domingo, maio 17, 2009

Nua!

Sempre temi escrever em tempo real. Mas aí vai. Tenho recebido alguns e-mails com esse pedido. Os leitores também querem saber como eu escrevo. Respondo: escrevo nua. Isso, nuazinha. Antes escrevia de calcinha, mas depois decidi tirá-la. Assim fico mais confortável. Alguém reparou que tenho escrito coisas sérias ultimamente. Deve ser por causa do romance De olhos vendados. Mas será que minhas histórias não são sérias? Acho que tudo é sempre muito sério. Essa história é de meados do ano passado. Resolvi colocá-la no blog agora porque é um desperdício mantê-la guardada; tive tanto prazer em escrevê-la. Maria Zilda, apesar de importante, é uma mulher como qualquer outra, alguém cheia de desejo; e não perde tempo para satisfazê-lo. Será que está convincente? Olhem, Zilda existe mesmo.

Um leitor de Belém quis saber se eu me excito ao escrever. Claro, quem não se excita? Até mesmo se a gente escreve coisas sérias, como vai acima. Mas me excito. E muito. Só tenho que me cuidar para não (não gosto de dizer assim) gozar na hora em que estou escrevendo, porque fico morrendo de vergonha.

Quando tinha vinte e dois anos, tive um namorado que falava: “Margarida, vou tirar o teu gozo hoje.” Naquele tempo, eu não era tão desinibida. Abria o armário e pegava a toalha mais comprida. Fazíamos amor. Eu, quase pudica. Ao gozar, me enrolava no espesso tecido e só saía de dentro dele duas horas depois.

Mas, agora, se sinto aquela estremecimento lá dentro, seja apenas um tantinho, mas o prenúncio de todas as explosões, o lampejar de todas as estrelas, o espocar de fogos de artifícios, largo tudo e cubro os seios. Isso mesmo, quando morro de vergonha cubro os seios. Fico pelada na frente de cem pessoas, não tenho problema algum com a nudez, só não posso gozar; caso aconteça, cubro os seios. Com as mãos, é lógico. Assim, disfarço!

Vai aí uma história que já burilo há algumas semanas.

Longos beijos, queridos.


Duas adolescentes pararam-me na rua.

“Hei, moça, onde você comprou esse vestido?”

Olhei para elas e sorri. Estavam ávidas pela informação. Vestiam saias curtíssimas.

“É tão lindo”, falou espontânea a que tinha aspecto de ser a mais jovem.

“Eu mesma cortei, era uma camisa masculina.”

Olharam-me com fisionomia de espanto.

A que fizera a primeira pergunta ainda tocou no tecido na parte próxima ao ombro.

“Aqui está perfeito, um pouco caidinho sobre o braço esquerdo.”

“Em baixo também não é reto, você conseguiu cortar o tecido de um modo que ficou um tanto oblíquo.”

“Se vocês quiserem posso ensinar, mas não agora; deixo o meu número; basta ligarem que marcamos um horário.”

“Quanto você cobra?”

"Não, nem cobro; quero apenas ver vocês com esse sorriso maravilhoso. Agora, permitam-me ir porque tenho um compromisso e estou atrasada."

Deixei um cartãozinho; dei dois beijos em cada uma e escapuli. Elas ficaram radiantes de alegria.

Na noite anterior eu saíra com um namorado. Desses namorados que vez ou outra telefonam e dizem que estão morrendo de saudade e querem um encontro. Depois, como se mostram tão agradáveis, acabam acontecendo coisas boas, como beijos abraços e toques sutis.

Bebemos em um bar muito aconchegante. Ai, caipirinha... Na hora foi ótima, mas depois a bebida me excitou tanto que acabei fazendo besteira, ou melhor, algo prazeroso: sexo; só que o dia (ou a noite?) não era dos mais convenientes. E ainda esse meu namorado quis me pregar uma peça. Até que gosto das extravagâncias dele, mas o dia seguinte seria importantíssimo para mim: uma entrevista a respeito da edição do meu próximo livro. Não podia deixar de comparecer à editora.

