É sempre bom ter namorado, alguém com quem a gente possa
compartilhar algum sentimento, alguns gostos, alguns passeios, mas hoje não
está fácil. Há poucos homens, muitas mulheres, e eles gostam das mais jovens.
Eu me esforço para ter o corpo magro, com algumas saliências e volumes, do
jeito que eles gostam. Em M, minha cidade, com seus duzentos e tantos mil
habitantes há uma disputa e tanto entre as mulheres. Basta surgir alguém no
pedaço para disparar uma enorme concorrência. Há aquelas que vestem roupas tão
curta, que vão quase nuas. Como já sou experimentada, espero, deixo as coisas
acontecerem, o que tiver de ser meu não será de outra. De um tempo para cá
descobri uma ação que me deixa a mil, provoca um tremendo frisson. Trata-se de
sair pela manhã vestindo um camisão e o biquíni por baixo. Caminho até a praia
e me ponho a andar pela orla, bem cedinho. Pode parecer um provérbio batido,
mas é verdade que Deus ajuda quem cedo madruga. Tenho amigas que gostam de dormir
até tarde. Dormem tanto, que quando acordam tchau, o homem que esperavam já passou. Outras afirmam que muito cedo não passa ninguém, e não vão ficar a ver navios.
Digo que os navios, e os barcos de todas as espécies, contêm muitos homens.
Elas riem. Uma delas exclamou Deus me livre, sair de casa às seis da manhã!,
vou ser assaltada. Mas o que há de me
roubar? Posso-lhe oferecer o doce predileto. Mal sabe ela o tamanho do pênis do ladrão!
Saio às seis, sim, e vou
caminhando, caminhando e passeando. Chego à praia e corro de uma ponta a outra.
É tão bom estar em forma. No começo dá uma preguicinha, mas depois a gente
pega o embalo. Um dia desses aconteceu o tal frisson, a vontade louca de
namorar alguém, de abraçar, deixar meu corpo atrelado ao corpo de um homem. Assanhada
e sozinha, tive a ideia. Tirei o biquíni e fiquei vestida só de camisão. Não
levo bolsa, apenas um plástico com a identidade e uma nota de dez ou de vinte,
quem sabe compro um biscoito numa padaria, ou tomo um café quando estiver de
volta. Segurei as duas peças enroladinhas nas mãos e encontrei um local para
escondê-las, uma parede de pedra, anteparo da subida para a calçada. Andei de
um lado a outro, apenas o camisão a roçar-me, namoro novo na falta de
homem, eu comigo mesma, bom o tecido de algodão. De modo geral não surge ninguém
na praia àquela hora. Às vezes uma pessoa ao longe, lá na calçada, talvez
empregado de algum dos restaurantes da orla, que vão abrir mais
tarde; às vezes pessoas de idade que vêm andar na calçada por recomendação
médica. Outro dia vi uma mulher da minha idade, quando passou por mim observei
se a conhecia, mas não era de meu círculo de relações, quem sabe uma professora
de educação física, sua roupa revelava a possível profissão. Quanto a homens
com intenções de namorar, nem sombra. Acho que todos estão ainda acordando,
como me disse a amiga, ou partindo para o trabalho. Ao chegar à ponta da praia dei meia volta e comecei a caminhar para o lado oposto, à outra ponta, onde
costumam chamar de Pecado. Quem sabe o nome surgiu por isso, o homem era tão
bonito, um pecado não namorá-lo. Voltei na minha marcha, estava
lisa, animada, sentindo tesão. Sério, é a palavra certa, tesão. Experimentem
caminhar de manhãzinha apenas vestidas de camisão. O roçar das coxas sem o
biquíni ajuda a excitar, a gente acaba molhada, e não é pelo banho de mar.
Apressei-me, corri um pouquinho, o coração acelerou. Será que vou gozar?, que
show, às vezes é tão difícil o orgasmo às mulheres. Quando faltavam duzentos
metros para o ponto onde deixara escondido o biquíni, vi um homem. Pela primeira
vez um homem olhando o mar àquela hora da manhã. Que bom! O que faço?, não
posso ir a ele, ele é que deve vir a mim. Diminuí a marcha, mas não o olhei
diretamente. Ao cruzar com ele fiz de conta que olhava à frente, um ponto bem
distante. Ao chegar ao Pecado fiz meia volta e dei a entender que retornaria.
Reparei, então, que ele desceu um pouco na direção da beira do mar. Estava
vestido de bermuda, camisa de mangas e tênis. Veio de tênis à areia da praia.
Passei por ele mais uma vez, reparei que me olhava. Meu camisão
estampado não deixou revelar o segredo. Que bom, ou que mal? Ao ter o tal
desconhecido por perto, senti certo tremor, a falta da roupa de baixo
provocou-me mais umidade entre as pernas. Se me descobre nua, o que vou dizer?
Ah, mas não é isso que você quer?, encontrar um homem pra dar uma namoradinha.
As coisas estavam mesmo a meu favor. Não voltei a cabeça, caminhei mais um
pouco, como quisesse continuar o exercício. Quando voltei, no entanto, não mais
o vi. Ainda olhei para trás, tentando descobrir se me seguia. Nada. Sumira.
Viera do nada e ao nada voltara. Na segunda vez que atingi o Pecado, parei,
respirei fundo e olhei o mar. Caminhei à beira d’água e molhei os pés. Estava
fria, senti arrepio. Movi as pernas permitindo que as coxas roçassem uma à
outra. Lembrei-me do dia quando voltara de uma festa: deitei nua na cama e
gozei. Ui, outro arrepio. Juntei as mãos à frente, embaixo do umbigo, fiquei a
imaginar o gozo. Foi aí que tive a boa ideia. Olhei um lado, olhei outro, ninguém.
Tirei o camisão e corri para dentro d’água. O mergulho, meu namoro com as águas
do mar, namoro com meu próprio corpo. O que eu poderia querer melhor? Lógico que o homem, mas na falta dele... As
mulheres da cidade não sabem o meu segredo. Quando ia embalada vivendo todo aquele êxtase, o tal homem, esperando-me à beira d'água, numa das mãos o meu camisão!
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