Naquele tempo a praia do Flamengo tinha uma parte reservada. Havia pedras formando uma barreira, acho que separava a praia
de um matagal, local onde depois viriam construir a Marina, a seguir se estendia
a própria praia, que todo mundo
frequentava. Mas a gente gostava mesmo era da parte escondida, onde se podia
ficar à vontade. Nos reuníamos desde às onze ou doze horas da manhã, as
meninas, como éramos conhecidas, e aproveitávamos para tomar banho sem o top.
Podia aparecer alguém ou, quem sabe, a polícia? Na teoria, sim, mas não na
prática. Quero dizer, tínhamos protetores com boas relações. A polícia não
aparecia ali. Caso acontecesse, era para nos admirar e nos proteger. Entrávamos
n’água e nos cobríamos até o pescoço, ninguém sabia que estávamos seminuas. Às
vezes surgia na pequena extensão de areia alguns curiosos, já sabiam que nos
banhávamos naquele trecho, disfarçavam e esperavam que saíssemos d’água, alguns se escondiam ou faziam de conta que
não nos observavam, mas queriam mesmo era nos surpreender com os seios de fora. Que bobagem tudo aquilo!, o que tem de mais um ser humano qualquer com os
peitos de fora? Mas toda aquela gente sentia muita graça nisso, muita
excitação. Certo dia apareceu um homem jovem que entrou n’água
e veio até nós, arranjou uma conversa fiada e esperou que ríssemos de suas
piadas. Amelinha foi na onda, aceitou a brincadeira e resolveu ficar frente a ele,
conversando e se divertindo. Ele não sabia do principal, ela me contou depois. Como?, indaguei. Não sabia mesmo, quando disse, continuou Amelinha,
ficou surpreso, como vocês fazem para que ninguém note?, perguntou, a voz dele,
segundo ela, trazia alguma excitação; as pessoas notam, sim, elas sabem, e
convivem com isso, disse minha amiga; eu não notei, ele falou; agora que você
já sabe..., ela sorriu, sem concluir. Ele, porém, entendeu de outra
maneira, abraçou-a, achou que fosse um convite. E você deixou, Amelinha?, perguntei. Ele era
musculoso e fofinho, observou. O homem agarrou-se a ela e não quis soltá-la
de modo algum. Ficaram no abraço apertado. Por que você não toma banho de
mar nua por inteiro, ele quis saber; à princípio senti um arrepio, depois me refiz e respondi seria
um escândalo, não?, apenas os seios de fora já está até bom demais, você não
acha melhor a gente marcar pra depois, num outro lugar?, disse Amelinha, fazendo
de conta que estava incomodada com o abraço, que durava. Qualquer homem aceitaria, mas ele... Que tal aqui, agora e depois?, ele, malandramente. Ela não teve outra saída senão rir. Se não o quisesse, deveria ter recusado desde o começo. Então, aconteceu. Ficaram os dois durante mais de uma hora. Vem cá, Rosana,
preciso de você, ela me chamou depois que o rapaz partiu. Que bom eu ia por perto, a gente
sempre ajuda os amigos. Ela estava tranquila, e ria muito. Esses rapazes são
muitos traquinas, adivinha o que ele quis? Um beijo na boca, respondi afoita. Nada disso, deslize as mãos aqui. Segurou minhas mãos fazendo que descessem desde a cintura até a coxas. Deixei escapar um ah! Ele disse que devolve no nosso encontro de logo mais, vou tentar acreditar, sorriu. Amelinha tem bom humor. Esses engraçadinhos são tão sedutores, cheguei
a dizer. Minha amiga concordou, concordou e suspirou.
quarta-feira, junho 28, 2017
quarta-feira, junho 21, 2017
Mecânica
Você compreende?, a maioria dos homens não, eles acham
estranho mulher comandar oficina mecânica. Antes era eu e me meu ex-marido.
Ele era responsável pelo setor de reparos e manutenção, eu pela administração e contabilidade. Depois do divórcio, me tornei a responsável por tudo. Algumas pessoas pensaram que não
daria certo uma mulher no comando de um tipo de trabalho segundo elas muito masculino. Mas consegui, a oficina vai bem, obrigada, às vezes com mais automóveis do que antes.
Outra coisa também, muito interessante na imaginação de muitas pessoas, é que
uma mulher no meio de tantos homens serve apenas para despertar fantasias sexuais.
