domingo, novembro 21, 2010

Vamos então assistir

Estava agachada, atrás de um automóvel, com o coração aos saltos. Um homem inesperado notou algo. Ficou a observar, disfarçado. Acabou por perceber o estranho acontecimento. Acho que no início pensou que se tratava de um bicho. Ao começar a investigar viu que era uma pessoa, uma mulher... Mostrou-se surpreso e ao mesmo tempo temeroso em se aproximar. Olhou para um lado e para o outro. Talvez pensou que fosse uma armadilha. Chegou-se, pertinho.

"Algum problema, senhorita?"

"Não, não há problema nenhum", nessas horas é preciso mostrar firmeza, eles não esperam por isso.

"Mas a senhorita está nua, numa rua, já passam das duas da madrugada."

"Silêncio, espera um pouco que conto o que aconteceu. Agacha também, aqui, ao meu lado."

Obedeceu, já o tinha nas mãos.

"Fica quieto. Mais ninguém pode se aproximar."

"Por quê?"

"Achas que uma mulher gosta de estar pelada e à mostra para todo mundo?"

"Mas o que aconteceu, a senhorita foi asssaltada?"

"O que achas?", responder com novas perguntas é um método eficaz.

"Acho que é provável. Quer que eu tente lhe arranjar uma roupa?"

"Não é possível também que seja uma pegadinha?"

"Como? Dessas que aparecem na televisão?"

"Não gostarias de aparecer na TV ao lado de uma mulher bonita e nua?", eu precisava continuar com a iniciativa.

"Eu? Ao lado de uma mulher nua, na TV? Acho que minha mulher me mata. A senhorita não sabe como ela é brava."

"Sua esposa gosta do programa da Mary Fake, na Rede TVI?"

"O programa da dona Mary? Ela adora, não perde um."

"Que tal ela assistir ao quadro: 'Seu marido é fiel?'"

"Existe mesmo esse quadro, no programa?"

"Ainda não, mas este será o primeiro episódio para testar o primeiro marido fiel."

"Oh, não, minha mulher vai me matar!"

"Então, vá, corra! Tens alguma chance."

"Verdade?"

"Quem sabe?"

O homem levantou-se e correu para o outro lado da rua. Desapareceu dentro da noite. A porta do carro foi aberta. Entrei, ligeira.

"Assim me matas", falei ao meu namorado.

"Mas você está morrendo de rir..."

"Não sei como podes sentir prazer me fazendo passar por uma situação dessas", falei em meio à tentativa vã de conter o riso.

"E por que você ri?"

"Vais já saber."

"Se você está rindo é porque acabou gostando."

"Quero viver todas as loucuras que me propões", conseguira me controlar.

"Mas que foi bom, foi, não?"

"Será?", eu, irônica.

"Você conseguiu gravar a cena com o homem?"

"Isso não estava no script."

"Gravou ou não gravou?"

"Sempre falas que sou a mulher mais eficiente do mundo, o que achas?"

"Vamos então assistir, estou morrendo de tesão!"

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