Uma amiga disse um dia desses: aqui, em M, é difícil
arranjar um homem, e quando a gente consegue, ele quer mandar na gente, repare,
faz alguns meses arranjei alguém, comecei a conversar, dias depois foi lá em
casa, ficamos juntos, acabou rolando alguma coisa, descobri sobre a vida dele,
embora não me interessasse; só não quero confusão, ok?, falei, você pode vir aqui
vez ou outra, ficar comigo; não demorou o homem queria saber aonde eu ia, que
horas eu saía, que roupa eu vestia; assim não dá, transbordei, você tem a vida
toda enrolada, fica comigo duas horas por semana, nem sei o que faz por aí, e
quer se meter na minha vida?, acabei por terminar; seria bom arranjar macho
apenas pra trepar, nada de gente no meu pé; mas eles desenvolvem um sentimento
pernicioso de posse. E essa minha amiga faz a vontade de todos os namorados,
realiza a fantasia de cada um deles. Até já saiu nua no banco do carona. Olha
que pérola o tal perdeu.
Voltando à praia, meia hora depois chegou um homem, que já
conheço e vive de olho em mim, queria conversar. Mas sei da mulher dele, não
quero confusão. Diz que moram juntos, porém não têm mais relação sexual. Não
acredito em histórias da carochinha. Ele se pôs a falar sobre um amigo que
viajou aos Estados Unidos, o que o amigo fez, por onde passeou, a namorada que
arranjou, contou que a mulher nem deixava o homem falar, era só a vontade dela,
e ele aceitou. Virei-me de frente (estava de costas, sobre a canga), disse que queria beber um refrigerante. Correu para comprá-lo. Essa é uma
coisa boa entre os homens, pagam na esperança de me ter na cama.
Voltou depois de alguns minutos, trouxe um guaraná para mim
e um copo de caipirinha para ele. Quero a caipirinha, cheguei a falar. Você
gosta?, ofereceu. Bebi um gole, ele ficou com o guaraná. Seus olhos, de modo
disfarçado, procuravam minhas coxas. Não há nada de mais transar com ele, mas sempre
alguém acaba sabendo e as fofocas circulam rapidamente na cidade. Ainda ficou
perto de mim durante vinte minutos; pediu licença, disse que tinha de ir,
prometeu telefonar qualquer hora dessas, vamos a um restaurante, comer e beber
do melhor, sugeriu.
Outras pessoas já se aglomeravam na faixa de areia e a praia
já não tinha o charme de que gosto, vazia, inteirinha pra mim. Mas o que há de
se fazer? Em torno de onze e meia apareceu um jovem que eu jamais vira na
região. Pediu-me um cigarro. Mas você, de uma aparência tão rica, pedindo
cigarro a uma mulher, falei e ri. Disse que não conseguia comprar cigarros em
lugar algum, que já andara a praia toda. Apontei a ele a barraca, na ponta,
perto do entroncamento com Cavaleiros, onde se vendia cigarros, e não só desses que você está me
pedindo. O homem sorriu. Vou até lá. Queria que ficasse, arrependi-me da
sugestão dada, o homem partiria, quem sabe seria uma boa conversa, ou mesmo
algo a mais. Não demorou, voltava ele, com uma carteira de cigarros inteirinha
pra mim, a marca que fumo. Não, por favor, cheguei a dizer, mas ele não me
deixou recusar. Sentou, então, ao meu lado.
Não sei por que estou sempre a me lembrar de minhas amigas
atuais e das que já se mudaram e que não vejo faz tempo. Veio-me à cabeça a
Deia. Diz que é perigoso falar com desconhecidos. Pode até conversar, mas não
sai com eles logo. Engraçado, ela ainda me contou que adora tirar o biquíni
quando entra n’água. Procura um lugar pouco frequentado, despe-se e faz a
calcinha de pulseira, diz que sente enorme tesão nisso. Sei lá, cada maluca com
sua mania. Acho muito melhor ter um homem pra me abraçar, pra tirar o meu
biquíni. Não dentro d’água, é claro, mas numa boa cama. É bom criar
expectativa, provocar arrepio, fazer o homem sonhar que tem a gente nua nos
seus braços, um incentivo para a conquista. E o que eles fazem pra conseguir
nos comer! Não posso pensar muito nisso, chego a ficar molhada.
