Outro dia estava deitada, eram quatro da tarde, um sábado. Senti vontade de me vestir, com a melhor roupa, olhar-me no espelho, desfilar pela casa. Fui ao guarda-roupas e procurei o tal vestido. Era um de festa. Difícil um vestido chique ser confortável, mas o tal me desmentia, que bom. Tirei toda a roupa, toda mesmo, calcinha e sutiã inclusive, fui ao banheiro, tomei uma ducha, me enxuguei com cuidado e voltei ao quarto. Vesti-o, com todo o cuidado do mundo. Fora feito especialmente para uma festa, acho que da minha sobrinha quando comemorou seus quinze anos. Deixava minhas costas nuas, o decote avantajado insinuava que meus seios escapariam a qualquer movimento temerário. Passaram-se alguns anos, mas cabia direitinho. Devo confessar que peguei um ou dois quilos de lá pra cá, mas isso não afetou o vestido sobre o meu corpo. Olhei-me no espelho, depois fechei a porta do armário e fui andar um pouquinho pela casa. Saí do quarto, dei um passo à direita e entrei na sala. As janelas estavam abertas, o céu claro, o verde de uma árvore entrava pela janela, vozes de mulheres, de crianças, de jovens. Vinham da rua, dos outros apartamentos, da vida social que cada um levava. Eu estava sozinha, eu e meu vestido, minha nudez, o prazer de sentir a fazenda roçar sobre a minha pele. Sentei-me numa poltrona, virada para a janela, a perna direita sobre a esquerda, o pano preto brilhoso, os raios do sol a três passos de mim.
Veio-me à cabeça um namorado de outros tempos. Pedia-me
fotos e mais fotos. Engraçado, “me dê uma foto de você vestida bem bonita”, ele,
reivindicativo. “Pensei que me querias nua”, cheguei a dizer certa vez. Riu, “nua
já te possuo todas as noites”. Engraçada a palavra possuir, não dizia no sentido
de propriedade, mas no de trepar comigo. “Também te possuo, e mais do que você,
porque te guardo dentro de mim”. Continuava a rir, a imagem solar, “esta é boa”.
O namoro como durou.
Levantei-me, cheguei à janela, vi um homem jovem do outro
lado da rua, na janela de outro apartamento, outro prédio, bebia uma taça de
champanha. Levantou-a para mim fazendo-me um brinde. Sorri, levantei também a minha
taça imaginária. Brindamos. Sorriu e bebeu um gole. Imitei-o, bebi também o meu.
Como estava gostoso o champanhe. Dei um adeusinho. Enviou-me um beijo. Escapei
da janela a tempo, queria-me sozinha com meu vestido, o tecido a roçar-me a
pele. Quis deitar-me na cama, no quarto, sentir todo o prazer do mundo. Arrepio,
frisson, languidez. Após meia-hora, levantei-me e fui à cozinha. Fiz café. Bebi,
esbelta, feliz, ainda vestida e nua, toda a beleza do mundo.