Já tive um namorado que me perguntou se eu já havia transado com alguns dos
meus mecânicos. Acho que me imaginava nua entre eles, o corpo
escorregadio luzindo a lubrificante. Os homens sentem tesão ao pensar nisso. O
tal namorado podia me ter conquistado, podia ter permanecido comigo, quem sabe
se tornado meu companheiro, mas sua mentalidade não era de um verdadeiro homem. Aliás, até agora não encontrei verdadeiros homens, pode ser que eles não
existam, ou existam apenas na cabeça das mulheres. O importante é que tenho meu meio de
sobreviver, a oficina, espero que continue assim. Há pessoas que me acham uma
pessoa sem cultura, tudo porque este tipo de trabalho não é intelectual, mesmo
que eu tenha de fazer contas, saber preços, e entender de alguns sistemas. Acham
que o importante são as profissões universitárias, o chique é frequentar
bibliotecas ou auditórios de faculdades. Ledo engano. O fato de alguém viver em
meio a cheiro de óleo, de graxa não significa que seja
pessoa sem cultura. Os homens que se aproximam de mim é que precisam, pouco a
pouco, descobrir minhas qualidades. Leio livros sim, e muitos. Você reparou
minas roupas?, não uso roupas curtas ou extravagantes, no máximo calças de liga,
como a que estou vestindo hoje. Mas não acho este tipo de roupa indecente,
porque modela as coxas e deixa o bumbum saliente. Mulheres vestidas assim não
estão à procura de homens, como algumas pessoas imaginam. E ter homem, hoje em
dia, na maioria das vezes não é bom para as mulheres. Eles perturbam e, quase
todos, primam pela infidelidade. Há mulheres que traem seus maridos, mas é
muito maior a quantidade de homens que traem as suas mulheres, além disso, após nos conquistarem partem imediatamente para outra. Ah, acho que já falei demais,
agora fale um pouco, quero saber se você é diferente dos outros. E tem ainda uma
coisa, a maioria do público masculino deseja logo levar a mulher para cama. Eu
posso deitar com alguém, mesmo à primeira vista, mas se noto que tenta me
enganar não apareço mais, deixo na saudade. Houve um que vinha aqui para a manutenção do seu carro, ao perceber que vivo sozinha passou a frequentar a oficina,
mas com outros fins, como me ver, e me convidar para um cafezinho aqui ao lado. Era muito charmoso, mas descobri que era
casado. Não deixaria de sair com ele por razões morais, mas porque mentiu. Então lhe disse que poderia ser sua amiga, no máximo, nada de ficar me cantando o
tempo todo. Conclusão, não apareceu mais.
quarta-feira, junho 14, 2017
Tatuagem
De repente recebi a mensagem, e fiquei desconcertada. Após
tanto tempo sem falar comigo, como ele poderia me fazer um pedido daquele? Uma
foto, era o que queria, e da minha tatuagem. Pelo menos poderia ter perguntado
se eu ainda a conservava. Tatuagens não saem sozinhas, mas eu poderia ter
desistido, poderia tê-la apagado, ou mesmo feito outra na mesma pele. Mas ele
foi taxativo, queria a foto, ainda salientava pode fotografar apenas o local,
nada de maiores detalhes. Sabia aquele ex-namorado que dois centímetros abaixo apareceria
na fotografia algo que eu, antes, gostava muito de mostrar. Você está sozinha,
separada, argumentava ele, não há problema algum me enviar uma foto de tua
tatuagem, ninguém vai saber de quem se trata, ou quem porta o desenho.
O que respondo?, ou deixo sem resposta? As pessoas dizem por aí que se a gente
responde é porque já há alguma atração, algum interesse. O silêncio é a resposta
de quem nada sente, se não sente não há o que dizer. Mas não sou mineral, não sou
pedra. Estava colocada a questão. Já que sou de carne e de osso ficaria a me perguntar, a desenhar possibilidades? Lembrei-me das histórias de Clarice Lispector. A narradora não conta histórias, nada num mar cheio de escolhos, sempre o naufrágio iminente, mas não desiste, luta com palavras, formulações que lhe servem de coletes salva-vidas. E mesmo assim há o risco do choque, há pedras a esmo, minas prestes a explodirem. A paixão segundo G.H., O livro dos prazeres, A hora da estrela. Nomes sugestivos para histórias terríveis. Uma pergunta aparentemente sem importância, muitas palavras, e a responta cada vez mais distante. No final, percebe-se a mulher não mais à procura de sua inteireza, mas consciente de que é fragmento, mesmo assim desejos e orgulho presentes, não se abandona o que temos de mais precioso. "- Veja aquela moça ali, por exemplo, de maiô vermelho. Veja como anda com um orgulho natural de quem tem um corpo. Você, além de esconder o que se chama alma, tem vergonha de ter um corpo." Gostaria de ser como Clarice, escrever livros e mais livros por uma causa que poucas pessoas enxergam, ou às vezes acham-na banal: uma mulher que descobre a sujeira deixada pela faxineira, e acaba por se ver sozinha diante do irremediável. Meu corpo, o irremediável. Volto ao ex-namorado, ao seu pedido, à minha tatuagem. Tenho amigas que se olhariam no espelho, pousariam as
mãos sobre as coxas, sorririam a si mesma, e não perderiam mais tempo,
enviariam a tal foto e esperariam pelo homem. Conheço uma que o esperaria nua, a
tatuagem à mostra, mesmo que não a tivesse inventaria. Mas, quanto a mim, as
coisas marcham devagar, por isso há quem diga que estou ficando velha, que já não
tenho interesse por sexo. Não é verdade, claro que me interesso, sobretudo
por sexo, vamos, porém, sem precipitações. Minha resposta levou alguns dias para sair, mas saiu, curta, e partiu: foto da tatuagem? Ele não enviou contra-resposta, era o
jeito dele. Minha indagação ficou no ar. Pronto, acho que não mais incomoda,
talvez eu tenha encontrado a solução, uma pergunta em relação ao pedido, uma
pergunta que repete o próprio pedido, como se eu não tivesse entendido.
