“Carol, você é louca, deixou que o homem te fotografasse nua e nem ligou para o destino das fotos. Se ele faz chantagem contigo?”
A voz de Ana ecoava na minha cabeça. Na verdade, jamais pensara nisso, e ele não foi o primeiro a me fotografar nua. É preciso dizer que não sou modelo fotográfico, posei só de brincadeirinha.
Quando fiz fotos pela primeira vez nua, ainda não havia a internet. Cheguei a dizer tempos depois a um ex-namorado que também me perguntou se teria coragem de ficar sem roupa para algumas fotos: “já fui fotografada nua e nem sei onde andam as fotos, acho que com o rapaz que me clicou.” Ele retrucou: “você não tem medo do que ele possa fazer com essas fotos?” De pronto, respondi: “nem penso nisso.”
Mas Ana me deixou preocupada. Agora existe essa bendita rede. Está certo que é imensa, que nela há de tudo, logo não será fácil alguém me encontrar pelada num site. Mas se procurar com empenho, acabará achando.
Fui para o computador enlouquecida. Coloquei meu nome por inteiro, pela metade, meus apelidos, todos os nomes falsos que costumo dizer aos namorados. Nada, nadinha de eu pelada. Ainda bem. Já pensou se apareço num desses sites visitados milhares de vezes ao dia por pessoas do mundo inteiro? Vou ficar roxa. E no meu trabalho, o que vou dizer? Será que me mandam embora?
Falei a mim mesma: calma, Carol, você sempre teve sorte, nunca pensou nesses problemas, vai começar a viver essa paranoia? Ana é cheia de medo, vai à terapia, anda escondida para não ser assaltada, não usa roupa curta nem tem namorado, você, cheia de homens te seguindo, se quiser escolhe a dedo, vai ficar ruminando isso agora?
Ainda bem, só me preocupei durante um diazinho. Voltei a ser eu mesma. Ando pelada, vou à praia pelada, permito que o namorado desate os lacinhos do meu biquíni no banho de mar. E tem mais, deseja saber? Se ele quiser fico peladinha pra mais algumas fotos. Qualquer problema, eu nego. “Não, essa não sou eu, existe programa de computador pra tudo, foi alguém que criou as fotos. Mas você não acha que estou até mais bonita?"
Vou tirar um sarro.
quarta-feira, outubro 26, 2011
quarta-feira, outubro 19, 2011
Tínhamos toda a tarde do mundo
Andava numa rua do Centro. Hora do almoço. Passei por um homem de ar jovial, embora aparentasse meia idade. Lancei-lhe um olhar furtivo. Seus olhos, porém, surpreenderam os meus. Continuei em frente sem apressar os passos. Será que ele me seguiria? Uma mulher não deve manter o olhar frontal, sobretudo dirigido a homens, significa convite. Depois de cruzar uma das transversais, assaltou-me a tentação de olhar para trás, queria saber se estava sendo seguida. Mas resisti, mantive a pose e a direção.
Mais adiante cruzei uma travessa onde há uma cafeteria. Cheguei junto à garçonete e pedi um expresso. Ao me voltar para sentar em uma das mesinhas, dei-me com ele. Não mexi os olhos, ficaram voltados à direita, paralisados, tentativa vã de disfarce.
Pedi um pastel de forno quando a garçonete atravessou o pequeno espaço entre as três mesas que dividem a pequena loja. Abri a bolsa e fiz de conta que ia pegar um livro. Na verdade, segurei o livro nas mãos. Não havia outro remédio. A capa vermelha, lustrosa; comecei a folheá-lo. Mantinha-me absorta, escondida em suas páginas. Voltou a moça com o salgado. Repousei o livro sobre a mesa e comecei a comer. Ainda havia meia xícara de café.
Não mais vi o homem. Seria o mesmo a quem eu olhara na rua, ou me enganava? Que pena, não o queria, mas era bom saber-me desejada, seguida, enfim, valorizada, mesmo em apuros. Comia voltada para a vitrine da loja em frente, loja de roupas masculinas. Bonitas as roupas. Enquanto observava o nome da loja, um homem entrou na cafeteria. Ele. Dessa vez acertei. Abaixei os olhos, rápida, mas ele surpreendeu o meu gesto sutil nos últimos instantes. Flagrada nua no inesperado entreabrir de uma porta. Não consegui evitar um meio sorriso. Não sei dizer se de gosto ou de pudor. A situação prolongou minha face febril. O homem tinha uma bonita pasta marrom, dessas de couro, devia ser cara a pasta.
