quinta-feira, abril 11, 2013

Ficou uma coisa tua aqui

Eu estava no apartamento de João, mas achava que não deveria ter aceitado o convite. Sentada no estofado para duas pessoas, eu olhava para ele, que se acomodara numa cadeira junto à mesa. Pilhas de livros se espalhavam em vários pontos da sala, e a mesa não era exceção. Meu rosto revelava a aparência de uma mulher vencida, uma mulher que se deixa levar pelas sensações. Era quase o mesmo que, lá embaixo, na rua principal, ter concordado acompanhar um desconhecido. Lembrei-me do tempo em que era mais jovem: não demorava a aceitar fazer sexo com qualquer rapaz bonito. Mas como já passei dos quarenta, pensei já ter superado a fase dos namoros tentadores. Embora estivesse ali por vontade própria, meu sentimento era de frustração. Fôramos ao cinema duas vezes, a algum bar ou restaurante, depois conversamos muito pelo telefone nas três que se seguiram. Apesar de já sentir uma ponta de paixão por ele, não era minha intenção transar, pelo menos tão cedo.

Quer beber alguma coisa?, perguntou.

Acho que não, já bebemos não faz muito tempo, respondi afoita.

Vou tomar uma cerveja, tenho na geladeira, falou.

Ele foi até a cozinha e voltou com a garrafa e dois copos. Pedi que não colocasse para mim. Encheu um dos copos e tomou um longo gole, olhou na minha direção e sorriu. Continuei séria, ressentida, embora esse sentimento fosse comigo mesma. Acho que se eu não tivesse tomado a iniciativa ele teria permanecido no mesmo lugar, sentado junto à mesa e bebendo sua cerveja durante toda a noite. Tocava uma música instrumental no aparelho de som.

Está gostando de ter vindo?, perguntou.

É, ainda está cedo, o que faríamos depois do restaurante?

Por isso convidei para subir um pouquinho, depois levo você em casa, falou e sorriu.

Acho que sorri também, Não sei o que deu em mim, mas levantei e ultrapassei o biombo que separa o quarto da sala, entrei no quarto e me atirei na cama.

João, venha até aqui, pedi.

Ele primeiro parou à beira da cama, me apreciou deitada numa posição transversal à cabeceira.

Venha me abraçar, falei séria, voltada para ele.

João deitou ao meu lado, me abraçou, mas não demorou a dizer:

Você vai ficar toda amarrotada.

Foi então que tirei o vestido e entreguei nas mãos dele.

Ele saiu do quarto e voltou pouco depois, deitou-se sobre mim e começamos um namoro gostoso. Meu corpo quente me fez esquecer tudo que pensara antes. Entreguei-me a ele. Como fazia tempo que não transava com pessoa alguma, quando comecei a sentir o pênis de João tive um pouco de medo. Cheguei a falar:

Você é muito grande para mim.

Mas ele foi vagaroso e paciente. Pouco a pouco meus gemidos foram vencidos e eu o aconchegava dentro de mim.

Duas horas depois ainda estávamos um sobre o outro, mas cochilávamos.

Quando me dei conta das horas, entrávamos pela madrugada. Lembrei-me de novo do momento inicial, quando estivera sentada no estofado. A sensação de mulher de aluguel voltou-me. Como o momento do ardor sexual já havia passado, comecei a sentir uma ponta de arrependimento. Apesar de tudo ter sido tão bom, achei que as coisas poderiam ter caminhado mais devagar. Do jeito que aconteceu, ele teria pleno domínio sobre mim. Não queria ter cedido com tanta facilidade. Acho que o esforço para a conquista torna a relação mais duradoura.

Sentei na cama, cruzei as pernas e olhei para João. Ele parecia adormecido.

Preciso ir, já está muito tarde, vou chamar um táxi, falei.

Um táxi?, repetiu.

Isso.

Levo você.

Não precisa, chamo um táxi.

Fique até amanhã, falou ainda sonolento.

Levantou-se e sentou ao meu lado. Aproveitou para me abraçar e me dar um beijo no rosto.

Não posso, minhas filhas vão chegar de uma festa.

O que tem isso? Elas já são quase adultas.

Não insista, preciso ir, pegue o meu vestido, por favor.

Ele se levantou e saiu do quarto. Mas voltou de mãos vazias.

Você vai mesmo embora?

Vou. E é melhor eu mesma chamar o táxi.

Calcei a sandália, caminhei até a sala e peguei o celular dentro da bolsa. Liguei para uma cooperativa de táxis. Depois levantei, pendurei a bolsa no ombro e caminhei até a porta. Eu não voltaria, estava decidida.

Ei, espere, Glena, acho que ficou uma coisa tua aqui, falou.

Abri a porta e saí. Não podia ficar ali nem mais um minuto. O que quer que eu deixava para trás seria para sempre.

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