terça-feira, julho 26, 2016

E já houve quem me roubasse outras coisas

Não sei por que cargas d’água reapareceu-me um ex-namorado lá dos anos 1990, e já deitava eu na cama com ele. Pelas tantas da madrugada, foi ele quem começou a conversa.

Já consegues dormir nua?

Se não me engano, desde sempre, retorqui.

Quando vivemos juntos eras muito pudica, dizias não conseguir pegar no sono caso estivesses sem roupa, sobretudo as roupas de baixo.

Acho que agora sou outra pessoa.

Da cama era possível ver através da janela ampla e aberta os prédios do outro lado da rua. A maioria não tinha sequer uma luz acesa. Caso alguém nos olhasse de lá, veria apenas a janela escura. Apesar de verão, um ar brando penetrava o ambiente e nos refrescava.

Se te comportasses assim naquele tempo, acho que ainda estaríamos juntos, disse ele.

Assim, como?

Deitar a dormir nua, assim como fazes hoje.

De lá pra cá, passaram-se muitos verões, e com eles muito se aprende.

E o que mais aprendeste?

Muitas coisas. Mas se queres saber mesmo de roupas, eis. Não se pode ter muitos namorados e querer mantê-las sobre o corpo, há sempre um que no-las rouba.

Roubaram a roupa de ti?

Isso. Levam as de baixo como troféu, ou como lembrança, lá sei.

E o que de melhor também aprendeste a fazer?, estava ele curioso.

Alguns tapam-me o nariz e a boca na hora do gozo, não me querem a respirar.

Aprendeste mergulho sem respirador?

Sempre fui boa de fôlego. Brincam com a possibilidade de matar a mulher, querem o fio da navalha, ou mesmo o do equilibrista.

Sério?

Mais do que sério.

E como te saíste?

Aprendi a gozar mais, tanto maior a falta do ar.

Ah, isso sei eu, queres sempre cavalgar no gozo, se possível toda a noite.

Sentou-se na cama e tomou um gole d’água do copo que ficava à cabeceira.

Ainda tens o costume de beber água à noite? Logo, não mudaste tanto.

Não, sou o mesmo.

Então, sei que estás a remoer-te de curiosidade. Conto mais. Os homens não querem só trepar, desejam a fantasia. E já houve quem me roubasse outras coisas.

O que trazias a mais?

Um cordão, algum dinheiro, um maço de cigarrilhas. O dinheiro e o ouro acho que queria para comprar alguma droga, ou pagar uma dívida, quem sabe.

E te meteste com gente assim?

Como saber? O homem é bonito, dá a bisca numa boate, paga um jantar, depois quer o cordão. E entenda uma coisa dessas.

Deste parte à polícia?

Nada quero com polícias, nem com porteiros de hotel.

Repousou o copo na mesinha, aproximou-se e tocou-me o cabelo.

E o que há de mais?, ardia o homem.

Houve um que me deixou apenas a sandália e a bolsa. Partiu antes de mim, e não estava eu onde moro, mas num quarto de hotel.

E o que fizeste?

Liguei à recepção e pedi um mensageiro.

E eles?

Mandaram o rapaz. Dei-lhe dinheiro e disse, vai a uma loja de esportes e compra a camisa do Porto. Mas do Porto?, rebateu, ainda era um garoto, aqui todos torcem pelo Benfica.

Não importa. Encontra uma do Porto.

Ele foi e voltou com a camisa. Dei o que prometi: aliás, entendes-me, dei duas coisas, entre elas uma boa gorjeta. Deixei o boy eufórico. Vesti-me e parti. A bolsa no ombro, a sandália nos pés e apenas camisa do Porto.

Fizeste maior sucesso, então?

Na terra de benfiquistas, ser Porto é gozar com o olhar galanteador de todos os homens.

Tornaste esperta. Acho que vou me apaixonar novamente por ti.

Não faças isso. Já estou na paixão de todos os homens. Do Porto e de Lisboa!

terça-feira, julho 19, 2016

Cortei um dobrado para convencê-lo que eu precisava vestir pelo menos um camisão

Outro dia encontrei um ex-namorado, fazia dez anos que não o via. Muito tempo, não? Nem sei como o reconheci. Aliás, no caso, sei sim. Não pude deixar de dizer, após algum tempo de conversa:

Você era fogo, viu.

Ele me encarou sorridente e retrucou:

Ainda sou.

Eu vestia um camisão, por baixo o top e calça legging. Ele olhou minha roupa com certa inveja.

Sabe, outro dia deixei uma namorada só de blusa, ele disse.

Imagino. E como ela fez?, perguntei fingindo falso interesse.

Ah, as mulheres sempre dão um jeito, dissimulou.


Ele era fogo mesmo. Como poderia esquecer? Viajei à cidade dele, o homem fez uma festa. Como gostou de me ter nos seus braços. E me queria nua o tempo todo.

Trouxe um livro, você permita que eu o leia um pouquinho?, perguntei.

Permito, mais sente nua ali no sofá, cruze as pernas e leia o livro.

Vou fazer um café para nós, falei à tardinha.

Ótimo, mas vai à cozinha assim como você está, nuinha.

Passei o dia e a noite sem vestir roupa alguma. Ainda bem que na cidade dele fazia calor.

À noite, convidou-me para passear. Quando abri a mala para escolher um vestido levinho, ou uma saia curta, ele contrapôs:

Nada disso, você vai nua.

Jura?, ainda perguntei.

Vai sim, aqui não tem problema.

Amor, não vai ficar bem eu sair nua por aí.

Cortei um dobrado para convencê-lo que eu precisava vestir pelo menos um camisão.

Apenas, ele definiu com esta pequena palavra.


Entramos no café e continuamos a lembrar o passado.

Que bom que nos reencontramos, afirmou, o que você veio fazer na minha cidade?

Ah, estou de férias, e faz tanto tempo que não venho.

Desde quando estivemos juntos?

Não, vim duas vezes. Agora aqui mudou muito, está melhor, inauguraram dois ou três museus, vim visitar.

Quer dizer que você gosta de museus, ele suspirou.

Adoro, estudei produção cultural, não sei se cheguei a falar, museus são a minha especialidade.

Acabamos de tomar o café, cruzei uma das pernas, o camisão revelou uma parte de minhas coxas. Embora coberta pela calça, exibia o volume das minhas coxas. Um desconhecido, à mesa ao lado, sorriu farsesco.

Você não quer passear? Vamos aproveitar. Tem algum compromisso?, ele olhou pra mim com certa ânsia.

Pra falar a verdade, tenho, marquei com uma amiga.

Chama a amiga para passear conosco.

Jura?

Juro.

Chamo. Mas você vai querer apenas uma ou duas mulheres nuas no seu carro?

Ele riu. Lembrou minha viagem de outrora ao Rio. Num momento do passeio roubou meu camisão. Tive de voltar nua pra casa dele.

Saímos do café e fomos ao estacionamento.

Você me leva ao hotel primeiro?, pedi.

Levo, e espero por você.

Se quiser pode subir, dei a moeda a ele. Meu olhar devia estar brilhante, podia refletir todo um céu. Ele é tão bonito, foi minha vez de suspirar.

Na suíte, nua nos braços do homem, ele perguntou:

E sua amiga?

Ah, ela espera.

quarta-feira, julho 13, 2016

Tive de escondê-lo

Um pinto faiscou um segundo em meus olhos, e me transformou toda em arrepio. Foi na praia, mês que antecedia o verão, o tempo ainda fresco e as águas do mar geladas de dar dó. O pinto, naquele momento, era supremo. É tudo o que posso afirmar. E veio a preencher a solidão que eu sentia em meio a guarda-sóis afastados, caminhantes longínquos e mulheres que tomavam sol. Como vou falar do pinto sem ser chula? Vejamos, uma história primeiro. Certa vez tive um namorado dez anos mais jovem que eu, mas era homem maduro. Nem sei porque terminamos, coisa do destino, talvez. Levava-me a passear, trazia-me à praia. Vivíamos o embate de dois polos antagônicos: a noite profunda e o dia com toda a sua luz. Foi numa noite profunda. Íamos de automóvel, ele a dirigir, e eu relaxada no banco do carona. Então, a surpresa invadiu-me os olhos, uma mulher de calcinha, na rua, gritei e me virei a ele. Mulher?, repetiu, nada disso, parece mulher mas não é, sentenciou. Foi numa parte suspeita do centro da cidade. E continuamos mergulhados na noite, queríamos ainda a madrugada. Os homens não sofrem de celulite, afirmei, caso se tornem mulheres, ou fingem sê-las, não sei bem, suas pernas são lisas de dar inveja. Sério?, pareceu duvidar. Sério, falei com convicção. Como você sabe, já viu um exemplo desses de perto?, suas palavras e seu olhar incisivo enquanto segurava o volante pareceram desafiar-me. Sim, afirmei, como se não quisesse revelar um grande segredo. Onde aconteceu?, quis ele saber, esperou, a respiração um tanto opressa, como se minha resposta fosse transformar tudo que nos viria pela frente. Num desfile de modas, acrescentei  Ah, bom, ele replicou aliviado. Mas a historinha não foi bem assim. Certa vez viajamos, quatro mulheres. Que bagunça, não é mesmo? Fomos a um hotel, desses que dão para a praia, no Nordeste. Lá, aproximou-se de nós alguém que pensamos a princípio ser uma mulher. Fazia bem o papel, demoramos a descobrir o que realmente era. Quando de fato aconteceu, não fizemos alarde, agimos com a maior discrição. Na noite anterior ao dia em que regressaríamos, saímos as quatro e mais a fingida mulher. Bebemos mais do que podíamos. No hotel, um fio de tesão começou a correr em cada uma de nós, em consequência inventamos uma brincadeira; saíamos nuas do quarto para bater no quarto das outras, já que ficamos hospedadas em duplas. Após muitas risadas, decidimos ir ao quarto de nossa amiga / amigo. Ela assustou-se com o mulheril. Dissemos faça como nós, vamos desfilar. Ela, ou ele, não sei como dizer, enrubesceu. Mas uma das mulheres conseguiu despi-la. Pudemos ver, então, um pênis mediano. Algumas começaram a agarrá-lo e ele começou a crescer. Ela disse não sinto tesão por mulher, mas quem sabe vocês possam me dar prazer e, ao mesmo tempo, obter a diversão que desejam. Cada uma de nós a exercitou um pouco, mas o pênis não enrijecia como desejávamos. Há um jeito de eu sentir tesão, ela falou, mas vocês precisam me dar de presente suas calcinhas. Calcinhas?, mas viemos nuas. Não faz mal, rebateu, busquem-nas, era culta a mulher. Lorena voltou aos nossos quartos e pegou tantas calcinhas quantas conseguiu carregar. Trepamos então com a travesti durante boa parte da noite, seu pênis endureceu tanto como o de um verdadeiro macho. Jamais consegui entender a relação entre nossas calcinhas e ereção. Como esse tipo de gênero não ejacula com facilidade, pudemos aproveitar bastante. Só que, no final, ela não devolveu nossas pequeninas peças, considerou-as como pagamento. Levamos, porém, tudo na esportiva, e rimos muito no avião de volta.

Um pinto faiscou em meus olhos e me transformou toda em arrepio. Alguém sorriu pra mim. Não estava nu, ou nua, não sei bem explicar. Na verdade, era eu a nua, e não queria deixar a coisa entre sorrisos. Gostei do arrepio, que já não me abandonava. Daqui em diante, vai depender do pinto, disse a mim mesma. Como o da amiga / amigo lá das férias no hotel. Com alguma lábia e com o tempero do gozo, mantém-me a mil e, quem sabe, leva-me também a calcinha!, completei. Se sabemos conduzir, as coisas acontecem como a gente deseja. Entramos na água. Quem sabe a fantasia não era um meio de conquistar as mulheres. Como já conhecia o truque, vesti-o com o meu biquíni. Lindo o biquíni, afirmou solene. Seu pinto logo virou frangote e pulou porta afora. Tive, então, de escondê-lo. Que se tornasse enorme galo, mas que cantasse dentro de mim.

terça-feira, julho 05, 2016

Simpatia

“Como é que é?”, perguntou Lana, muito surpresa, enquanto Janete lhe trazia uma xícara de chá.

“Você não entendeu?, é uma maneira de surpreender os homens, eles ficam curiosíssimos, e acabam querendo nos namorar.

Lana segurou a xícara, suas mãos chegaram a tremer. Ambas estavam sentadas à mesa, frente a frente, costumavam visitar-se mutuamente para tomar chá, e nesta quinta, a vez de receber era de Janete.

“Janete, você não tem medo de que pode acontecer o pior?”

