente respingar das espumas que explodiam num começo de maré alta, ora a incerteza dos momentos seguintes; brilho de pérola ao luzir do sol, imagem de marinheiro antigo a avistar-me, miragem de ilha perdida, voz plena de sal a desvendar mantos invisíveis. Frio intenso gelou-me o estômago, intenso ardor desceu-me ao baixo ventre, músculos vicejaram em descontrole, escorrer de água mais densa banhou-me. Por momentos desejei submergir e esconder-me sob a capa das águas do entardecer. Mas não tive tempo. Mão vigorosa tocou meu corpo. E num susto repentino, soltei os braços, afastei um pouco os joelhos e deixei meus seios explodirem. Eram duas rosas que desabrochavam, ou duas pequenas montanhas que convidavam à escalada. Tremi. Como um gigante que atemorizava navegantes doutros tempos e doutros mares, tomou-me nos braços e levou-me, incógnita e sob seda que era apenas sua pele curtida pelo sol. Fui colocada na embarcação fria e sacolejante. Ali mesmo, em meio ao cheiro forte de maresia e sobre chão banhado de pequenas línguas d'água que escorrendo de um lado a outro procuravam o caminho de volta ao oceano, abriu minhas pernas e penetrou-me. Meus gemidos, misturados aos estouros cada vez mais vigorosos da preamar, demoraram a se extinguir. Como a luz, que resistia às primeiras sombras da noite.

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