Joana entrou na loja, estava um tanto agitada.
– O que há, tudo bem? – perguntei.
– Preciso de umas roupas novas.
– Que bom. Tenho umas coisas ótimas, chegaram ontem à tarde, você vai adorar.
– Quero ver, vou experimentar todas.
– Fico feliz por ver você nesse entusiasmo. Alguma coisa mudou, não? – Perguntei enquanto, um tanto surpresa, olhava em sua direção. Procurei, porém, manter a discrição.
– Muitas coisas mudaram, agora vou ser uma mulher diferente.
Tirei as roupas das embalagens e fui colocando-as diante daquela mulher morena, alta, com expressão intensa.
– Andei adoentada, você soube, não?
– Acho que sim. Você desapareceu.
– Andei fazendo uns tratamentos, até que encontrei o médico certo, uma terapia nova.
– Que bom que você conseguiu.
– Descobri coisas que não enxergava antes. Agora quero explorar minha beleza, ser admirada.
– E sua filha, vai bem?
Ela me olhou de relance e se voltou para as roupas que tomava nas mãos. Temi ter tocado num assunto delicado, mas ela logo respondeu.
– Está tudo bem. Agora está na escola.
Lógico que eu não iria perguntar sobre o marido, já seria ir longe demais. Percebi que todos os problemas que ela vivera e talvez ainda vivesse tinha relação com ele.
– Precisamos nos encontrar fora daqui para conversar. Você vai gostar de me ouvir, aconteceram tantas coisas.
Tomou nas mãos dois vestidos, uma saia e uma blusa de tecido fino.
– Vou experimentar.
Enquanto estava no provador, chamou-me para que eu desse a minha opinião sobre as roupas em seu corpo. Não fiz mais do que elogiar. Vendo aquele corpo bonito de mulher, ainda pensei num outro modelo que achei que cairia melhor nela. Fui até um dos suportes, peguei a roupa e sugeri que ela também a experimentasse. A cor era preta; ela ficou deslumbrante.
– Vou levar tudo.
– Ótimo.
Depois que acertamos a forma de pagamento, ela pegou as embalagens, beijou-me e se foi sorridente.
– Precisamos nos encontrar num final de semana para conversar mais. Vamos marcar – sugeriu.
– Telefone, vai ser ótimo.
Joana era professora. Havia alguns meses que eu não a encontrava. Certa vez telefonei para sua casa com a intenção de lhe dizer sobre as roupas bonitas que recebêramos. Atendeu o marido. Identifiquei-me e disse que desejava falar com ela. Ele respondeu que a mulher andava adoentada, sofria de depressão e não queria falar com ninguém. Chegou a me dizer que ela precisava das amigas, que se pudesse fosse vê-la. Mas nunca fui. Não por não querer, mas devido à minha própria falta de organização.
No final de semana seguinte à sua estada na loja, ela me ligou e marcamos um encontro. Fomos a um dos restaurantes da orla marítima. Ela vestia uma das roupas compradas dias antes.
– Esse vestido ficou ótimo em você.
– Graças a você, amiga, que sempre tem o que é bom e melhor.
– Obrigada.
Ela levara a filha. Quieta, a menina comia um pedaço da pizza.
– Você sabe que estive doente?
– Sim, há alguns meses eu liguei pra você e seu marido me informou. Fiquei de fazer uma visita, mas nunca fui. Desculpe-me.
– Não precisa se desculpar. Sei os compromissos que as pessoas têm hoje em dia, é muito difícil corresponder a tudo.
– Mas se eu fosse mais organizada, poderia ter ido à sua casa fazer uma visitinha.
– Acho você tão organizada, tão, como se diz, tão centrada.
– É só impressão, sou um caos só.
Joana riu. A menina, sentada diante de nós, olhou-nos e sorriu também.
– Não sei o que aconteceu comigo, mas fiquei muito mal. Não sei como consegui me recuperar.
– Hoje essa doença é muito comum. E as mulheres são suas principais vítimas.
– Por que será, hein? – perguntou enquanto bebia um gole do copo de refrigerante.
– Não sei, mas desconfio que os homens sabem aproveitar a vida melhor do que nós. Por isso eles quase não sofrem desse mal.
– Talvez eles sofram, mas conseguem se desviar. Saem com os amigos, às vezes têm um caso extraconjugal, e acabam também por beber demais. Essas coisas servem de paliativo.
