quinta-feira, outubro 07, 2010

Não precisam de mais nada.

Vocês querem me pregar uma peça, não? Me fizeram vir até aqui, provar os vestidos, agora não querem devolver o meu. Uma brincadeira... Adoro brincadeiras. Sei que vocês querem saber se o que escrevo é verdade, não é mesmo? Não acreditam nas minhas histórias. Acham que é tudo mentira e que a literatura tem de corresponder à verdade. Pode ser. A maioria não entende o que é literatura. Como vocês são meus admiradores, aceito a brincadeira. Querem que eu saia do apartamento nua e que depois conte o que aconteceu. Desejam que uma provocação gere um conto. Será que vou me sair bem? O final vai-me ser favorável? A questão não é essa. A questão é a seguinte: será que vou contar? Posso me reservar ao direito de não dizer nada. Uma escritora, um escritor, o artista de modo geral têm o direito à privacidade. Nem sempre nos contos falo sobre a minha vida. Existe autor e narrador. São dois seres bastante distintos. Sei que me acham exibida. Toda pessoa importante gosta de se exibir, e até mesmo as que não são importantes. Seria melhor vocês fazerem uma viagem, iniciarem-se em aventuras, depois poderiam escrever sobre isso. Assim é que se começa. O bom escritor é aquele que tira histórias das pequenas coisas. Não são necessários grandes acontecimentos nem enredos fetichistas. Às vezes se sai de casa e se narra uma ida até o armazém da esquina ou até a banca de jornal, lembra-se de alguma coisa, vê-se algum vizinho, volta-se para casa e a história está terminada. O grande motivo pode ser a maneira como a pessoa casualmente encontrada cumprimentou você, ou mesmo o ato de se evitar pisar sobre um inseto durante a caminhada. Vocês querem me deixar nua para ver o que acontece? Ok, aceito. Mas não prometo falar sobre isso. Mesmo que me saia bem. Ou mesmo mal. O programa de computador que vocês criaram faz minha voz se transformar em escrita e aparecer no blog quando estou logada? Interessante. Então, não precisam de mais nada. Eis o conto.

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