Salto na estação General Osório. Os jovens, não mais os vejo, não sei se saíram uma estação antes da minha ou se continuam dentro de outro vagão, mas a imagem do rapaz de conjuntinho me fica na cabeça. Mais tarde contarei o caso a alguns amigos, que rirão, acharão engraçada a minha observação.
Sigo a Visconde de Pirajá em direção à Bulhões de
Carvalho, logo chego ao meu destino. O porteiro aperta o comando, a porta se
abre, entro, cumprimento-o e tomo o elevador.
Já dentro do apartamento, no quinto andar, tiro a calça
comprida e fico apenas de bata curtinha. Chego à janela, afasto um pouquinho a
cortina e olho o prédio de frente, reparo a rua e as pessoas que passam lá
embaixo. Faz sol mas a temperatura é fresca. Sinto ligeiro arrepio.
Sou professora de filosofia numa escola do estado, saí
mais cedo e estou na casa do namorado. Ele deixa a chave comigo. Posso ficar o tempo que desejar, posso mesmo morar, mas prefiro manter meu apartamento em
Botafogo.
Ando pela casa, sento no sofá e como um bombom que trouxe na
bolsa. Cruzo as pernas, recosto-me, relaxo o corpo e fecho os olhos, escuto ao
longe os sons do meio dia. Penso no namorado. Que boa a relação, sem
cobranças, sem problemas, muita leitura, cumplicidade e poucas palavras. Ficarei
algumas horas, aproveitarei para estudar, depois vou descer para comer alguma,
talvez voltar para casa. Não sei se ele virá cedo, também não perguntei nem
perguntaria. Escuto, surpresa, a campainha. Vou olhar. É a diarista do
apartamento do outro lado do corredor. Ela está de biquíni!
Bom dia, desculpa o mau jeito, mas você tem um saco plástico
pra me emprestar?
É negra como eu, mas seu tom de pele é mais escuro, magra e
vistosa, o cabelo para cima, amarrado com um laço. Sorrio. Ela entende.
Você deve estar achando engraçado eu trabalhar de biquíni,
não é isso?
Fiz que sim com a cabeça.
Trabalho sozinha, a patroa deixa a chave na portaria e um
papel com as ordens do dia, quase não vejo ela, daí fico à vontade. Ah, uma
coisa, não fala pro zelador, o cara vive de olho em mim.
Fiz que não com a cabeça. Mal o conheço. Entro e volto com o saco plástico
que ela espera.
Obrigada, essa agora de ser proibido o plástico, não sei
como jogar o lixo, pisca o olho e se vai, reparo o bumbum, o biquíni todo
entrado atrás. Ainda volta-se e diz tem dia que vou à praia depois do serviço,
a gente tem que aproveitar, não é mesmo?, não é sempre que isso acontece.
Despeço-me e, fecho a porta, volto ao estofado, sento-me e recosto. Interessante a felicidade das
pessoas: a nudez, a praia, o zelador a repará-la.
Bonita a tua calcinha! Onde você comprou, ela perguntaria caso eu tivesse afastado mais a porta. Antes de entrar, já em frente ao apartamento onde trabalha, ainda diria tentando não elevar a voz cuidado com o zelador, o homem canta todas as mulheres.