Escutava-se o leve marulhar, uma brisa suave chegava até onde nos encontrávamos, na varanda do restaurante. O local estava quase repleto, sobravam duas mesas.
– Eu acho que as mulheres sofrem de depressão porque não se realizam em muitos aspectos – insinuou.
– Como assim?
– Nós ficamos presas a alguém e acabamos por acreditar que somos felizes, enquanto a outra pessoa, na maioria das vezes, começa a deixar esfriar a relação, entende? Deixa cair na rotina. Então nós ficamos tentando, tentando e acho que é isso que adoece. Vou contar pra você porque sei que não vai passar adiante. Eu estava me sentindo muito sozinha, mesmo casada. Acho que isso me fez mal. Passei a fazer terapia, sabe? Ele, o terapeuta, me disse que eu tinha de me valorizar mais, tinha de sair, ter outras opções, que minha vida estava passando e eu estava deixando tudo de lado. Os homens parecem que ficam satisfeitos com seus pequenos afazeres. Nós precisamos talvez de algo mais, não sei.
– Acho que a gente precisa aproveitar, sim. Acho também que não se deve temer o fato de se ficar sozinha. Deve-se procurar graça nos pequenos prazeres.
– Como assim? – Joana mostrava-se curiosa com a minha simplicidade de ver as coisas.
– Por exemplo, adoro tomar café. Então em determinado momento da tarde, vou até a cafeteria próxima e tomo o café. Sorvo-o vagarosa, tento sentir o máximo de sabor. Depois fumo um cigarro. Hoje todos condenam o fumo, mas eu dou alguns tragos e sinto um prazer imenso. Mas veja, é preciso fazer as coisas com gosto. Não mecanicamente, só por costume; aí, nada mais tem graça.
– Acho que você tem muito prazer também em trabalhar, não? Vejo você apanhar as roupas com tanto carinho, arranjá-las de modo admirável. Fico observando você e penso que eu deveria ser assim. Você parece que sente prazer em tudo.
– Realizo-me em muitas coisas, você tem razão.
A menina acabara seu pedaço de pizza e queria mais um pouco de guaraná. Joana pegou o refrigerante e encheu o copo com mais um pouco da bebida.
– Você namora alguém? – perguntou-me Joana.
– Ah, todo mundo me pergunta isso, é impressionante. Acho que namoro todas as coisas.
– Verdade? Mas como você faz?
– Como eu falei, fazendo uma coisa de cada vez e com gosto...
– Mas e namorado, um homem de verdade?
– Não sei se existem homens de verdade. Às vezes prefiro ficar sozinha.
– Como você suporta?
– Não é que eu não tenha ninguém, mas não é nada muito sério, só diversão.
– Sabe, acho que eu deveria ser assim, como você, por isso quis marcar para conversar sobre isso.
– Sobre o quê?
– Sobre isso, sobre desejos, namorados, a vida enfim, não sei...
– Nós não podemos depender dos homens. Há pessoas que dizem que encontraram o par ideal, mas isso é muito difícil, todos têm problemas.
– É verdade – continuou – todas temos problemas. E às vezes é a falta de perspectiva de solução que nos deixa mal. Você nunca sofreu por alguém?
– Já, uma ou duas vezes. Mas passou rápido. Como eu disse, encontro prazer em quase tudo.
– Meu marido é boa pessoa. Gosto dele. Mas não sei o que aconteceu nos últimos tempos, nos afastamos muito.
– Acho que acontece com todo mundo. É difícil que tudo seja sempre como no início. Não quero dizer que isso seja motivo para não se ter ninguém, para se viver na mais completa solidão.
O garçom apareceu e eu pedi uma caipirinha. Joana se surpreendeu.
– A bebida não lhe faz mal?
– Bebo pouco; e caipirinha é melhor porque bebo apenas uma ou duas.
– Você sabe viver. Quem ensinou essas coisas a você?
– Ninguém. Ou melhor, gosto muito de ler. Assim encontro várias personagens, várias idéias, e acabo tirando um grande proveito de tudo. Mas leio romances mesmo, nada de auto-ajuda.
– Você é contra a auto-ajuda?
– Não, mas não gosto.
– Como a leitura ajuda você, então?
