terça-feira, janeiro 24, 2017

Saudade

Estou com saudade de você. Lembra quando saíamos para ir à praia, passeávamos pelo litoral, íamos a bares e restaurantes? O mais engraçado foi aquele dia em que você me deixou sem o biquíni dentro d’água, numa praia em Rio das Ostras, e o local até estava bem frequentado. Lembra que frisson? Mas tudo acabou bem, e foi divertido, ufa! – eu falava com ele ao telefone, já fazia dois anos que não nos víamos.

Por falar em saudade, sabe que na Serra há um clima para se sentir mais saudades? Acho que é por causa da paisagem bucólica. A gente olha as montanhas, a vegetação, escuta o rolar dos córregos, essas coisas tocam lá no fundo, provoca aquele sentimento que brota direto do coração. Então desejamos estar ao lado das pessoas que amamos – ele continuava me ouvindo, calado, acho que desejava saber onde eu queria chegar com a minha história.

Por falar em córregos, aqui é bem legal, sabe. Outro dia fui a uma das cachoeiras. Fiquei tomando sol, lendo uma revista, observando as outras pessoas, até que presenciei uma cena engraçada. Lembrei-me das nossas ousadias. Passavam das quatro da tarde quando resolvi caminhar mais acima, ao lado das corredeiras. Após uns vinte minutos, parei para descansar junto a uma pedra. Havia ali uma sombra muito refrescante. De repente, encontrei uma peça de roupa sobre a pedra, na verdade um biquíni de mulher, e tão pequeno. Primeiro achei que alguém o havia perdido, ou mesmo numa brincadeira de namoro ficara esquecido sobre a impassibilidade daquela rocha. Mas não demorou, ouvi uma conversa. Tentei não fazer barulho, não queria ser descoberta. Tratava-se de um casal que namorava muito discretamente, num recôncavo, entre duas pedras tapadas pela ramagem de uma árvore maior. Queria saber quem eram as pessoas, já que conheço todo mundo neste lugar. Mas confesso que não consegui. Iria me expor, poderiam me surpreender, não ficaria bem. Continuei a acompanhar os sons, as vozes. A mulher às vezes parecia rir; outras, emitia um som de quem está satisfeita da vida. Num movimento rápido por entre a folhagem descobri que estava nua. O biquíni que eu encontrara na verdade pertencia a ela. Peguei-o nas mãos, enrolei-o bem pequenino e o coloquei na minha sacola. Caminhei, rápida, para longe dali. Mais adiante entrei na cachoeira e levei comigo o biquíni. Lavei-o da melhor maneira possível. A seguir, substitui o meu por aquele biquininho. Deu direitinho, só que deixava minha bunda toda de fora. Você é que ia gostar de me ver vestida assim, ou melhor, despida assim. Tomei banho com ele durante uns bons vinte minutos. Depois, vesti o meu novamente e voltei ao local onde o encontrara. Minha intenção era recolocá-lo sobre a pedra, no mesmo lugar de antes. Mas não havia viva alma. Enrolei-o novamente, bem pequenino, e o guardei na bolsa. Quem sabe descobriria a quem pertencia. Voltei para casa. Ontem fui de novo às cachoeiras, e não é que descobri uma mulher com duas peças diferentes? Era a Adalgisa, esposa do Nicanor, um motorista que vive mais em Macaé do que aqui na Serra.  O sutiã era semelhante ao biquíni que eu levara, aliás, que eu vestia naquele momento. Ainda bem que eu estava enrolada numa canga. É lógico que não pude mergulhar ali, apenas a cumprimentei e segui adiante. Mais à frente, fora do alcance de sua visão, tirei a canga e entrei na água que descia de uma das cachoeiras. Já pensou se ela descobrisse? Você gostou da historinha, não? Muito engraçada. Isso mesmo, engraçada e mais alguma coisa. Você sempre gosta. Vesti o biquíni da mulher porque era tão pequenino como jamais usei, nunca tive coragem de comprar um assim. E dá uma tesão... Se vou devolver a ela? Acho que não. O que eu poderia dizer? Acho arriscado, é melhor eu ficar com o biquíni para mim. Ah, não sei como ela voltou para casa sem o biquíni, talvez o homem arranjou um jeito. Namorado sempre tem jeito para tudo. O quê?, você também tem uma solução?, quer vir aqui para me roubar o biquíni? Ah, espera mais um pouco, quero aproveitar mais as cachoeiras com ele, me sinto quase nua, é tão bom. Qualquer dia desses eu telefono de novo, aí, quem sabe.

Depois de desligar o telefone, pensei bem. Melhor deixar assim, enquanto ficamos no nível das histórias tudo vai às mil maravilhas. E o biquininho, hein, tão bom, nada melhor do que namorar com ele!

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