Morreria o assunto, ele que procurasse tatuagens no corpo de outras
mulheres, ou onde quer que fosse. Caso eu entrasse no jogo dele, sei que rolaria
cama, mas era isso o que eu queria? Então, melhor esperar. Três dias depois, enviou a contra-responta.
Cadê a foto? Naquele momento comecei a arder, e quando uma mulher arde não há água que
lhe apague o fogo. Foi então que percebi um homem que rondava a minha casa fazia três dias. Seria um ladrão, um tarado? Comecei a ficar preocupada. No quarto dia, porém, veio conversar comigo, perguntou se eu ainda frequentava a praia, em frente ao Country. Respondi que sim, mas apenas quando fazia calor, o tempo ultimamente não estava para praias. Falou que atendia no quiosque em frene, e que eu parava pra tomar vez ou outra um refrigerante. Lembrei-me do homem, era eu mesma, disse a ele. Sorriu. Estou com um pequeno restaurante no final da praia perto do Pecado, aparece lá, é um convite. Lembro também da tua tatuagem!, finalizou e se despediu. Voltei pra casa matutando os dois acontecimentos, o ex-namorado com o pedido de uma foto e esse agora, que me servia no quiosque. Não respondi mais ao primeiro, estava muito longe, o que passou passou. No domingo seguinte choveu, não saí de casa. Mais uma semana e um sol de arder. Preparei-me, nada de facilitações, fui à praia. Cheguei às dez, apenas uma e trinta fui ao restaurante. Meu admirador logo me avistou, veio à porta receber-me e arranjou uma mesa especial pra mim. Deixei-o louco, eu vestia uma sainha curta e miniblusa, o biquíni por baixo, a tatuagem aparecendo e escondendo-se. Depois de almoçar, conversar, beber uma caipirinha, agradeci e fugi do homem. Se ficasse, não daria bom resultado, não é bom deixar que nos desatem o biquíni num primeiro encontro. Aliás, nem seria o primeiro, mas pra ficar nua sob a sainha seria, sim. Deixei passar uma semana, quem sabe duas, então voltei. Então... Melhor vocês imaginarem. Quero ainda dizer, por mais que imaginem ainda vai faltar alguma coisa!
quarta-feira, junho 07, 2017
Marquinha do biquíni
Esta história aconteceu há mais ou menos dez anos. Na época,
ainda não havia por aqui smartphones, escrevi e arquivei num notebook antigo,
que logo pifou. Agora, que consegui recuperar a memória daquele computador, descobri
acontecimentos que vivi e anotei, algumas histórias estão prontas. A que vai a
seguir é uma delas.
Estávamos numa praia retirada. Este é mesmo o melhor vocábulo:
retirada. À época, ainda não havia estrada para chegarmos a ela. Foi preciso
escalar um morro, acho que uma hora ou uma hora e meia de subida e descida. Ao
pisarmos nas areias, eu, Augusta e Frida sentimos um friozinho no estômago. Que
maravilha!, ninguém a nos incomodar, uma praia inteira para nós, quem sabe
pudéssemos mesmo acampar, passar ali vários dias.
“Não trouxemos tenda para acampamento”, alertou Augusta.
É mesmo, estávamos mesmo desprevenidas, apenas a roupa do
corpo, o biquíni por baixo e cada uma com sua bolsa e o conteúdo que toda
mulher acha necessário para as circunstâncias.