– Não leio para obter ajuda; leio porque gosto, por puro prazer. Quando se descobre o prazer que a leitura proporciona, não se quer outra vida. É muito legal.
Joana riu. Um vento mais forte varreu a beira da praia. Algumas pessoas encolheram os braços, outras ajeitaram o agasalho.
– Quando eu era solteira, tive um namorado que vivia lendo. E eu tinha ciúmes por ele encontrar tanto prazer em companhia dos livros. Até disse a ele que um homem não poderia se casar e ler tanto – Joana riu após as últimas palavras. – E olha, acho que ele é igual a você, está solteiro até hoje.
– Esse então também descobriu o segredo da vida – arrisquei e dei um ligeiro sorriso.
– E quando você arranja alguém que não gosta das mesmas coisas que você?
– Normalmente não fico com ninguém que não combina pelo menos em alguma coisa comigo.
– Mas esse seu jeito intelectual acaba por tornar você mais exigente...
– Só se for para um relacionamento mais longo. Quando percebo como o homem é, principalmente se é do tipo possessivo, na segunda ou terceira vez digo que não quero mais.
– E se ele for bom de cama? – Joana perguntou de um modo que a filha não ouvisse.
– Se o problema for esse, conheço muita gente boa de cama, não é preciso que seja um namorado.
Joana pôs-se a rir.
– Você realmente sabe viver, não?
A menina de repente falou:
– Mãe, lá vem o papai.
E realmente vinha.
– Eu disse para ele que estaríamos aqui, espero que você e não se incomode.
– Não, claro que não.
O marido de Joana chegou sorridente. Parecia que já tinha bebido um pouco. Beijou a filha, a mulher e me cumprimentou. Sentou-se e pediu um chope ao garçom que se aproximava.
Dali em diante ficamos algum tempo em silêncio. Depois, Joana pôs-se a lhe contar sobre as roupas que comprara e sobre a loja em que eu trabalhava. No final, deixei-os; aleguei um compromisso para aquela noite ainda. Sorriram. Não me deixaram pagar minha despesa. Joana ainda me beijou e, pelo movimento que fez com os olhos, percebi que sentira atração pelo meu posterior compromisso.
– O que há, tudo bem? – perguntei.
– Preciso de umas roupas novas.
– Que bom. Tenho umas coisas ótimas, chegaram ontem à tarde, você vai adorar.
– Quero ver, vou experimentar todas.
– Fico feliz por ver você nesse entusiasmo. Alguma coisa mudou, não? – Perguntei enquanto, um tanto surpresa, olhava em sua direção. Procurei, porém, manter a discrição.
– Muitas coisas mudaram, agora vou ser uma mulher diferente.
Tirei as roupas das embalagens e fui colocando-as diante daquela mulher morena, alta, com expressão intensa.
– Andei adoentada, você soube, não?
– Acho que sim. Você desapareceu.
– Andei fazendo uns tratamentos, até que encontrei o médico certo, uma terapia nova.
– Que bom que você conseguiu.
– Descobri coisas que não enxergava antes. Agora quero explorar minha beleza, ser admirada.
– E sua filha, vai bem?
Ela me olhou de relance e se voltou para as roupas que tomava nas mãos. Temi ter tocado num assunto delicado, mas ela logo respondeu.
– Está tudo bem. Agora está na escola.
Lógico que eu não iria perguntar sobre o marido, já seria ir longe demais. Percebi que todos os problemas que ela vivera e talvez ainda vivesse tinha relação com ele.
– Precisamos nos encontrar fora daqui para conversar. Você vai gostar de me ouvir, aconteceram tantas coisas.
Tomou nas mãos dois vestidos, uma saia e uma blusa de tecido fino.
– Vou experimentar.
Enquanto estava no provador, chamou-me para que eu desse a minha opinião sobre as roupas em seu corpo. Não fiz mais do que elogiar. Vendo aquele corpo bonito de mulher, ainda pensei num outro modelo que achei que cairia melhor nela. Fui até um dos suportes, peguei a roupa e sugeri que ela também a experimentasse. A cor era preta; ela ficou deslumbrante.
– Vou levar tudo.
– Ótimo.
Depois que acertamos a forma de pagamento, ela pegou as embalagens, beijou-me e se foi sorridente.