A garçonete veio atendê-lo.
Como eu escaparia? Fácil, bastaria levantar e sair dali a passos rápidos. Mas meu desejo pesava duzentos quilos. Calma, Lúcia, coma com vagar o pastel, tome os últimos goles do café. Fixei-me mais uma vez numa página do livro. De que se trata mesmo esse livro? Acho que é de filosofia. Será que ele deseja saber o que leio? Será que me quer nua perenemente? Minha mão direita tremeu quando levei a xícara aos lábios pela última vez. Novamente trocamos olhares; o meu, porém, mais uma vez involuntário. Era bonito o homem, cabelo preto, peito estufado, camisa branca, devia ter a pele macia. Será que falará alguma coisa, um palpite sobre o tempo, sobre o sabor do café? Ou sua voz se perderá no anonimato das ruas apinhadas do Centro.
Não mais vi o homem. Seria o mesmo a quem eu olhara na rua, ou me enganava? Que pena, não o queria, mas era bom saber-me desejada, seguida, enfim, valorizada, mesmo em apuros. Comia voltada para a vitrine da loja em frente, loja de roupas masculinas. Bonitas as roupas. Enquanto observava o nome da loja, um homem entrou na cafeteria. Ele. Dessa vez acertei. Abaixei os olhos, rápida, mas ele surpreendeu o meu gesto sutil nos últimos instantes. Flagrada nua no inesperado entreabrir de uma porta. Não consegui evitar um meio sorriso. Não sei dizer se de gosto ou de pudor. A situação prolongou minha face febril. O homem tinha uma bonita pasta marrom, dessas de couro, devia ser cara a pasta.
A garçonete veio atendê-lo.
Como eu escaparia? Fácil, bastaria levantar e sair dali a passos rápidos. Mas meu desejo pesava duzentos quilos. Calma, Lúcia, coma com vagar o pastel, tome os últimos goles do café. Fixei-me mais uma vez numa página do livro. De que se trata mesmo esse livro? Acho que é de filosofia. Será que ele deseja saber o que leio? Será que me quer nua perenemente? Minha mão direita tremeu quando levei a xícara aos lábios pela última vez. Novamente trocamos olhares; o meu, porém, mais uma vez involuntário. Era bonito o homem, cabelo preto, peito estufado, camisa branca, devia ter a pele macia. Será que falará alguma coisa, um palpite sobre o tempo, sobre o sabor do café? Ou sua voz se perderá no anonimato das ruas apinhadas do Centro.
“Moça, moça!”
Para onde olho? Onde enfio a cabeça?
“Moça, no chão!”, apontava, não pôde completar porque levara à boca um pedaço enorme de pastel.
Abaixei os olhos. Ah, o marcador do meu livro. “Obrigada.”
Sorrimos. Estava aberta a porta. E fui eu que provocara. Na verdade, deixei a porta escancarada. Agora, era com ele. Bastaria entrar. Nenhum obstáculo. Tínhamos toda a cidade pela frente, tínhamos toda a tarde do mundo...
terça-feira, outubro 11, 2011
Lancei-lhe um beijinho
Tudo começou quando atravessava a W 3 Norte numa terça de manhã. Trabalhava e resolvera sair para fumar. Lembrei que, do outro lado, há uma banca de jornal. Havia alguns dias desejava olhar uma revista de moda. Assim que pisei no passeio após terminar a travessia, um homem de dentro de um automóvel olhou para mim. Correspondi-lhe sorrateira. Qual não foi minha surpresa encontrá-lo minutos depois, na mesma banca de jornal, bem ao meu lado.
“Oi”, cumprimentou-me e sorriu.
“Oi”, respondi e continuei a olhar minha revista. Dei um trago no cigarro, tentava manter a tranquilidade.
“Lembra de mim?”, perguntou.
“Claro, lembro, sim”, falei sem lhe voltar os olhos.
“Não sei se posso deixar o carro ali, próximo à esquina, não tenho muito tempo”, acrescentou.
“Nem eu, deixei o trabalho para fumar e estou aqui já faz um tempinho.”
“Você trabalha por aqui?”
“Sim.”
“Onde?”
