quinta-feira, julho 23, 2015

Todas gostamos

Sentada na poltrona, vestida de calça jeans colante, sandália de meio salto,  espero por ele. Falta alguma peça sobre o meu corpo ou esqueço de escrever sobre a blusa? Falta a blusa, sim. Mas é proposital. Tenho o torso nu, uma das mãos e o antebraço a proteger os seios, jogo inocente e, ao mesmo tempo, sedutor. Gosto da nudez, aliás, todas gostamos. Hoje, quero fazer uma surpresa a ele que não demora. Tudo começou numa dessas madrugadas quentes, depois de uma festa na Gávea. Saímos juntos, ele ofereceu-me uma carona. Insistiu para eu ir à sua casa. Quis me fazer difícil, hoje não, quem sabe amanhã? Amanhã é domingo, retrucou. É um dia como outro qualquer, acrescentei. Acabou concordando. Como combinado, o encontro aconteceu, e foi agradável. Comemos uma pizza e tomamos duas taças de vinho. Aliás, uma pizza fina, porque sou elegante. Depois, rumamos à sua casa Assim começou nosso enlevo. Lembro que naquela noite eu vestia um vestido soltinho, o comprimento acima dos joelhos vez ou outra deixava entrever, como um relâmpago a durar meio segundo, uma lasca das minhas pernas. A partir do tal domingo, o namoro foi crescendo. Para não esfriar, sempre ouso, por isso hoje o caso dos seios nus. Ele vai adorar, tenho certeza, quem sabe enlouquecer. Fecho os olhos, ponho-me a imaginar. Corro à beira da praia após ter saído de uma festa às três e trinta da manhã, um  alvoroço, mulheres a gargalhar, alguns rapazes, de repente junto à parede, uma espécie de falésia que separa a praia do calçadão, avisto uma moça, ela tenta esconder-se, permanecer anônima, está nua, os seios sobretudo à mostra, percebo que se assusta com a turba da qual faço parte, não desejo comprometê-la ante o grupo barulhento que me segue, aponto a borda do mar, conduzo todos à direção oposta, deixo-a intacta a nossos olhares, anônima, como antes de chegarmos. Sinto, porém, uma ponta de inveja, melhor fosse eu a nua, e não ligo se me roubam o véu. Abro lentamente os olhos, o abajur lança reflexos suaves sobre a parede. Quero levantar-me, deixar a poltrona, ir à cozinha buscar um copo com água. Adoro a água bem gelada descendo por minha garganta e percorrendo-me as entranhas, chego a sentir um fio frio, cortante, arrepio. Seguro os seios com uma das mãos e deixo que minhas pernas conduzam-me ao objetivo, um copo fino, de cristal. Volto com a água quase a transbordar, o copo suado, minhas mãos trêmulas de excitação. Tomo o primeiro gole. Sinto o gelo até nos bicos dos seios, quase um espasmo. Vou de gole em gole, torno-me úmida, fria e quente ao mesmo tempo, beiro o paroxismo. Repouso o copo sobre a mesinha lateral, as mãos tilintam o cristal, o prazer... Fecho-me de novo sobre a poltrona, os olhos semicerrados, as pernas cruzadas e uma das mãos a segurar o seio esquerdo. O meu homem há de chegar? Luzes da Visconde de Pirajá, as lojas abrem à noite, pairo sobre o bairro, pouso sobre uma das calçadas, voo noturno em pausa, percebo que vou sem a blusa, os seios com os bicos rijos, será que me espreitam?, pouco a pouco me percebo invisível às pessoas, ligeiras passeantes, não dão pela minha presença, o vento morno acaricia-me a pele lisa, uma vitrine de bolsas, loja aberta que me convida, não há viva alma, entro e toco no couro cru, quero a bolsa, saio da loja, percorro outras vitrinas, a bolsa tão leve... serei ladra nua?, ouço um apito, não descubro de onde vem, será a polícia?, as pessoas correm sobre o passeio, um carro freia, já não há a placidez dos primeiros momentos, alguém me esbarra o torso, toca-me a história da moça que atravessou nua a principal avenida de sua cidade, prometeram-lhe dois mil reais pelo desfile, por que a lembrança?, nada ganho e vou tão nua quanto ela. Ah, o arrepio, a poltrona, os seios soltos, cubro-os com as mãos mínimas, como se ainda estivesse na rua; os bicos ainda rijos apontam ao namorado que não chega. Tenho o número dele. Suspiro. Quem sabe ligo? Meu sonho a tornar-se neblina e a ameaça do sol vindouro. Perco-o como uma criança perde o brinquedo impossível, como a moça perde a inocência. Quando era mais nova eu estudava tanto... O sonho, os olhos fechados, um assovio. Quem a chamar? O vizinho de frente? Eu sempre a frequentar seus sonhos. Mas não sou a mulher que lhe proporciona ereções múltiplas. Apesar de minha a face, de meu o corpo, a criação é sua. Descruzo as pernas, levanto-me preguiçosa, são seis passos até a porta da rua, a madeira de três centímetros a separar-me do mundo, a impedir que me descubram nua. Abro a porta e sinto o cheiro do mar, a praia a duzentos metros, os saltos da minha sandália a enfiarem-se na areia, o bico dos meus seios a apontar o navio fundeado em alto mar. Toda mulher deseja uma armada, deseja que a noite dure, deseja que o vento lhe seja morno, deseja que o gozo lhe vá mais à frente...

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