terça-feira, dezembro 08, 2015

Chá e biscoitos

“Você não comeu nada”, disse Ana, ofendida, ao reparar os biscoitos intactos.

“É que estou surpresa”, repliquei.

“Surpresa?”

“Sim”, falei ainda olhando a foto. “Se ele mostra a alguém?”

“E o que os outros têm a ver comigo?”, respondeu sorridente, apanhando um dos biscoitos e mordiscando.

“Não sei, mas poderia causar algum prejuízo a você.”

“Nada disso, não preciso de ninguém, tenho meu próprio negócio e isso jamais me prejudicaria.”

Devolvi-lhe a foto. Ela a pousou sobre a mesa, ao lado do pratinho de biscoitos. Pegou sua xícara e tomou um pouco do chá.

Imaginei a situação em relação a mim. Jamais teria coragem de me deixar fotografar naquela pose. Ana estava de pé, na foto, num gramado, ao lado do tronco de uma pequena árvore. Vestia apenas o top, as mãos cruzadas abaixo do umbigo cobriam seu sexo. Andei durante muito tempo à procura de um namorado, não acho que com aquela atitude facilitaria as coisas. Minha amiga, no entanto, era espevitada. Tudo para ela era motivo de alegria.

“E como estão vocês agora?”, eu quis saber.

“Estamos ótimos.”

“Tomara que vocês nunca briguem.”

“E se brigarmos, o que tem?”, ela me olhou com o rosto desafiador.

“Ele pode chantagear você.”

“Bobagem”, acrescentou tranquila, “hoje as mulheres estão cansadas de andar nuas por aí.”

Suspirei e fiquei quieta no meu canto. Segurei a xícara e bebi um gole de chá, comi um dos biscoitos.

“Não quer ir com a gente, no Carnaval?”, sugeriu com ar de expectativa.

“Aonde?”

“Angra dos Reis.”

“Só se você deixar ele tirar uma foto minha, assim como essa que você mostrou?”, falei com ar de pilhéria.

“Jura?, ela arregalou os olhos. “Deixo, caso você permita que posemos junto.”

“Brincadeira, Ana, e quanto ao meu trabalho? Se o juiz me vir nua é capaz de me transferir.”

“Mas aposto que antes ele te convida para um hotel.”

“Você acha mesmo, Ana? Ele é tão bonito.”

“Claro que sim. Se eu fosse você, não perderia tempo. E o que é que tem trabalhar em outra seção?”

“Vou com vocês. Mas no pictures”, acrescentei.

“Ok.” Seus olhos grandes sempre me contagiavam. Senti uma coceirinha. Eu acabaria também tirando a roupa? Ela comeu mais um biscoito.

“Tem mais uma coisa, Ana, vou sair esta noite com o namorado que fez a foto”, ela disse.

“O que tem de mais nisso?”, olhei enquanto segurava a xícara.

“É que vou nua.”

“Nua?”, assustei-me.

“Nua, pelada, sem roupa alguma.”

“Mas, Ana, logo você uma mulher tão elegante...”

“É que ele afirmou um dia desses que poucas são as mulheres bonitas quando se mostram nuas por inteiro, e eu sou uma delas”, interrompeu.

“Você já não sabia disso?”

“Claro, mas nas palavras dele é outra coisa.”

“E como você vai fazer?”

“Surpresa!”, sorriu.

“E se alguém encontra você, Ana?”

Não encontra, não, Vera, e a cidade é pequena; as estradas, escuras. Quem sabe como um cachorro quente na Serra?, sorriu de novo após a sugestão.

“Você é louca.”

“Nada disso, prefiro que você diga que eu sei aproveitar a vida.”

“Talvez, mas eu não aceitaria sair nua por aí. Ele sabe ou é surpresa?”

“Sabe, foi ele quem pediu”.

“Cuidado, Ana. Se ele te larga pelada por aí?”

“Se isso acontecer, é ele quem sai perdendo”, ela deu uma imensa gargalhada e comeu o último biscoito.

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