Apontei o TRT, adiante, no outro lado da rua. “E você?”, perguntei
“Não sou daqui, vou ficar mais dois ou três dias”, respondeu e hesitou se iria até o carro ou esperaria. “Na minha cidade, quando uma mulher corresponde ao olhar de um homem, ela oferece o número do telefone.”
“Ah, é isso”, devolvi a revista e fiquei ao seu lado, “você quer o meu número...”
“Na verdade queria conversar um pouco com você.”
“Anota o meu número, me telefone depois das três que a gente marca alguma coisa, ok?”, sorri meiga – minha amiga Ana diria que sorri bem piranha.
“Não quer entrar um pouco para conversarmos”, destravou as portas e esperou minha reação.
“Não posso, tenho de trabalhar, telefone depois das três”, fiz uma expressão provocante e lhe lancei um beijinho.
Acho que foi o meu vestido que o atraiu; apesar do tecido grosso, deixava os braços de fora e os seios salientes.
Às quatro e trinta ele já havia telefonado duas vezes. Eram seis horas quando deixei o prédio para, no ponto seguinte, entrar em seu carro.
"Vamos ao Lago Sul", sugeri, "ensino o caminho, é preciso entrar na terceira ponte."
Seu carro era novo e veloz, mas dirigia com muito cuidado.
"Sua cidade é muito agradável", suspirou quando já percorrêramos mais da metade do caminho.
"Não vou ficar nua pra você com tanta facilidade", falei e insinuei uma gargalhada.
Ele também riu.
"Aqui em Brasília, as mulheres reparam muito os homens", falou e deu uma piscadela enquanto voltava a cabeça para frente, em atenção ao trânsito.
"Você acha isso mesmo?"
"Tenho certeza", falou, "desde ontem mais de cinco mulheres sorriram para mim, e não é porque tenho cara de cômico."
"Quem sabe?", falei e continuei com a fisionomia irônica.
"É sério, as mulheres olham para os homens onde quer que se ande em Brasília."
"Só em Brasília?"
"No Rio não é tão fácil, principalmente na zona sul. Ali as mulheres gostam de se fazer de difícil."
"Ah, sempre o Rio. O Rio não é Brasil", afirmei.
"Como?"
"O Rio é outro país, não se parece com nada do que conhecemos, está mais próximo de Nova York do que de qualquer outra cidade brasileira. Entre aqui, isso, agora mantenha à direita, já estamos quase chegando."
Uma quadra depois entrávamos no centro gastronômico do Lago Sul, um lugar caro, porém bonito.
"Você gosta de que tipo de comida?", perguntou.
"Para falar a verdade, nem estou com fome, mas bebo alguma coisa."
"Ótima ideia, vamos beber,"
Fez a volta e estacionou.
Para uma terça-feira, até que o movimento era bom. Anoitecia e se podiam ver alguns prédios stuados do outro lado do lago. Aquela paisagem sempre me provocou alguma emoção. Brasília não tem o mar, mas dali é possível avistar, vez ou outra, alguns barcos, além disso, há o ancoradouro.
Ficamos em uma mesa externa, um toldo nos cobria, mas era possível ver as árvores que cercavam o restaurante.
"Em que você trabalha?", perguntei.
"Em que se pode trabalhar estando três dias em Brasília?"
"Você é uma espécie de lobista", falei.
"Um lobista num automóvel alugado?"
"De que eles andam?"
"Direto para o aeroporto, carros com motoristas."
"Você é um ilustre deputado desconhecido."
"Nem tanto, sou juiz, se é que você vai acreditar."
"Juiz?, de verdade?"
"Em carne e osso, TRF, de Sampa, vim resolver um problema de gabinete."
"De gabinete?"
"Isso, não posso me estender, é sigiloso."
"Então teremos que andar dentro da lei?", olhei e fiz-me de desentendida.
"Isso, na mais absoluta lei", completou.
"Juízes paqueram?"
"Por que não? Como você veio parar aqui?"
"Trabalho na justiça também, só que na do trabalho, você deve conhecer meu chefe."
"Não o conheço e prefiro falar de outro assunto."
"O que você acha do governo?" Eu quis saber sua opinião.
"Como qualquer outro, não há diferença, até as crises são as mesmas.
"Caso tenhamos que seguir estritamente a lei, você não invadirá a privacidade de uma mulher."
"Lógico que não."
"Então para que me chamou para sair?"
"Gostei de você, é muito bonita e parece inteligente."