Na saída à noite, não vestia ainda essa roupa que surpreendeu as duas meninas, mas um vestido vermelho, de alcinha e nem tão curto. Bebemos e comemos alguns petiscos naquele bar estilo 1930. Depois fomos para casa dele.

“Olha, vou embora no meio da noite, viu? Amanhã tenho que acordar cedo”, repeti.

“Você vai se casar amanhã?”, sorriu com ironia.

“Mais ou menos. Na verdade é mais do que um casamento, mas prefiro não falar agora, pode dar azar. Depois conto.”

No apartamento dele, namoramos muito. Logo me deixou peladinha; depois escondeu o meu vestido. Aquilo me excitou. Daí em diante nos agarramos com mais ímpeto.

Apertava-me os seios, beijava-me apaixonado e sussurrava coisas que me deixavam de cabelo em pé. Por fim, pedi que se aconchegasse dentro de mim e que demorasse bastante.

“Não sei se vou conseguir, já estou a ponto de uma explosão”, disse, mas fazia tudo para se manter naquele estreito limite em que, numa relação carnal, beiramos o abismo.

A explosão com todos os fogos e ainda com o tempo de um longo rescaldo se deu lá pelas três da madrugada. Eu estava que não me agüentava. Gozamos os dois e permanecemos agarrados um ao outro. Ainda pensei: daqui a pouco vou-me embora. Mas estava tão cansada, que dormi profundamente.

Acordei às oito e trinta. Levantei com aquela preguiça de sempre, ainda bêbada de sono. Fui ao banheiro. Quando voltei, dei pelo que eu tinha a fazer naquela manhã.

“Meu Deus, como estou atrasada, perdi a hora.”

Procurei meu parceiro da noite. Mas não o encontrei. Ele não estava no apartamento. Sai à cata de minhas roupas. Mas também não as encontrei. Vejam que situação. Num dia de semana, eu pelada na casa de um homem, sem ter o que vestir e sem nenhuma solução à vista. Liguei para ele.

“Antônio, onde você está?”

“No trabalho.”

“Por que não me acordou, Antônio?”

“Você estava dormindo com um ar tão angelical, que não tive coragem.”

“Onde você guardou minhas roupas?, preciso ir embora.”

“Suas roupas estão aqui comigo, na minha pasta. Sempre quis deixar você nua, esperando por mim em casa; é uma velha fantasia.”

“Antônio, bem que eu ia gostar se fosse num outro dia, mas hoje tenho um compromisso...”

“Margarida, você sempre dá um jeito. Deixe isso pra outro dia, espere por mim...”

Desliguei o telefone e comecei a pensar o que ia fazer.

Abri o guarda-roupas. Vi apenas roupas masculinas. Foi então que tive a idéia. Peguei uma camisa dessas de malha, de listras grossas. Não sei se de algum time de futebol. Primeiro, vesti-a. Não caiu bem do jeito original. Despi-me, peguei uma tesoura e fiz uma abertura maior na parte do pescoço; depois, cortei na parte de baixo, um corte numa inclinação de mais ou menos trinta graus. Achei linha e agulha – esse meu namorado é organizado com suas coisas – e fiz uma ligeira bainha.

Vesti. Ficou um vestidinho ótimo.

Corri para a editora depois de me despedir das duas adolescentes.

A secretária recebeu-me surpresa. Ainda a ouvi da outra sala, comentando com alguém:

“Essas artistas são umas figuras, precisa ver como está vestida.”

Entrei. O editor recebeu-me em pessoa. Nem precisei falar. Foi ele quem me cumprimentou, pediu para que eu sentasse. Acho que nem reparou se eu estava vestida ou pelada.

“Muito interessante o que você escreve. Acho que vai fazer muito sucesso. E vamos ganhar muito dinheiro!”, deu um imenso sorriso.

Ah, esses homens, só pensam em dinheiro!

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