domingo, junho 21, 2020

No dia seguinte

Fazia uma semana que eu conhecera o homem e já estava no apartamento dele, nua, ou melhor, de calcinha e sutiã. Ele me apertava, me beijava. alisava minha pele. Por favor, pedi humilde, não vamos transar hoje, tenho dificuldade quando saio com alguém recém-conhecido, vamos deixar para a amanhã ou depois. Sorriu, beijou meus lábios, ligeiro estalo, depois passou a língua como se quisesse um tipo de porta aberta, meu lábios nervosos, queria vencer-me os limites da boca. Dei-me livre ao beijo, com sofreguidão. Por que somos tão brutos no ato do amor? Talvez herança ancestral, lá do começo, quando abandonamos a floresta, ou a selva, não sei. Demorou-se no beijo. Ao recuar e olhar meu rosto, admiração, como a uma estátua (eu percebia), disse sim, a gente espera até amanhã, ou até o dia quando você se sentir solta, soltinha. O diminutivo me beliscou o ventre, uma pontadinha de desejo. Mas quero uma coisa hoje, continuou, vou roubar-te a calcinha. Suspirei. Estaria o caminho aberto? Não me deu tempo de responder, repare, vou ficar vestido, assegurou, você não precisa temer. A calcinha desceu minhas coxas, deslizou sobre os joelhos, pelos tornozelos, e escapou vencendo-me os calcanhares. Onde a guardou, tive vergonha de perguntar. Abraçou-me forte, mas não me olhou nua. Morro de vexo sem sutiã. Ele pareceu entender.


Engraçada eu, conheci o homem no bistrô do cinema, ele esperava a hora do filme, perguntei se não estudara na tal faculdade, ou se fazia alguma pós. Respondeu não, a universidade é a mesma, mas sou de outro departamento, letras, afirmou vagaroso. Ah, sim, fiz confusão, tentei dar uma ponta de charme, face de mulher desatenta. Há homens que adoram. Conversamos, depois veio a vez do filme. Assistimos juntos. Era domingo, tarde da noite. Deixou o número do telefone, no final. Também ofereci-me, inteira, quase os mesmos números, ordens diversas. Levo você, já é tarde. Não se deve aceitar carona de um desconhecido, hesitei em pensamentos. Mas isso é para quando se é muito jovem, ou criança. Já passei dos trinta, quase quarenta. Vai ficar fora de mão pra você, tentei ser polida. Não, nada disso, é o carro que vai nos levar.


Investida ousada de minha parte naquela noite, agora, envergonhada sobre a cama, pedia que deixasse o sexo para o dia seguinte.


Rolamos sobre os lençóis. Eu o beijava, um tanto animal. Caso ele tirasse a roupa, eu acabaria abrindo as pernas, mas não tirou. Surpreendeu-me ao dizer que podíamos nos beijar com mais suavidade, teríamos todo o tempo do mundo.


Mais tarde, já em casa, como sou louca, refleti, mal o conheci aceitei a carona, uma semana depois já na cama dele, homem conhecido na rua, ao acaso, sem que alguém me apresentasse. Poderia estar perdida. Trepar teria sido o de menos, pior fosse um sádico, ou mesmo louco. Tive sorte, porém. Ele era gentil. Fiz tudo ao contrário do que aconselhamos às nossas filhas, às pessoas mais jovens. Deu certo. Treparia com ele, como trepei, no dia seguinte.

Nenhum comentário: