terça-feira, julho 30, 2019

Plásticos

Pego o metrô na estação Largo do Machado e sigo para a Ipanema. Em meio ao burburinho da viagem às onze e trinta da manhã reparo um grupo de jovens de língua inglesa, provavelmente americanos em viagem pelo Brasil. Nosso país é muito conveniente ao turista do hemisfério norte nos meses de julho e agosto. São as grandes férias em seus países, aqui o inverno é quente, pode-se andar de bermuda, frequentar a praia, viver o tempo quente quase como fazem em suas cidades durante o verão. Além disso, o preço em reais é baixo para quem está acostumado a pagar em dólar ou em euro. Os jovens descem em Botafogo, ponto final, descemos todos, quem continuará deve esperar o próximo trem. Fico apreciando os rapazes estrangeiros; um, dentre eles, veste um conjuntinho de bermuda e camisa feitas do mesmo tecido estampado, como usamos quando somos crianças, acho divertida sua roupa, certamente feita pela mãe ou por uma avó desejosas de boas férias de verão ao filho ou ao neto. Os outros vestem roupas comuns de verão, bermudas, camisetas, tênis ou sandálias abertas, mas o tal do conjuntinho é um rapaz divertido, não se preocupa se é extravagante para uma época em que as pessoas são contidas. Chegam próximos à parede onde pende o mapa da região, põem-se a consultá-lo. Uma jovem brasileira aproxima-se e pergunta em inglês se eles querem alguma informação. Um deles diz algo e ela dá as coordenadas. Quando encosta a próxima composição, entramos todos, eles também, seguimos viagem.

Salto na estação General Osório. Os jovens, não mais os vejo, não sei se saíram uma estação antes da minha ou se continuam dentro de outro vagão, mas a imagem do rapaz de conjuntinho me fica na cabeça. Mais tarde contarei o caso a alguns amigos, que rirão, acharão engraçada a minha observação.

Sigo a Visconde de Pirajá em direção à Bulhões de Carvalho, logo chego ao meu destino. O porteiro aperta o comando, a porta se abre, entro, cumprimento-o e tomo o elevador.

Já dentro do apartamento, no quinto andar, tiro a calça comprida e fico apenas de bata curtinha. Chego à janela, afasto um pouquinho a cortina e olho o prédio de frente, reparo a rua e as pessoas que passam lá embaixo. Faz sol mas a temperatura é fresca. Sinto ligeiro arrepio.

Sou professora de filosofia numa escola do estado, saí mais cedo e estou na casa do namorado. Ele deixa a chave comigo. Posso ficar o tempo que desejar, posso mesmo morar, mas prefiro manter meu apartamento em Botafogo.

Ando pela casa, sento no sofá e como um bombom que trouxe na bolsa. Cruzo as pernas, recosto-me, relaxo o corpo e fecho os olhos, escuto ao longe os sons do meio dia. Penso no namorado. Que boa a relação, sem cobranças, sem problemas, muita leitura, cumplicidade e poucas palavras. Ficarei algumas horas, aproveitarei para estudar, depois vou descer para comer alguma, talvez voltar para casa. Não sei se ele virá cedo, também não perguntei nem perguntaria. Escuto, surpresa, a campainha. Vou olhar. É a diarista do apartamento do outro lado do corredor. Ela está de biquíni!

Bom dia, desculpa o mau jeito, mas você tem um saco plástico pra me emprestar?

É negra como eu, mas seu tom de pele é mais escuro, magra e vistosa, o cabelo para cima, amarrado com um laço. Sorrio. Ela entende.

Você deve estar achando engraçado eu trabalhar de biquíni, não é isso?

Fiz que sim com a cabeça.

Trabalho sozinha, a patroa deixa a chave na portaria e um papel com as ordens do dia, quase não vejo ela, daí fico à vontade. Ah, uma coisa, não fala pro zelador, o cara vive de olho em mim.

Fiz que não com a cabeça. Mal o conheço. Entro e volto com o saco plástico que ela espera.

Obrigada, essa agora de ser proibido o plástico, não sei como jogar o lixo, pisca o olho e se vai, reparo o bumbum, o biquíni todo entrado atrás. Ainda volta-se e diz tem dia que vou à praia depois do serviço, a gente tem que aproveitar, não é mesmo?, não é sempre que isso acontece.

Despeço-me e, fecho a porta, volto ao estofado, sento-me e recosto. Interessante a felicidade das pessoas: a nudez, a praia, o zelador a repará-la.

Bonita a tua calcinha! Onde você comprou, ela perguntaria caso eu tivesse afastado mais a porta. Antes de entrar, já em frente ao apartamento onde trabalha, ainda diria tentando não elevar a voz cuidado com o zelador, o homem canta todas as mulheres.

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