"As mulheres que você conhece não são inteligentes?"
"Algumas sim, outras não, meio a meio."
"Aqui em Brasília, não posso falar por todas, mas a maioria é muito inteligente, até a minha secretária, aquela que fica em casa cozinhando, arrumando, lavando e passando, ela é muito inteligente."
"Ela leu Dostoiévski?"
"Ah, você e todos os homens, acaso ler Dostoiévski é sinônimo de inteligência?"
"O que seria então, para você?"
"Alguma coisa sobre física nuclear, ou a química dos corpos em decomposição, não sei..."
"Sua empregada sabe alguma coisa sobre isso?"
"Empregada não, secretária."
"Isso, secretária, ela sabe?"
"Não, mas não sustenta o marido e discute letras de música."
O garçom já nos esperava fazia tempo. Olhamos os cardápios e pedimos as bebidas.
Uma moça levantou-se e saiu seguida do namorado, acabavam de deixar o local, ela o beijou na boca, um beijo rápido, seu rosto demonstrava toda a felicidade do mundo, afastaram-se abraçados um ao outro; ela, sensualíssima, ia dentro de um vestido azul justo e muito curto.
"Tenho um vestido assim", falei ao meu acompanhante.
"Você não se sente mal usando uma roupa desse tipo?"
"Depende para onde se vá, é roupa para noite, então a gente se sente bem. Mas, por exemplo, para andar de dia nem pensar, vou me sentir nua."
"Caso você vá a São Paulo, pode escolher um presente, e, quem sabe, queira um vestido bem caro?"
"Jura?, adoro roupas caras, você vai ter uma despesa muito grande."
O garçom chegou com nossos coquetéis, todos muito bem preparados e coloridos. Sorvi um gole, adorei.
Ele pediu uma bebida que eu não conhecia, mas tinha algum composto que levava vodca russa. Durante alguns minutos ficamos em silêncio. Aproveitei para olhar em volta e observar o movimento. Numa mesa próxima duas mulheres e um homem bebiam chopes e contavam algum caso divertido. Uma das jovens tentava explicar algo que lhe acontecera, mas não consegui prestar atenção.
Outro garçom veio à nossa mesa e deixou um tipo de entrada, havia pães, pastas, frios e berinjela cortada bem fina. Meu recente enamorado pegou uma torrada e comeu com umas tirinhas da berinjela. Aproveitei para experimentar uma pasta.
A bebida me ajudou a pensar melhor sobre o dia e a noite que eu estava vivendo. Em situações normais, não se tem tanta sorte. Caso fosse verdade mesmo o que ele falava – não é sempre que se namora um juiz, tanto mais alguém jovem como ele –, eu estaria ganhando um bilhete premiado. Tentava descobrir se deveria aproveitar tudo naquela mesma noite ou se haveria continuidade, mesmo se tivesse de viajar à sua cidade.
"Você é muito ocupado em São Paulo?", arrisquei.
"Todos nós, juízes, somos, o trabalho não termina e as pessoas ainda reclamam que a justiça é lenta."
"Portanto, é impossível visitar você em São Paulo."
"Impossível, não. Mas temos que marcar encontros à noite, e às vezes tarde."
"E onde posso ficar hospedada em São Paulo?"
"Na minha casa", falou como se fosse a dedução mais lógica do mundo.
"Que bom!", exclamei, "acho que tive muita sorte em conhecer você."
"Ah, não diga isso, sou uma pessoa comum, as pessoas costumam fantasiar muito, você está fazendo isso."
"Não, não é que não existam homens do seu nível para sair comigo", pigarreei proposital, "mas acho que foi ótimo conhecer você, e logo numa época em que não tenho outros compromissos."
"Você quer dizer, outros relacionamentos."
"Isso mesmo, adivinhou!"
"Você parece muito feliz."
"E realmente estou."
Comemos a entrada toda, e ainda pedimos um pequeno prato, filé de truta com molho à moda da casa, acho que tinha um tantinho de caramelo, nunca havia comido aquela refeição, mas estava uma delícia. Acho que o jantar contribuiu para nos relaxar ainda mais.
"O que você vai fazer depois de me deixar em casa?"
"Estou hospedado num daqueles hotéis altos, no setor hoteleiro norte, quer ir até lá ou quer que eu vá à sua casa?"
"Você iria mesmo à minha casa?", surpreendi-me com sua oferta.
"Por que não?"
"Olhe que não é grandes coisa, e nunca imaginei que um magistrado pudesse ir lá."
"Ah, esqueça isso, sou magistrado apenas quando estou no trabalho."
"Tem mais uma coisa", disse envergonhada, "você não vai me levar presa se eu fizer uma transgressãozinha?"
"Depende, caso haja algum atenuante, posso pensar."
"Ah, atenuante é o que não vai faltar!"
Beijei-lhe o rosto pela primeira vez. Horas depois, dias depois e meses depois, beijei-o muito mais. E fizemos outras tantas coisas... Mas conto numa outra hora.
“Oi”, cumprimentou-me e sorriu.
“Oi”, respondi e continuei a olhar minha revista. Dei um trago no cigarro, tentava manter a tranquilidade.
“Lembra de mim?”, perguntou.
“Claro, lembro, sim”, falei sem lhe voltar os olhos.
“Não sei se posso deixar o carro ali, próximo à esquina, não tenho muito tempo”, acrescentou.
“Nem eu, deixei o trabalho para fumar e estou aqui já faz um tempinho.”
“Você trabalha por aqui?”
“Sim.”
“Onde?”
Apontei o TRT, adiante, no outro lado da rua. “E você?”, perguntei
“Não sou daqui, vou ficar mais dois ou três dias”, respondeu e hesitou se iria até o carro ou esperaria. “Na minha cidade, quando uma mulher corresponde ao olhar de um homem, ela oferece o número do telefone.”
“Ah, é isso”, devolvi a revista e fiquei ao seu lado, “você quer o meu número...”
“Na verdade queria conversar um pouco com você.”
“Anota o meu número, me telefone depois das três que a gente marca alguma coisa, ok?”, sorri meiga – minha amiga Ana diria que sorri bem piranha.
“Não quer entrar um pouco para conversarmos”, destravou as portas e esperou minha reação.
“Não posso, tenho de trabalhar, telefone depois das três”, fiz uma expressão provocante e lhe lancei um beijinho.
Acho que foi o meu vestido que o atraiu; apesar do tecido grosso, deixava os braços de fora e os seios salientes.
Às quatro e trinta ele já havia telefonado duas vezes. Eram seis horas quando deixei o prédio para, no ponto seguinte, entrar em seu carro.
"Vamos ao Lago Sul", sugeri, "ensino o caminho, é preciso entrar na terceira ponte."
Seu carro era novo e veloz, mas dirigia com muito cuidado.
"Sua cidade é muito agradável", suspirou quando já percorrêramos mais da metade do caminho.
"Não vou ficar nua pra você com tanta facilidade", falei e insinuei uma gargalhada.
Ele também riu.
"Aqui em Brasília, as mulheres reparam muito os homens", falou e deu uma piscadela enquanto voltava a cabeça para frente, em atenção ao trânsito.
"Você acha isso mesmo?"
"Tenho certeza", falou, "desde ontem mais de cinco mulheres sorriram para mim, e não é porque tenho cara de cômico."
"Quem sabe?", falei e continuei com a fisionomia irônica.
"É sério, as mulheres olham para os homens onde quer que se ande em Brasília."
"Só em Brasília?"
"No Rio não é tão fácil, principalmente na zona sul. Ali as mulheres gostam de se fazer de difícil."
"Ah, sempre o Rio. O Rio não é Brasil", afirmei.
"Como?"
"O Rio é outro país, não se parece com nada do que conhecemos, está mais próximo de Nova York do que de qualquer outra cidade brasileira. Entre aqui, isso, agora mantenha à direita, já estamos quase chegando."
Uma quadra depois entrávamos no centro gastronômico do Lago Sul, um lugar caro, porém bonito.
"Você gosta de que tipo de comida?", perguntou.
"Para falar a verdade, nem estou com fome, mas bebo alguma coisa."
"Ótima ideia, vamos beber,"
Fez a volta e estacionou.
Para uma terça-feira, até que o movimento era bom. Anoitecia e se podiam ver alguns prédios stuados do outro lado do lago. Aquela paisagem sempre me provocou alguma emoção. Brasília não tem o mar, mas dali é possível avistar, vez ou outra, alguns barcos, além disso, há o ancoradouro.
Ficamos em uma mesa externa, um toldo nos cobria, mas era possível ver as árvores que cercavam o restaurante.
"Em que você trabalha?", perguntei.