O homem jovem disse o mar aqui é muito bonito, é a primeira
vez que venho. Não quis interrompê-lo, nem nada falar sobre mim, deixei-o
divagar sobre a natureza. Depois de ficar alguns segundos em silêncio,
levantei-me e fiz menção de que daria um mergulho. Estava calor, precisava me
molhar. Foi atrás de mim. Entramos n’água, molhei a cabeça, depois mergulhei e
nadei vinte ou trinta metros, distante da beira d’água. Ele me acompanhou,
ficamos flutuando e sorrindo um ao outro. O que se pode pensar em tal situação?
É lógico que não iria agarrá-lo, nem pedir que me abraçasse. Caso ele viesse,
será que eu permitiria? O tesão é grande, mas a vulgaridade nos rebaixa. Não me
tocou. A temperatura baixa da água nos atiçava. Nadamos mais um pouco, ouvimos
o suave marulhar, o vento a perder-se sobre nossas cabeças, a sensibilidade do
corpo ao mar. Senti vontade de lamber os braços, fazia isso quando criança, o
gosto de sal me incentivava. Mas só foram pensamentos. Pouco a pouco fomos
voltando à beira, enfiei mais uma vez a cabeça dentro d’água, a água a
me escorrer os cabelos. Voltamos ao ponto de partida, à canga onde eu me
sentei.
Certa vez disse eu a Wanda, vou pagar pra um homem me comer,
não é possível viver assim. Ela riu, não acreditou. Quando foi embora (estávamos na minha casa e tomávamos um chá), comecei a procurar se havia
sites de prostitutos. Há muitos deles, mas não aqui na cidade. Todos são no
Rio, ou em São Paulo. Transar com um prostituto deve ser bom, porque trepo,
gozo, pago e o homem vai embora, não se mete na minha vida. Se morasse na
capital, faria isso, ninguém no meu pé.
Quanto tempo você vai ficar aqui em M?, perguntei, ele sentando
diretamente na areia, ao meu lado. Vou pra arraial à tarde, falou. Arraial?,
perguntei. Lá é ótimo, não quer ir também?, sugeriu. É, até que seria bom,
sussurrei; você bebe algo?, elevei a voz. Ele levantou e foi até o quiosque
comprar duas caipirinhas. A minha pede de vodca, por favor, soprei na direção,
minhas palavras levadas pelo vento.
Todos sabem o efeito das bebidas alcoólicas. Embora não seja
muito de beber, na praia acabo cometendo alguma extravagância. A bebida me
deixa solta, falo coisas que não falaria num estado de total sobriedade. Minhas
amigas não bebem, muitas dizem que o álcool faz mal à saúde. Também acho, mas
uma bebida vez ou outra não vai matar. O limão com aquela ponta de vodca, o sol
e o mar me provocam mais que arrepios. Não posso nem me mexer muito, para não
dar na pinta. Meu amigo voltou com os dois copos, segurei o meu e experimentei
o primeiro gole. Ele não era de falar muito, um cara de espírito contemplativo,
refleti. Falei sobre a cidade, onde ele estava pela primeira vez, o que havia
para fazer, tanto durante o dia como à noite, as praias, os pontos
turísticos e alguns problemas locais, sobre estes falei pouco, não queria
estragar a beleza do dia. Conheço uma porção de gente aqui, M tem duzentos e
pouco mil habitantes, mas quem nasceu aqui ou mora na cidade há muito tempo
conhece muita gente, às vezes é impossível ficar sozinha, sempre aparece alguém
conhecido, e não se tem privacidade. Eu falava e falava. Parei para acender um
cigarro. Perguntou se podia acender seu cigarro, mas não era um cigarro comum,
comprei no mesmo lugar do maço de cigarros que trouxe para você, explicou.
Lógico, pode acender, sim, e deixa eu dar uns tragos. Fumamos os dois, eu
alternava uma tragada do meu cigarro outra no dele. Divertimo-nos no
troca-troca, ele também fumou do meu cigarro.
