terça-feira, maio 07, 2019

Ele fez o leme

Eu passava pela porta do prédio dele e via seus olhos a me acompanharem. Quem manda usar saia curta, tudo de fora?, eu me perguntava. Ele acha que estou querendo trepar, só pode ser. Aliás, todos os homens pensam que a gente está morrendo de tesão, que quer trepar, não há outro modo de refletir. Houve um que me pediu pra tirar uma foto, ele o fotógrafo, e eu a fotografada. Nua! Não, por favor, nada de fotos; mas acabei deixando o homem enquadrar meu grelo. Apenas o grelo, viu, ninguém precisa saber que é o meu. Quando vi na tela do computador, que coisa horrível! não sei como você pode admirar isso. Levou meu grelo no telefone, todo satisfeito. Será que contou ao admirador que me olha quando passo em frente ao tal prédio? É muito ruim ser falada, cair na boca dos homens como se fosse uma vagabunda. Disse ao meu fotógrafo não conta pra ninguém, você vai ter tudo que quiser. O homem vibrou. Tudo? Sim, tudo. Ele é calado, e ficou maravilhado com a foto, mais com a foto do que comigo.

Fui à praia no dia seguinte, uma camiseta sobre o biquíni, a bolsa a tiracolo e uma sandália de borracha. Dizem que o acaso não existe, mas encontrei na praia um homem que não via fazia tempos. E o lugar em que o conheci nada tinha a ver com o mar e as areias. Foi uma carona que aceitei há algum tempo. O cara me levou pra casa, melhor dizendo, pra perto de casa. Na pracinha do Alto, estacionou e pediu que eu ficasse um pouco, vamos conversar. Todos os homens têm muitas histórias, mesmo que não sejam bons leitores, mesmo que jamais tenham lido sequer um livro. Contou de suas idas e vindas por aquele caminho, se eu conhecia o fulano, a fulana, o beltrano, a beltrana. A cada nome de mulher eu sentia um arrepio. Mais uma que ele comeu! Quem sabe eu viraria assunto, história para enriquecer sua antologia. Essa bermudinha tua é bonita, ele disse. Olhei pra minha bermuda, uma bermuda preta, bem colante, sem atrativo algum, conclusão, no lugar da bermuda, minhas pernas, era o que ele admirava. É, falei, são boas sim. Ele sorriu. Passei minhas mãos sobre a bermuda, desci ambas até os joelhos. Bem, tenho de ir, sabe, não posso me atrasar, qualquer dia desses a gente se encontra. Lembrei-me então da Adalgisa. Virgem, que nome, mas minha amiga é bonita e tanto, diz que se chama Alda. Certa vez cavalgou sobre o homem, até aí nada de mais. Mas dentro de um automóvel, numa rua escura, ela de sainha sem calcinha. A própria me contou. Disse que sentiu um medo terrível, mas o desejo era maior. Tem de ser de camisinha, viu? O porta-luvas do automóvel estava cheio, pode escolher ele disse. Pode escolher, ele me disse. Pra que fui abrir o porta-luvas? Mania minha de apertar botões. O troço saltou na minha direção. O que eu ia fazer com tanta camisinha, e eu só de bermudinha...

A praia estava boa, calor, aquela quentura que dá no ventre, sei lá, sente-se um arrepio magnífico. O homem que me dera a carona a me olhar. Caramba, faz dois ou três anos, quem sabe quatro. Difícil esquecer essas coisas. Dentro d’água o bronzeador não sai não, é do bom, assegurou. Não tinha o porta-luvas; mas as camisinhas, sim. Como você pode ter camisinha no bolso de uma bermuda, dentro d’água, na Prainha. Bem, dá-se um jeito, nada de cavalgar, acho que nado cachorrinho. Ele fez o leme.

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