sábado, novembro 04, 2006

Seios nus

Desloco-me no mundo, ando a passos mínimos e tenho gestos e olhos convenientes. Deslizo sobre areias úmidas, vou com os pés banhados vez ou outra em fios fugidios de mar prateado. Largo e protetor chapéu isola-me de calor que desejo apenas como amante suave, pleno de desejos submersos. Arrepio ligeiro percorre minha pele branca, indício de explosão que se avizinha. Os olhos, quero aguá-los de claridade, perdem-se nas vagas nada perscrutadores; vou trêmula só de pensar em possível ser vivente, homem ou doutra espécie. Quero-me só, sob sol desnudo. Tenho a idade das ostras maduras, prenhes de sabor, que escorrem licor exótico, ocultas em praias milenares plenas de algas, festa entre as espumas, rendas desfiadas que me vestem e ao mesmo tempo me revelam. Quando transpiro sou sal, visco atrativo, suspiro original. Recosto-me na brancura de areias intermináveis, percebo horizontes múltiplos, miragens de além-mar. De repente o susto: alguém prepara o desembarque. Avisos, sinais, premonições. Calculo minhas possibilidades. Descubro a cabeça, meus cabelos voam; com uma das mãos comprimo contra os seios o chapéu; mas ele encolhe, o tamanho menor rouba-lhe a elegância, a altivez; torna-se minúsculo e enfim desaparece deixando-me nua. Qualquer presença estrangeira impede-me a fuga. Meus passos miúdos trouxeram-me distraída cinco quilômetros de costa azul, de costa sul; e agora, sereia fora d’água em corpo inteiro de mulher, Eva plena de pejo.

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