quinta-feira, janeiro 18, 2007

Dayse

O Park shopping estava movimentado naquela tarde de terça. Dayse saíra da loja havia vinte minutos. Trajava vestido muito curto, de fazenda leve. Era difícil haver alguém que não a observasse, mesmo do sexo feminino. Gostava de chamar a atenção e tinha certeza que causaria forte impressão na pessoa que aguardava. Não tinha dúvida de que, embora estivesse atrasada, quem a esperava não desistiria. Caminhava graciosa; a pequena bolsa a tiracolo. Olhou algumas vitrines, sobretudo a da joalheria mais famosa. Apreciou pulseiras e colares e se apaixonou por uma pequena medalha que se encontrava bem abaixo de um cordão de ouro reluzente.

Quando ainda trabalhava, antes das quatro, tentou não perder de vista o homem elegante que vestia impecável terno marrom e apreciava os perfumes. Quando ele entrou e se dirigiu a ela, perguntou se a loja tinha o Kenzo. Claro que temos, respondeu, e do tradicional. Esse mesmo, foi o que ouviu dele. Tentou ainda vender alguma coisa a mais. Ele, porém, relutou, disse que estava muito satisfeito com o produto e com a vendedora. Ela sorriu, entregou-lhe o cartão, não sem tocar com muita suavidade uma de suas mãos. O homem, sempre sorrindo, entendeu o que ela desejava. Deu também o seu cartão e falou que andaria ainda pelo shopping, tinha tempo. A moça deixou escapar a resposta antecipada: aceitava conversar, o mínimo que fosse. Ele saiu com o pequeno embrulho dentro da bolsa que estampava o nome da loja. Esperaria.

Dayse agora andava pelo shopping. Deslizava delicada. As outras vendedoras a conheciam, tinha colegas por toda a parte, não queria que elas desconfiassem. Mas a roupa curta e a necessidade de transitar através de corredores cheios de gente provocavam efeito contrário, colocando-a em evidência a quem ela não desejava. A vitrine da joalheria era um lugar impessoal, diante dela se manteria anônima; além disso, as funcionárias não a conheciam e eram mais discretas.

Quando menos esperava, sentiu alguém lhe tocar um dos ombros. Voltou-se convicta. Era ele. Beijou-a sobre uma das faces, sorriu. Ela também não escondeu ligeiro sorriso. Vamos, foi o que ouviu da voz do homem. Deixaram o shopping em um Corola cinza metálico. Ela não perguntou onde iam. O automóvel, silencioso, deslizou pelas avenidas largas de Brasília. Dayse reparava o fim de tarde. Seu admirador mais recente, enquanto guiava, girava às vezes a cabeça à direita e lhe dirigia a face sorridente.
Vamos beber alguma coisa? Café com creme, ela respondeu. Não bebe champanha?, ele sugeriu com naturalidade, enquanto contornava o estacionamento do Mercure. Não está cedo para tanto?, ela procurava ser autêntica.

Um dos funcionários do hotel veio abrir a porta do carro para a moça saltar. Agradeceu, enquanto o acompanhante a segurava por um dos braços e lhe aguardava os passos; ela equilibrava-se, ágil, sobre grandes saltos. Aqui há uma cafeteria ótima, ele disse em voz baixa. Entraram sem precisar tocar porta alguma. Subiram ao terraço panorâmico e se sentaram. Uma garçonete de uniforme azul veio atendê-los. Entregou dois grandes cardápios e esperou.

Dayse tomou seu café e saboreou um crepe de muzzarella, rúcula e tomates secos. Ele experimentou licor de amêndoas. Conversaram sobre banalidades. Nenhum deles revelou-se.

Avizinhava-se a noite, o clima era temperado e o vestido da moça mostrou-se um tanto inoportuno. Toda arrepiada, tornou-se sensual; mostrava-se mais nua do que nunca e sua pele reluziu aos últimos raios de um sol quase de outono. Simulou breve abraço ao próprio corpo; queria proteger-se do vento frio e ao mesmo tempo esconder a quase nudez. Vamos, foi o que ouviu mais uma vez.

A suíte presidencial do Mercure era algo inimaginável para uma moça como ela. Apesar de ser vivida, de já ter freqüentado outros hotéis, não contava com todo aquele luxo. O homem a acariciava, mostrava-se terno, percorria-lhe os ombros nus com a ponta dos dedos. Dayse ainda trajava o leve vestido. Então ele decidiu despi-la, mas com muito cuidado, como desembrulhasse algo frágil e precioso. Depois a conduziu até a cama de casal, bastante larga, e a depositou no centro, com toda a suavidade do mundo. Namoraram durante boa parte da noite. Ele preocupou-se com ela o tempo todo, quis proporcionar-lhe o máximo prazer. A moça, por sua vez, o achou maravilhoso. Às onze da noite, abriram uma garrafa de champanha e, para acompanhar, comeram queijos gorgonzola e camembert. Em seguida, tiveram mais uma sessão de intenso amor. Dayse jamais sonhara com dia e noite tão esplêndidos, parecia conto de fadas.

No dia seguinte e no outro, não foi trabalhar. Ligou alegando doença. Ficou em casa lembrando aqueles momentos que acreditava mágicos e que dificilmente se repetiriam; ao menos com alguém de tal educação, como aquele homem.

Não esqueceria o momento de despedida. Amanhecia, ele a beijou dentro do automóvel. Um beijo longo e elegante; a seguir, a surpresa: o homem envolveu-lhe o pescoço com o cordão e a medalha que ela apreciara na joalheria. Sentiu-se tão feliz que quis retribuir o presente. Então teve a idéia...
Dayse desceu na quadra de casa. O único momento de aflição foi quando se apressou para não ser percebida: ia na verdade nua e com o corpo ainda quente.

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