Bebemos, pouco a pouco, as caipirinhas. É lógico que me
tornei ainda mais excitada; ele, apesar de sua beatitude original, tornou-se
também. Soube que vinha de um subúrbio do Rio, mudara-se para Niterói e se
formara na universidade local. Não falou sua especialidade, também não
perguntei. Disse que tinha um jipe, mas antigo, apontou na direção da orla,
mostrando onde o deixara ao chegar pela manhã.
Após uma hora ou pouco mais, entramos n’água mais uma vez. A
temperatura baixa das águas do mar provocava arrepios, mas refrescava o calor
do sol das treze horas. Mergulhei e nadei durante alguns minutos. Meus cabelos
compridos molhados escorriam às minhas costas, não sei por que senti naquele
momento uma imensa alegria, talvez fosse o resultado de vários fatores, como o
dia bonito, o homem jovem e sonhador a minha frente, a caipirinha e tudo que
poderia vir pela frente. Ele aproximou-se de mim, esticou os braços e me
enlaçou, mantendo suas mãos cruzadas atrás das minhas costas. Aproximei-me do
seu tórax e o abracei. Ficamos ali, durante um tempo que, no momento parecia
extenso; lembrando, porém, tempos depois, parecia passado num piscar de olhos.
Quando saímos d’água, estava convencida que iria com ele a
Arraial. Deitamos ainda sob o sol durante um longo tempo. Aproveitei para
escutar o som da natureza. O marulhar das ondas era o mais presente, depois
vinha o vento, sempre contínuo, incansável, ruídos da presença humana, como a
voz de alguém ao longe, ou o marchar do motor de algum carro mais barulhento
que passava na pequena rua junto à orla marítima. Quando íamos lá pelas duas
horas senti um pouco de fome. Em situações normais, eu voltaria para casa, mas
com meu novo amigo deitado ao meu lado, de olhos bem fechados, como se
visitasse outros planos naquele momento não tive coragem de partir. Poderia
mesmo me levantar e me retirar, silenciosa, ele não notaria. Desci sozinha à
beira e entrei no mar novamente. Havia mais pessoas naquele momento, mas a
distância entre elas e eu era grande. Aproveitei para me refrescar bastante. Apesar da meia estação, o calor estava forte. O banho de mar me excitou ainda
mais, senti uma vontade incrível de trepar. Enfiei a mão por dentro do biquíni
para procurar meu clitóris, mas o biquíni era curto e tão apertado que resolvi
baixá-lo até os joelhos. A água do mar a invadir de forma mais direta o local
que momentos antes era coberto pelo tecido aumentou-me o desejo. Toquei, enfim,
o clitóris, pressionei-o, friccionei-o. Quem sabe, chegando ao orgasmo perderia
o desejo de acompanhar o homem a Arraial. Quando avançava na masturbação, a
ponto de sentir meu coração se agitar, percebi alguém atrás de mim. Era meu
amigo. Você mergulhou sem me chamar, disse. Ele pareceu não notar que eu me
masturbava. Disfarcei. Você parecia dormir profundamente, respondi. Dormia
mesmo, mas a tua falta me despertou. Ele veio me abraçar; eu, com o biquíni
acima dos joelhos!
O jipe dele era bonito, tinha alguns adesivos. E ventava
terrivelmente. Olha, alertei, você está me levando para Arraial, mas repare
bem, estou nua, não tenho, nada a vestir além do biquíni e dessa canga
semitransparente, é preciso que me traga de volta, está bem? Claro que trago
você, ele disse, quando quiser basta pedir, arraial é a quarenta e cinco
minutos de M.
Quando chegamos, estava morrendo de fome. Almoçamos numa
cabana rústica, junto à praia. Não sei se foi por causa da fome, mas achei a
comida deliciosa, tinha mesmo arroz e feijão, comida que quase não faço em
casa. Comemos também filé de peixe, batatas cozidas e uma salada de alface.
Bebemos uma cerveja, das grandes, depois descemos à praia. Andamos um pouco
pela beira d’água, o sol ia mais suave. Houve um momento em que ele apontou um
grupo de casas após uma pequena envergadura do mar, disse que estava hospedado
ali. Estou mesmo é precisando tomar um banho de água doce e deitar um pouco,
cheguei a dizer. Vamos, então, sugeriu, você vai poder descansar bastante.
Andamos ainda na areia por dez ou quinze minutos, quando atravessamos a pista
estreita e rumamos para o local das casas.
