quarta-feira, agosto 31, 2011

A cartomante

Assim que entrei no elevador ele olhou para mim. Vinha de algum andar acima. Pareceu-me, a princípio, familiar, mas depois que a porta se fechou e a máquina se pôs em movimento deduzi que se tratava de uma paquera. O elevador descia moroso, os andares se anunciavam no visor. No quarto pavimento, parou mais uma vez. Entrou uma mulher alta, elegante, usava chapéu largo. O homem, porém, não a olhou em nenhum momento. Reparei, por trás das lentes escuras dos meus óculos, que continuava a me espreitar. Lembrei então da mulher dos búzios.

“Não demora, vai surgir alguém na sua vida.”

Frase costumeira nesse tipo de serviço. Sempre conhecemos alguém, todos os dias encontramos pessoas com quem travamos algum tipo de relacionamento.

“Ele vai admirar muito você, não digo amar, mas apreciar sua beleza, sua inteligência”, completou. As pequenas pedras permaneciam sobre a mesa forrada com uma toalha branca, meio desbotada em alguns pontos, uma xícara de chá jazia sobre o móvel de cozinha, era possível vê-la da sala exígua.

O elevador continuou sua descida, parou no segundo andar. O homem saiu e segurou a porta para mim. Instintivamente também saí.

“Mas não é a portaria”, disse surpresa.

“Ainda faltam dois, achei que você quisesse vir comigo”, disse acintosamente.

“Ir com você? Nem o conheço...”

“Você é linda. E deve ser também muito inteligente. Achei que estava à procura de alguém como eu”, sua vaidade era maior do que a altura física, e ele era alto o bastante. Na verdade, um negro bonito. Pensei em frações de segundo o que aconteceria se o seguisse. Depois, tremi.

“Não se preocupe, sou treinador de ginástica olímpica, tenho um cartão, já deve ter ouvido falar de mim, preparo atletas...”

O homem falava, eu permanecia em meio ao desamparo do corredor. O elevador já havia partido e eu ainda não premera o botão para que ele voltasse. Quando reparei que subia, não parou no andar, teria que esperar descer de novo.

“No amor, deve-se aproveitar as oportunidades”, a voz da mulher, uma espécie de cartomante, quiromante, jogadora de búzios misturada com mãe de santo. Quem a indicou foi a mãe de uma colega de escola de minha filha.

“Quais suas intenções?”, perguntei.

“Quais podem ser as intenções de alguém como eu, que a observa desde o momento em que a vi e não mais desgrudei os olhos?”

Ri, sem jeito. Enfim, decidi. Iria me atirar, um salto arriscado, mas quem sabe, assim como os atletas dele, eu ganharia pelo menos uma medalha.

“Como podemos fazer?”

“Basta que venha comigo”, o sorriso da vitória estampou em seu rosto.

Deu-me a frente, seguimos o longo corredor. Na penúltima porta, pediu que eu parasse. Enfiou a chave abaixo da maçaneta, abriu a porta e, de modo cortês, convidou-me a entrar.

“O seu apartamento tem apenas uma cama e nada mais, é sórdido”, falei e me voltei decidida a ir embora.

“É apenas para eu descansar, tenho também um baú onde guardo as minhas coisas, me serve de mesa ou de cadeira quando preciso, você pode sentar sobre ele enquanto faço um café.”

“Você tem um apartamento para descansar em um prédio comercial de Copacabana e chega nele às onze da manhã”, afirmei em tom inquisitorial.

“Eu poderia perguntar o que você faz em Copacabana, saindo de um prédio mal-afamado como esse, também às onze da manhã.”

“Vim a uma cartomante”, deixei escapar.

“E ela não lhe falou sobre mim?”, sorriu seguro de si tocando, carinhoso, os meus cabelos.

“De certa forma, sim.”

“E o que mais?”, parecia curioso.

“Disse que eu não o temesse.”

Decidi não ir embora. Ele fez um café maravilhoso. Depois nos deitamos, ainda vestidos.

Beijou-me e continuou acariciando meus cabelos. Eu permanecia de bruços. Vestia blusa de malha curta e calça jeans, trajes juvenis para uma mulher de quase 40 anos. Mas ele pareceu gostar.

“Quer descansar primeiro?, amor”, perguntou suave.

“Sim”, falei e fechei os olhos.

Acho que dormimos durante duas horas. Ao acordar, estava nua. Ele tirara toda a minha roupa sem que eu sentisse. Ninguém conseguira tal façanha em toda a minha vida amorosa. Meus seios apontavam para cima. Sussurrei em seu ouvido, quase inaudível:

“Você é meu homem”, e o beijei na boca.

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