“Pior?, não se trata de uma coisa que envolva vida ou morte, é apenas uma brincadeira.”

Após tomar um gole do chá e repousar a xícara sobe o pires, Lana continuou:

“Brincadeira?, mas pode sair caro, e tanto mais nesta cidade onde quase todos se conhecem e falam demais. Seria melhor você arranjar namorado pelas vias normais.”

“Vias normais?”, pestanejou Janete.

“Já que você costuma ir à praia, por que você não deixa que eles se aproximem, que paquerem você como todos os homens costumam fazer?”

“Mas assim não posso escolher?”

“Ah, você quer o filé mignon.”

“Adivinhou, Lana, nada desses bugres que ficam à espreita. Entro n’água, escolho o mais bonito e ponho meu plano em ação.”

“Esse negócio de deixar o biquíni nas mãos de um desconhecido me deixa trêmula, e estou apenas imaginando. Você sabe que quando eu morei na serra, tive um caso com um jovem de lá. A gente namorava no escuro da estrada, dentro e fora do carro, na madrugada. Estava tudo bem até que o sujeitinho resolveu roubar minha calcinha. Fiquei furiosa, nem falei mais com ele. Agora, você com essa ideia, o biquíni nas mãos de um desconhecido. Fala sério, Janete, isso não pode ser verdade.”

“Claro que é, por que eu iria mentir pra você?”

“Me conta como você faz, vai. Ainda não entendi essa história direito.”

“Falei sim, você é que não prestou atenção. Mas, tudo bem, conto de novo. É assim: você chega à praia, com aquele charme todo, vestindo um biquíni mínimo. Dá uma olhada em volta, mas tudo muito bem dissimulado. Arma o guarda-sol, abre a cadeira e senta um pouco. É bom estar de óculos escuros. Então você continua olhando, reparando os homens, os rapazes, vendo se há alguém que vale a pena. Caso isso aconteça, você fica atenta se ele paquera você. Se ele não tiver reparado, espere um pouco, até ver o homem mergulhando. Quando isso acontecer, você vai atrás. Mas não precisa grudar nele. Espere um pouco até a hora de atacar.”

“Atacar, como assim?”

“Aí, entra a história do biquíni. Você tira, transforma em uma bolinha de pano, aproxima-se do cara e pergunta: ‘você pode me fazer um favorzinho?’ Lógico que ele vai dizer que sim. ‘Segura isso pra mim um instante?’ Você entrega o biquíni a ele e mergulha, volta alguns segundos depois e pede de volta, veste e sorri para o homem. É lógico que quando você der a ele a bolinha e pano, ele não vai imaginar que é o seu biquíni. Esse é o enigma. E se você não demorar a voltar, ele não vai descobrir, porque não terá tempo pra pensar. Só depois que você estiver fazendo o movimento pra vestir a calcinha é que, talvez, ele repare."

“E depois, o que isso vai resultar?”

“Lana, dá um resultado ótimo. O homem vai sorrir, e você vai dizer: é uma simpatia, sabe, ajuda a desencalhar’. Ele vai se interessar, e está no papo. Consegue-se namorar, pelo menos para o dia, o homem mais bonito da praia. Mas é lógico que tudo tem de ser feito com a maior discrição.”

“Janete, você é louca. E amanhã, quando você for à praia de novo? Os homens não vão estar todos sabendo dessa história?”

“Nada disso, é só não vulgarizar, e não escolher os caras daqui, você os conhece, não? Como aquele que roubou tua calcinha.”

“Janete, sabe do que eu gosto mesmo? Gosto de uma trepada bem dada, bem funda, que arranca suspiros e faz a gente gozar pra valer.”

“Eu também gosto. Mas você precisa sentir a sensação que desperta na gente quando o biquíni está nas mãos do desconhecido e a gente não sabe o que vai acontecer. Vale muito, só não vale essa trepada funda. Mas quem sabe mais tarde, a agente tem o cara para a tal trepada. A Lúcia transava na praia mesmo.”

“A Lúcia?, do Osório?”

“Ela.”

“Janete, já sei, virou moda, todas as mulheres que você conhece estão praticando o que você contou. Apenas eu estou sendo ingênua.”

“Não, todas não, apenas eu e a Lúcia, agora você, contar pra mais gente vai dar problema.”

A dona da casa sorriu e bebeu o último gole de chá.