"Em que se pode trabalhar estando três dias em Brasília?"
"Você é uma espécie de lobista", falei.
"Um lobista num automóvel alugado?"
"De que eles andam?"
"Direto para o aeroporto, carros com motoristas."
"Você é um ilustre deputado desconhecido."
"Nem tanto, sou juiz, se é que você vai acreditar."
"Juiz?, de verdade?"
"Em carne e osso, TRF, de Sampa, vim resolver um problema de gabinete."
"De gabinete?"
"Isso, não posso me estender, é sigiloso."
"Então teremos que andar dentro da lei?", olhei e fiz-me de desentendida.
"Isso, na mais absoluta lei", completou.
"Juízes paqueram?"
"Por que não? Como você veio parar aqui?"
"Trabalho na justiça também, só que na do trabalho, você deve conhecer meu chefe."
"Não o conheço e prefiro falar de outro assunto."
"O que você acha do governo?" Eu quis saber sua opinião.
"Como qualquer outro, não há diferença, até as crises são as mesmas.
"Caso tenhamos que seguir estritamente a lei, você não invadirá a privacidade de uma mulher."
"Lógico que não."
"Então para que me chamou para sair?"
"Gostei de você, é muito bonita e parece inteligente."
"As mulheres que você conhece não são inteligentes?"
"Algumas sim, outras não, meio a meio."
"Aqui em Brasília, não posso falar por todas, mas a maioria é muito inteligente, até a minha secretária, aquela que fica em casa cozinhando, arrumando, lavando e passando, ela é muito inteligente."
"Ela leu Dostoiévski?"
"Ah, você e todos os homens, acaso ler Dostoiévski é sinônimo de inteligência?"
"O que seria então, para você?"
"Alguma coisa sobre física nuclear, ou a química dos corpos em decomposição, não sei..."
"Sua empregada sabe alguma coisa sobre isso?"
"Empregada não, secretária."
"Isso, secretária, ela sabe?"
"Não, mas não sustenta o marido e discute letras de música."
O garçom já nos esperava fazia tempo. Olhamos os cardápios e pedimos as bebidas.
Uma moça levantou-se e saiu seguida do namorado, acabavam de deixar o local, ela o beijou na boca, um beijo rápido, seu rosto demonstrava toda a felicidade do mundo, afastaram-se abraçados um ao outro; ela, sensualíssima, ia dentro de um vestido azul justo e muito curto.
"Tenho um vestido assim", falei ao meu acompanhante.
"Você não se sente mal usando uma roupa desse tipo?"
"Depende para onde se vá, é roupa para noite, então a gente se sente bem. Mas, por exemplo, para andar de dia nem pensar, vou me sentir nua."
"Caso você vá a São Paulo, pode escolher um presente, e, quem sabe, queira um vestido bem caro?"
"Jura?, adoro roupas caras, você vai ter uma despesa muito grande."
O garçom chegou com nossos coquetéis, todos muito bem preparados e coloridos. Sorvi um gole, adorei.
Ele pediu uma bebida que eu não conhecia, mas tinha algum composto que levava vodca russa. Durante alguns minutos ficamos em silêncio. Aproveitei para olhar em volta e observar o movimento. Numa mesa próxima duas mulheres e um homem bebiam chopes e contavam algum caso divertido. Uma das jovens tentava explicar algo que lhe acontecera, mas não consegui prestar atenção.
Outro garçom veio à nossa mesa e deixou um tipo de entrada, havia pães, pastas, frios e berinjela cortada bem fina. Meu recente enamorado pegou uma torrada e comeu com umas tirinhas da berinjela. Aproveitei para experimentar uma pasta.
A bebida me ajudou a pensar melhor sobre o dia e a noite que eu estava vivendo. Em situações normais, não se tem tanta sorte. Caso fosse verdade mesmo o que ele falava – não é sempre que se namora um juiz, tanto mais alguém jovem como ele –, eu estaria ganhando um bilhete premiado. Tentava descobrir se deveria aproveitar tudo naquela mesma noite ou se haveria continuidade, mesmo se tivesse de viajar à sua cidade.
"Você é muito ocupado em São Paulo?", arrisquei.
"Todos nós, juízes, somos, o trabalho não termina e as pessoas ainda reclamam que a justiça é lenta."
"Portanto, é impossível visitar você em São Paulo."