Estendemos nossas tolhas sobre a areia, abrimos um guarda
sol, nem precisamos nos preocupar com nossos pertences. O mar estava
maravilhoso, as ondas explodiam longe, havia uma extensa faixa de areia, a água
transparente chegava mansa, respeitosa, quase surpresa com nossa presença.
“Sempre quis bronzear os seios”, disse Augusta excitada pelo
momento, “nada de marca do top, dessa vez meu namorado vai ficar surpreso, como
você pode ter marquinha do biquíni e não do top?, ele vai perguntar.”
“O que você vai dizer?”, Frida falou de olhos bem abertos.
“Vou sugerir que adivinhe”, completou demonstrando muita
alegria.
Acompanhamos seu entusiasmo.
“Você tem razão”, disse eu, “aqui não há ninguém, podemos
até mesmo ficar nuas.”
“Nua, nua, acho melhor não, vou ficar apenas sem o top”,
afirmou Augusta, e foi tirando a parte de cima do biquíni, admirou os próprios seios,
olhou para nós duas e riu, depois se deitou esquecida da vida. Não passou muito
tempo para Frida seguir seu exemplo, primeiro deitou-se de costa, depois soltou
os laços, puxou o sutiã com os seios encostados na toalha e permaneceu na posição,
seus seios grandes pressionando a toalha. Pediu que eu passasse o protetor
solar. Fechou os olhos e fez de conta que aquilo era a ação mais normal do
mundo.
Eu, que sou um tanto atirada, até ali permanecia vestida, as
duas peças nos devidos lugares. Caminhei à beira d’água e molhei os pés, estava
gelada, mas dava para experimentar certo frisson. Olhei o mar, o horizonte,
depois virei-me para as extremidades da praia, acompanhei a extensão de areia,
a cadeia de montanhas que se erguia do lado oposto e o caminho de onde viemos.
Voltei ao guarda-sol e só então me desfiz do top. Espalhei um pouco de protetor
sobre o ventre, sobre os seios, e permaneci deitada, de peitos voltados para o
sol.
Após trinta minutos, achei que as amigas tinham dormido.
Nenhuma delas falara alguma coisa durante aquele espaço de tempo nem abrira os
olhos. Pensei, então, que poderia aparecer alguém. Talvez seguisse o mesmo
caminho que fizemos. Olhei na direção, mas não vi ninguém. Seria engraçado caso
chegasse um homem e desse com nós três de peito de fora.
Veio-me à mente uma lembrança, acho que em Búzios, fazia
alguns anos. Eu decidira tomar sol de seios de fora e aparecera alguém. A princípio
não liguei, mas depois comecei a ficar preocupada. Nesses lugares às vezes os
homens são machistas, acham que podem agarrar, trepar com uma mulher que
encontrem nua, não acham que ela tem seus desejos, suas preferências e que o desconhecido
pode não estar em seus planos, e que mesmo não ficamos nua com o objetivo de
trepar com o primeiro que aparece. Mas não aconteceu nada de mais, apenas
ficamos conversando. Depois de algum tempo, peguei um enorme chapéu que trouxera
para me proteger do sol e com ele cobri os seios. O homem sorriu e nada
comentou, fumou um cigarro comigo e partiu.
“Meninas, vocês vão dormir a manhã inteira?, viemos à praia
para curtir”, falei.
Ambas abriram os olhos e mudaram a posição, Augusta de ventre
para cima, Frida de costas. Reparam que eu também estava sem o top e enrolara
um tanto a calcinha para que a marquinha ficasse mais baixa.
“Será que aparece alguém?”, perguntei.
“Seria, bom, está tão monótono”, disse Frida, mas em tom de
pilhéria.
“Jura?”, eu disse, “você não se sentiria vexada?”
“Eu, não, ninguém me conhece aqui, seria mesmo muito bom.
Reparei que ela não brincava.
Augusta riu, pareceu concordar com Frida. “Se alguém nos vir
nuas vai achar que damos pra qualquer um, vamos ter problemas para nos
safarmos.”
“E quem disse que quero me safar”, continuou Frida, com toda
graça do mundo.
Mergulhamos, caminhamos pela areia, divertimo-nos, fizemos
nossos lanches e bebemos o refresco que trouxemos. Sempre de seios nus.
Às quatro da tarde vestimos nossas roupas e pegamos o
caminho de volta. O sol e a praia nos deixaram cansadas, mas pouco a pouco
subimos e descemos o morro. Do outro lado, descobrimos um quiosque. Antes de
partirmos, decidimos entrar e sentar um pouco. Frida pediu uma cerveja.
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