quinta-feira, novembro 01, 2007

Caixa de incêndio

– Você precisava ver, foi um show, jamais pensei que eu ia gostar tanto daquela brincadeira.

– Você deve estar louca; já imaginou se alguém surpreende você?

– Na hora nem pensei nisso; só queria sentir prazer.

– E se alguém encontra a sacola?

– O prazer é intenso, e as incertezas pesam a favor.

As duas conversavam enquanto aguardavam a hora do filme. Eu, que tomava café na mesa ao lado, pegara a conversa pela metade. Pelo que pude entender, falavam sobre um homem que era bem-dotado e estava tendo um caso com a mais jovem. Esta continuou:

– Você precisa ver, todas as mulheres que trepam com ele aparecem lá nuas. Contando ninguém acredita. Tocam a campainha e ele abre. Dizem que às vezes tem até que marcar hora; sempre depois das dez da noite.

– Como assim? Como é possível receber tantas mulheres? Elas não se encontram ao acaso no prédio?

– Não sei, vai ver que até se encontram e nem ligam. Certa vez ele me disse que eu podia ficar escondida e observar. Foi o que fiz. Fiquei surpresa, num espaço de duas horas duas mulheres bateram à porta.

A conversa era estranha. O fato também me despertou o interesse. Queria saber que história era aquela.

– Elas ganham algum dinheiro? – ficou curiosa a que ouvia.

– Não, pelo que pude observar, fazem por prazer; e ele tem uma conversa terrível; não há mulher que não caia na conversa dele.

– Ah, eu não caio; você acha que eu vou chegar nua na casa de um homem? Nem que ele seja o mais rico do mundo, ou mesmo um ator lindo e famoso.

– Você está enganada; se for até lá, acaba cedendo.

Quem seria aquele homem? Comecei a ter vontade de saber. Não podia interromper a conversa e perguntar. A hora do filme se aproximava. Elas levantaram e entraram na fila. Quis segui-las, mas a princípio temi que percebessem.

Ainda ouvi:

– Se você quiser, podemos ir lá hoje. Você vai comprovar com os próprios olhos.

– Não, prefiro a minha tranqüilidade.

– Tranqüilidade? Se você for, não vai querer outra vida.

Só me restava segui-las. Estava sozinha e a conversa excitara-me. Assistiria ao filme; esforcei-me para não as perder de vista.

Às onze e quarenta e cinco, elas cruzaram a porta do Espaço de Cinema e entraram num táxi. Meu carro estava estacionado no outro lado da rua. Atravessei correndo, entrei e dei a partida. Procurei seguir o táxi a distância; temia que o motorista me percebesse. O carro trafegou por algumas ruas de Copacabana até entrar numa pequena transversal e parar junto a uma banca de jornal. Tive dificuldade de estacionar. Enquanto saltavam, escutei a mais esperta falar em voz alta.

– Se você não quer subir, espere-me aqui, mas tome cuidado, está deserto e vou demorar cerca de uma hora. O apartamento é o 602 – apontou o prédio.

As duas acabaram entrando. Corri para alcançá-las. Uma delas ainda segurou a porta do elevador para eu entrar. Talvez pensassem que eu fosse uma moradora. Agradeci e apertei o botão do oitavo andar. Depois desci os dois andares pela escada e escondi-me atrás da mureta.

A mais espevitada tirou rapidamente o vestido deixando-o nas mãos da amiga. Bateu suavemente à porta, que logo foi aberta. Entrou. A outra não demorou a decidir-se. Tirou também a roupa, colocou tudo na bolsa e a escondeu na caixa de incêndio.

Dez minutos depois, nua e com o coração aos saltos, ia eu. Mergulhava às cegas; não sabia se cortaria suave o espelho d’água ou se me esperava o azulejo da piscina vazia.

O que aconteceu dentro do apartamento é difícil descrever. Mas foi a água que me amorteceu o salto. E quente!

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