"Impossível, não. Mas temos que marcar encontros à noite, e às vezes tarde."
"E onde posso ficar hospedada em São Paulo?"
"Na minha casa", falou como se fosse a dedução mais lógica do mundo.
"Que bom!", exclamei, "acho que tive muita sorte em conhecer você."
"Ah, não diga isso, sou uma pessoa comum, as pessoas costumam fantasiar muito, você está fazendo isso."
"Não, não é que não existam homens do seu nível para sair comigo", pigarreei proposital, "mas acho que foi ótimo conhecer você, e logo numa época em que não tenho outros compromissos."
"Você quer dizer, outros relacionamentos."
"Isso mesmo, adivinhou!"
"Você parece muito feliz."
"E realmente estou."
Comemos a entrada toda, e ainda pedimos um pequeno prato, filé de truta com molho à moda da casa, acho que tinha um tantinho de caramelo, nunca havia comido aquela refeição, mas estava uma delícia. Acho que o jantar contribuiu para nos relaxar ainda mais.
"O que você vai fazer depois de me deixar em casa?"
"Estou hospedado num daqueles hotéis altos, no setor hoteleiro norte, quer ir até lá ou quer que eu vá à sua casa?"
"Você iria mesmo à minha casa?", surpreendi-me com sua oferta.
"Por que não?"
"Olhe que não é grandes coisa, e nunca imaginei que um magistrado pudesse ir lá."
"Ah, esqueça isso, sou magistrado apenas quando estou no trabalho."
"Tem mais uma coisa", disse envergonhada, "você não vai me levar presa se eu fizer uma transgressãozinha?"
"Depende, caso haja algum atenuante, posso pensar."
"Ah, atenuante é o que não vai faltar!"
Beijei-lhe o rosto pela primeira vez. Horas depois, dias depois e meses depois, beijei-o muito mais. E fizemos outras tantas coisas... Mas conto numa outra hora.
Quer vir buscar sua amiga?
Ai, não sei mais o que faço, sempre peladinha... Temo que isso um dia pode não acabar bem. Mas como sei que você me ama e atende a todos os meus pedidos, vamos a mais um. Vim de uma festa com um namoradinho novo. Insinuei que gosto de ficar nua. Foi o suficiente. Ele parou o carro e tirou toda a minha roupa. Depois me contou que tinha medo que o chamassem de tarado. Segredou-me que adora pedir às mulheres com quem se relaciona para saírem nuas do carro. Primeiro perguntou se eu achava sua atitude normal. Falei que não via nada de mais no seu desejo. Depois perguntou-me, muito gentil, se eu podia concretizá-lo. Prontamente, respondi. Ele destravou as portas e lá fui eu nua para a calçada. E sabe onde? Na Lagoa. Eram três e meia da manhã. Sorte minha? A princípio, sim, porque não passava ninguém. De brincadeira, dei um adeusinho a ele. Não é que o homem arrancou com o carro e me deixou ali, ou melhor, aqui. Ainda o espero... Logo que desapareceu, senti um friozinho na barriga. Mas me controlei, eles sempre voltam, pensei, este também há de retornar. Mas... Mas... (agora o mais importante para você, que sempre foi meu amigo)... ele ainda não deu as caras. Acho que quer procurar logo mais as notícias e saber de uma mulher nua, o que aconteceu a ela etc. etc. Há namorados que completam seu prazer assim. São quatro e trinta e dois neste momento, daqui a pouco o sol, bonitinho, como gosto. Mas eu, sem nenhuma roupinha. Ah, ele me deixou sair com a bolsa, sorte minha, não?, por isso envio a você a mensagem. Quer vir buscar uma amiga em apuros? Você também vai morrer de tesão, sua amiga está tão saradinha. Espero naquela curva de quem vem de Copa, no parque, há uma árvore grande, basta piscar os faróis que corro pra você. Caso você falte, sua peladinha vai a outro. E sei que você é quentinho por mim. Venha logo, tá? Não acredita? Pergunta como posso escrever tão bonitinho em meio a uma situação desfavorável? Sou escritora, você sabe, e perfeccionista. Nua na avenida, prestes a ser surpreendida, mas sem perder a elegância. Não demore!
Beijinhos,
sua M.C.
Beijinhos,
sua M.C.
quinta-feira, outubro 06, 2011
Você vai adorar!