– Precisamos nos encontrar num final de semana para conversar mais. Vamos marcar – sugeriu.
– Telefone, vai ser ótimo.
Joana era professora. Havia alguns meses que eu não a encontrava. Certa vez telefonei para sua casa com a intenção de lhe dizer sobre as roupas bonitas que recebêramos. Atendeu o marido. Identifiquei-me e disse que desejava falar com ela. Ele respondeu que a mulher andava adoentada, sofria de depressão e não queria falar com ninguém. Chegou a me dizer que ela precisava das amigas, que se pudesse fosse vê-la. Mas nunca fui. Não por não querer, mas devido à minha própria falta de organização.
No final de semana seguinte à sua estada na loja, ela me ligou e marcamos um encontro. Fomos a um dos restaurantes da orla marítima. Ela vestia uma das roupas compradas dias antes.
– Esse vestido ficou ótimo em você.
– Graças a você, amiga, que sempre tem o que é bom e melhor.
– Obrigada.
Ela levara a filha. Quieta, a menina comia um pedaço da pizza.
– Você sabe que estive doente?
– Sim, há alguns meses eu liguei pra você e seu marido me informou. Fiquei de fazer uma visita, mas nunca fui. Desculpe-me.
– Não precisa se desculpar. Sei os compromissos que as pessoas têm hoje em dia, é muito difícil corresponder a tudo.
– Mas se eu fosse mais organizada, poderia ter ido à sua casa fazer uma visitinha.
– Acho você tão organizada, tão, como se diz, tão centrada.
– É só impressão, sou um caos só.
Joana riu. A menina, sentada diante de nós, olhou-nos e sorriu também.
– Não sei o que aconteceu comigo, mas fiquei muito mal. Não sei como consegui me recuperar.
– Hoje essa doença é muito comum. E as mulheres são suas principais vítimas.
– Por que será, hein? – perguntou enquanto bebia um gole do copo de refrigerante.
– Não sei, mas desconfio que os homens sabem aproveitar a vida melhor do que nós. Por isso eles quase não sofrem desse mal.
– Talvez eles sofram, mas conseguem se desviar. Saem com os amigos, às vezes têm um caso extraconjugal, e acabam também por beber demais. Essas coisas servem de paliativo.
Escutava-se o leve marulhar, uma brisa suave chegava até onde nos encontrávamos, na varanda do restaurante. O local estava quase repleto, sobravam duas mesas.
– Eu acho que as mulheres sofrem de depressão porque não se realizam em muitos aspectos – insinuou.
– Como assim?
– Nós ficamos presas a alguém e acabamos por acreditar que somos felizes, enquanto a outra pessoa, na maioria das vezes, começa a deixar esfriar a relação, entende? Deixa cair na rotina. Então nós ficamos tentando, tentando e acho que é isso que adoece. Vou contar pra você porque sei que não vai passar adiante. Eu estava me sentindo muito sozinha, mesmo casada. Acho que isso me fez mal. Passei a fazer terapia, sabe? Ele, o terapeuta, me disse que eu tinha de me valorizar mais, tinha de sair, ter outras opções, que minha vida estava passando e eu estava deixando tudo de lado. Os homens parecem que ficam satisfeitos com seus pequenos afazeres. Nós precisamos talvez de algo mais, não sei.
– Acho que a gente precisa aproveitar, sim. Acho também que não se deve temer o fato de se ficar sozinha. Deve-se procurar graça nos pequenos prazeres.
– Como assim? – Joana mostrava-se curiosa com a minha simplicidade de ver as coisas.
– Por exemplo, adoro tomar café. Então em determinado momento da tarde, vou até a cafeteria próxima e tomo o café. Sorvo-o vagarosa, tento sentir o máximo de sabor. Depois fumo um cigarro. Hoje todos condenam o fumo, mas eu dou alguns tragos e sinto um prazer imenso. Mas veja, é preciso fazer as coisas com gosto. Não mecanicamente, só por costume; aí, nada mais tem graça.
– Acho que você tem muito prazer também em trabalhar, não? Vejo você apanhar as roupas com tanto carinho, arranjá-las de modo admirável. Fico observando você e penso que eu deveria ser assim. Você parece que sente prazer em tudo.
– Realizo-me em muitas coisas, você tem razão.
