quarta-feira, agosto 17, 2011

Boa ideia, Martha

Tirei um casaco grosso e comprido de dentro do guarda-roupa e o vesti. “Que tal, Júlia?”

Ela olhou e sorriu:

“Vai à boate apenas com ele sobre o corpo?”

“Quem sabe?”, fiz uma ligeira pose.

“Já fizemos isso antes, lembra? Eles vão logo reparar, essa fantasia já está muito batida.”

“Brincadeirinha.”

Ela trouxera do quarto ao lado várias peças passadas pela empregada, que viera no dia anterior.

“Por que ela não pendurou junto com as outras roupas?”

“Sabe como são essas secretárias de hoje em dia, pensam que trabalham demais, e logo para uma mulher sozinha como eu”, falou e deixou sobre a cama um vestido que tinha botões na parte da frente, iam de cima a baixo.

“Você vai com ele?”, apontei enquanto recolocava o casaco no armário.

“Vou experimentar.”

“Não vamos à festa para arranjar namorado, não é mesmo, Júlia? Nossa intenção é apenas diversão, mas caso apareça alguém interessante...”

“... a gente não deixa passar”, sorriu enquanto, também nua, jogava o vestido sobre o corpo. “Lembra da Rita?”, acrescentou.

“Qual Rita?”

“Uma que mora na Gávea.”

“Ah, sei, uma maluquete.”

“Essa mesma, todos dizem isso a respeito dela, mas até que é engraçada.”

Permaneci em pé, escutando Júlia. Ela me oferecia uma infinidade de roupas, tínhamos as mesmas medidas. Eu estava propensa a ir com a saia e a blusa com que viera de casa; esperaria, porém, ela falar sobre a amiga.

“Ela me contou que certa vez saiu à noite com um vestido semelhante a esse, todo abotoado na frente. Uma provocação ao namorado, que pedira a ela que usasse uma roupa sem nada por baixo. A Rita é demais. Sabe o que ela falou quando os dois retornaram a casa? Disse que queria ter encontrado um buraco.”

“Buraco? Não entendi.”

“Ele também não, mas ela explicou: ‘Um vão deserto ou coisa parecida, onde pudéssemos fazer amor.’ Ele replicou: ‘mas por que você não disse?’ Rita assumiu aquele ar distante que só ela sabe fazer, sempre querendo que os homens adivinhem os seus desejos. Dias depois ela saiu de novo com o mesmo vestido, mas  sozinha. Paquerou um desconhecido. E não é que o homem fez a vontade dela? Perguntei se ela insinuara alguma coisa. Disse que não, ele mesmo é que percebera. 'Enfim, mais inteligente do que o meu namorado, que tem até curso superior’, falou com aquela voz de quem está exausta de tantos homens a seus pés. E ainda mais uma coisa: não foi suficiente que ele lhe desabotoasse o vestido, trepou com ele nuazinha. E você, Martha, vai ficar também aí pelada, encostada no armário?”

“Não, estava esperando você acabar de contar. Acho que vou com a minha roupa mesmo.”

“Não quer variar um pouco?” Júlia parecia feliz com todas aquelas opções. “Lembra?”, continuou, “tenho muitas saias, blusas, vestidos, calças compridas e uma vez fiquei sem ter o que vestir no banheiro da casa da Ana.”

“Foi aquela brincadeira do casaco, lembro!”

“Agora você ri, bandida, mas esteve envolvida na peça que me pregaram.”

“Ah, Júlia, foi apenas uma brincadeirinha. Ana falou que o Roberto estava flertando com a Isabel e você se insinuava para ele. Então inventaram aquela história do vestido, um versace, sabiam que você adora a tal grife, levaram o seu casaco e fizeram você esperar no banheiro.”

“Me deixaram pelada por mais de uma hora, por pouco não voltei nua para a festa.”

“Mas fui eu que te salvei. Assim que descobri onde estava o casaco, levei até você. Sabe que demorei a perceber que você havia ido àquela festa apenas com ele sobre a pele, assim como a Rita e o vestido de botões...”

“Quando voltei à sala, o Roberto e a Isabel já haviam ido embora. Fiquei a ver navios...”

“Foi isso, acharam que você ganharia fácil a disputa contra a Isabel, por isso a armadilha.”

“Ardilosas, vocês todas."

Júlia virou-se para mim após olhar-se mais uma vez no espelho: "acho que ficou bom, não?"

"Ficou ótimo."

"Vista aquele camisão ali, Martha, vai também ficar ótimo em você.”

“Tem razão, é curto mas caiu em meu corpo com perfeição. Será que não vou sentir frio?”

“Vou levar o casaco, qualquer coisa te empresto, meu vestido é de mangas compridas.”

“Júlia, tive uma ótima idéia.”

“Qual?”

“Quando cansarmos de nossas roupas, vamos ao banheiro e as trocamos. Você me passa esse vestido de botões e eu entrego o camisão a você. Vamos confundir os homens.”

“Boa ideia, Martha, gostei muito, vai ser muito divertido. Pronta?”

“Pronta. Falta só o batom, espere um instantinho.”

Nenhum comentário: