quarta-feira, julho 06, 2011
Depois te recompenso
Só se eu contar? Juras que fazes o que estou pedindo? Então, tá. Mas conto rápido, não tenho muito tempo. Ganhei uma lingerie linda. Nunca tinha vestido uma igual. Lingerie para o corpo inteiro, aberta apenas nas costas, como se fosse meia calça emendada à blusa, sobe até o pescoço e termina em mangas três quartos. É preta, transparente, tecido finíssimo trabalhado com alguns detalhes em relevo. “Deve ter sido caríssima”, suspirei ao recebê-la. “Nem tanto, você sempre merece mais”, melodiosa a voz dele. Aonde fui vestida assim? Escuta. Madrugada, um frio! “Não vou aguentar”, falei. O casaco de veludo, lembrei; apenas ele, a lingerie e o sapato meio salto. Fomos a uma festa. Na serra. Festa de inverno, que coisa gostosa. Eu dentro do carro e ele saindo para comprar o que eu queria comer ou beber. Andei, sim, depois que tomei coragem. Como ninguém me conhecia naquele lugar, caminhei pela rua principal. Mas não foi nada demais, o casaco ia até um pouquinho acima dos joelhos. Todas as pessoas me olhavam. Acho que ninguém me desprezaria. Adivinha. Queriam-me sem o casaco, é lógico. Mas ficaram só na vontade, não dei esse prazer. Nua, apenas para o meu amor. Permanecemos em torno de uma hora entre as pessoas do lugarejo, estava quentinho ali, uma fogueira imensa, rojões, acho que alguns em minha homenagem, ou em homenagem a lingerie, não sei bem. Bebi um tantinho a mais, isso é verdade. Fiquei tão alegre. Acho que ainda estou. Mas sempre fui assim, sabes, sou feliz. Então, entramos no carro, descemos algumas ruas, todas desertas, um silêncio, o farfalhar da festa ficando para trás. Foi aí que disse a ele: “preciso fazer xixi.”“Tenho um copo”, mostrou. Mas fico vexada caso faça xixi ao lado de alguém, ele ouvindo o barulhinho. Portanto, saí do carro. “Espera aqui, vou àquela esquina, não saias daí, viu, não venhas atrás de mim que morro de vergonha.” “Mas e a lingerie?”, perguntou. “É mesmo, é inteiriça.” Tirei-a toda, nuinha, apenas o casaco a cobrir-me. Entrei numa rua estreita, achei que ainda estava muito perto dele, dobrei mais outra. Fiz minha necessidade. Mas como volto? Tão escuro, três variantes de pequenas ruas. Eu, perdida! Acho que ele vai pensar que fugi. Não posso voltar à festa e lá tentar alguém para me levar de volta. Vão lembrar que sou a mulher que usava a lingerie. Só que agora estou sem. Minha salvação foi esse orelhão, teu número guardado de memória e a ligação a cobrar. Mas... espera... ah, como sou tonta! Estou quase ao lado do carro dele. Dei tantas voltas e saí no mesmo lugar. Ele está piscando os faróis para mim. Depois conto o desfecho, não vou precisar mais de ti. Pelo menos hoje. O problema agora será outro. Ele vai querer saber para quem estou telefonando. O que vou dizer? Nem imagino. Desculpa-me. Depois te recompenso. Tchau!
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