A menina acabara seu pedaço de pizza e queria mais um pouco de guaraná. Joana pegou o refrigerante e encheu o copo com mais um pouco da bebida.
– Você namora alguém? – perguntou-me Joana.
– Ah, todo mundo me pergunta isso, é impressionante. Acho que namoro todas as coisas.
– Verdade? Mas como você faz?
– Como eu falei, fazendo uma coisa de cada vez e com gosto...
– Mas e namorado, um homem de verdade?
– Não sei se existem homens de verdade. Às vezes prefiro ficar sozinha.
– Como você suporta?
– Não é que eu não tenha ninguém, mas não é nada muito sério, só diversão.
– Sabe, acho que eu deveria ser assim, como você, por isso quis marcar para conversar sobre isso.
– Sobre o quê?
– Sobre isso, sobre desejos, namorados, a vida enfim, não sei...
– Nós não podemos depender dos homens. Há pessoas que dizem que encontraram o par ideal, mas isso é muito difícil, todos têm problemas.
– É verdade – continuou – todas temos problemas. E às vezes é a falta de perspectiva de solução que nos deixa mal. Você nunca sofreu por alguém?
– Já, uma ou duas vezes. Mas passou rápido. Como eu disse, encontro prazer em quase tudo.
– Meu marido é boa pessoa. Gosto dele. Mas não sei o que aconteceu nos últimos tempos, nos afastamos muito.
– Acho que acontece com todo mundo. É difícil que tudo seja sempre como no início. Não quero dizer que isso seja motivo para não se ter ninguém, para se viver na mais completa solidão.
O garçom apareceu e eu pedi uma caipirinha. Joana se surpreendeu.
– A bebida não lhe faz mal?
– Bebo pouco; e caipirinha é melhor porque bebo apenas uma ou duas.
– Você sabe viver. Quem ensinou essas coisas a você?
– Ninguém. Ou melhor, gosto muito de ler. Assim encontro várias personagens, várias idéias, e acabo tirando um grande proveito de tudo. Mas leio romances mesmo, nada de auto-ajuda.
– Você é contra a auto-ajuda?
– Não, mas não gosto.
– Como a leitura ajuda você, então?
– Não leio para obter ajuda; leio porque gosto, por puro prazer. Quando se descobre o prazer que a leitura proporciona, não se quer outra vida. É muito legal.
Joana riu. Um vento mais forte varreu a beira da praia. Algumas pessoas encolheram os braços, outras ajeitaram o agasalho.
– Quando eu era solteira, tive um namorado que vivia lendo. E eu tinha ciúmes por ele encontrar tanto prazer em companhia dos livros. Até disse a ele que um homem não poderia se casar e ler tanto – Joana riu após as últimas palavras. – E olha, acho que ele é igual a você, está solteiro até hoje.
– Esse então também descobriu o segredo da vida – arrisquei e dei um ligeiro sorriso.
– E quando você arranja alguém que não gosta das mesmas coisas que você?
– Normalmente não fico com ninguém que não combina pelo menos em alguma coisa comigo.
– Mas esse seu jeito intelectual acaba por tornar você mais exigente...
– Só se for para um relacionamento mais longo. Quando percebo como o homem é, principalmente se é do tipo possessivo, na segunda ou terceira vez digo que não quero mais.
– E se ele for bom de cama? – Joana perguntou de um modo que a filha não ouvisse.
– Se o problema for esse, conheço muita gente boa de cama, não é preciso que seja um namorado.
Joana pôs-se a rir.
– Você realmente sabe viver, não?
A menina de repente falou:
– Mãe, lá vem o papai.
E realmente vinha.
– Eu disse para ele que estaríamos aqui, espero que você e não se incomode.
– Não, claro que não.
O marido de Joana chegou sorridente. Parecia que já tinha bebido um pouco. Beijou a filha, a mulher e me cumprimentou. Sentou-se e pediu um chope ao garçom que se aproximava.
Dali em diante ficamos algum tempo em silêncio. Depois, Joana pôs-se a lhe contar sobre as roupas que comprara e sobre a loja em que eu trabalhava. No final, deixei-os; aleguei um compromisso para aquela noite ainda. Sorriram. Não me deixaram pagar minha despesa. Joana ainda me beijou e, pelo movimento que fez com os olhos, percebi que sentira atração pelo meu posterior compromisso.
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