Não preciso dizer que fiquei pelada dentro da casa dele. Não
tinha o que vestir. Saí enrolada na toalha, fui até a uma pequena área atrás da
parte construída, onde havia um fio de estender roupa, dependurei minhas duas
peças e a canga, depois entrei. Ele perguntou se eu queria uma camiseta. Ótima
ideia. Vesti-a e me atirei na cama. Engraçado, quando deitei veio-me à cabeça a
ideia que eu tivera de contratar homens para trepar comigo, homens que não
teriam relação alguma além da sexual. Naquele momento tudo acontecia de maneira
muito diversa, com alguém que poderia mesmo vir a gostar de mim. Seria ele
possessivo? Pelo seu caráter zen, não.
Acordei, olhei meu telefone, eram onze e meia da noite.
Virei ao lado e abracei meu recente namorado. Ele despertou, percebeu minhas
intenções, abraçou-me também e rolamos sobre a cama. Beijei-o na boca, um longo
beijo. Após alguns segundos, sentei-me e tirei a camiseta. Mesmo no escuro, ele
apreciou minha nudez. Apertou-me os seios, puxou-me para junto dele, subiu
sobre meu corpo. Lembrou-se que estava de bermuda. Não demorou a despir-se.
Abraçamo-nos, cada um sentia o calor do corpo do outro. Ficamos assim durante
longos minutos, beijando-nos, apertando-nos, enfim, explorando tecidos
desconhecidos, pele inexplorada, promontórios escondidos. Senti-me excitada diante
da ereção que ele mantinha. Um pênis que se conservava em todo seu esplendor durante
o tempo que eu desejava. Ajoelhei-me e comecei a mordiscá-lo. Pouco a pouco
deixei que penetrasse minha boca, depois avancei e pude senti-lo tocar-me os
limites entre boca e garganta. Se esse homem esguicha seu sêmen, será que vou engasgar?,
cheguei a pensar. O gozo me vinha lento, prazeroso, desejava mantê-lo o máximo
possível. Minha estada ao seu lado, naquela casa, a loucura de ter deixado
minha cidade e vindo praticamente nua a Arraial, tudo me excitava muito. Pensei
no meu biquíni mínimo dependurado na corda, na canga transparente, será que
ainda estavam lá? Será alguém os furtaria para me deixar ainda mais nua? Não me
importei, o homem daria um jeito, grande parte dos homens sempre dão um jeito.
Após alguns minutos, deixei minha boca escorregar, soltei seu pênis e sentei-me
sobre o namorado. Adoro cavalgar. Mas primeiro era necessário encaixar seu peru,
deixar que, com vagar, escorregasse pra dentro de mim. Comecei suave, apenas a
ponta a beirar-me a vagina, quando senti que me molhava por dentro e por fora
pressionei-o. Perdi o controle, percebi que me penetrava fundo, cheguei a
gritar. Parti para o cavalgamento, era amazona a fugir de inimigo poderoso; ou
, quem sabe, a atacá-lo com flechas certeiras, derrubando-os um a um. Mas naquela
cama de fim de mundo, na verdade era eu a receber a flecha, a ponta anatômica mais
perfeita que a natureza produziu, capaz de proporcionar gozo às mulheres.
Esquecemos a camisinha, disse, não goza, não, por favor, me deixa perder a
cabeça sozinha, sussurrei próxima ao seu ouvido. Gozei, ele gozou também. Ambos
éramos, naquele momento, o homem e a mulher mais felizes do mundo.
Não fui embora no dia seguinte. Continuei o dia inteiro de
biquíni, com meu homem, na praia, no quiosque próximo a beber um coquetel, na
cama por mais duas ou três vezes. Escrevendo hoje, não lembro se parti num
domingo ou numa segunda-feira. E vejam que são dias bem distintos, fáceis de
serem demarcados. Nossa loucura foi tanta, que os dias se misturaram e vivemos
a maior parte do tempo sob as sensações dos nossos corpos.
Depois daqueles dias não o vi mais. Ele voltou a sua cidade.
Telefonou, enviou mensagens, falou comigo pelo videofone, sempre viajando,
sempre em cidades diferentes. Jamais perguntei em que trabalhava. Ficou um dia
de aparecer.
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