Estava na calçada, aguardava o táxi. Reparei uma moça com uma túnica frente única, parecia na verdade um microvestido. Mas dava para perceber que ela vestia short por baixo. Respirei aliviada. Já imaginou alguém de roupa tão curta sem o shortinho? Lembrei que eu já saíra com um vestido daquele comprimento. Tive uma vontade louca de estar naquela blusa, todos os homens a me olharem, a procurarem minhas pernas nuas.
O táxi parou. Entrei. O motorista, sempre discreto, já conhece meus trajetos. Jandira me havia ligado fazia trinta minutos e comunicado sobre o cliente que eu deveria atender naquela tarde.
Após rodar por toda a Presidente Vargas, o automóvel contornou a Candelária e parou no sinal com a Primeiro de Março. Alguns minutos a mais atravessamos o trecho da perimetral sobre a Praça 15. Dois ou três minutos depois eu desembarcava na Marechal Câmara, em frente ao hotel onde costumo atender a maioria dos meus clientes.
“Ei, moça”, um homem me surpreendeu quando quase já atingia a porta do hotel. Parei, automática. Mas não era quem estava agendado. Este me esperava na suíte 410.
“Ei, moça, você combina encontros pela Jandi, não?”
“Sim, mas você precisa ligar para ela, não fale comigo agora, por favor”, deixei o homem para trás e atravessei a porta.
Na suíte encontrei o cliente, como de costume.
Duas horas depois, tendo cumprido meu papel com esmero, saí do hotel, sozinha. O cliente descera um quarto de hora antes. Na calçada, porém, o mesmo homem que me abordara na chegada.
“Moça, por favor, qual o seu preço?"
“Já falei, os encontros precisam ser agendados através da Jandi, não falo sobre preços."
“Você tem um expediente, não? Que tal sair comigo por fora, pago o que eles pedem e você fica com as duas partes.”
A proposta era vantajosa, mas perigosa quando se trata de alguém desconhecido.
“Prefiro que você ligue para a Jandira, tenho o número, basta dizer que deseja ser meu cliente, ela marca pra daqui a pouquinho. Não diga que estou a seu lado.”
“Não quero nada com sua agenciadora, mas direto com você.”
Eram quartro da tarde, muitas pessoas transitavam pelo passeio, nós atrapalhávamos o caminho. Ameacei deixar o homem falando sozinho. Ao dar dois passos, ele me seguiu, fez um gesto de que ia me segurar pelo braço. Mas recuou.
“Quanto sua agenciadora pede? Quatrocentos, quinhentos?”
“Seiscentos.”
“Pago setecentos mais cem para o seu transporte de volta.”
Sua oferta me fez pensar. Setecentos não era coisa à toa. Rapidamente, falei – porque sabia que se demorasse desistiria: “temos de ir primeiro a um caixa eletrônico, você deve fazer o depósito na minha conta.”
“Ok, qual é o seu banco?”
Caminhamos até o caixa mais próximo. Havia poucas pessoas na fila, logo se deu a transferência de valores.
“Agora vamos”, me segurou por um dos braços. Entramos num táxi.
O homem fez o taxista atravessar a ponte em direção a Niterói.
“Por que tão longe?”, sussurrei, “não posso ficar com você por mais de duas horas, vão procurar por mim.”
“Ficamos o tempo que seus clientes costumam usar, não há problema.”
Descemos do táxi dentro de um motel, numa das praias de fora.
Estou acostumada a diversos tipos de homem, mas naquele momento tremi um pouco. Como através da agência nunca tive problemas, comecei a achar que agindo sozinha poderia ficar em maus lençóis, literalmente.
Logo que entramos na suíte, falou:
“Tire a roupa.”
“Mas assim, sem fantasia?”, suspirei sem graça.
“Claro que haverá fantasia.”
Tirou da pasta uma túnica exatamente igual à da moça que eu vira enquanto esperava o táxi.
“Vista”, ordenou, “mas sem nada por baixo”, viu?
Vesti a blusa.
“Suba na sua sandália alta e ande como se estivesse desfilando, você tem de fazer de tudo para que eu não note que você está sem calcinha.”
“Acho que vai ser impossível, sou muito alta e a sandália ainda me deixa maior, mas já que é a sua vontade...”
Me coloquei na posição e comecei o desfile. Reparei que ele recolheu minhas roupas, mas fingi nada ter visto. Andei de um lado a outro, passos de modelo, sorria sempre que passava por ele. Acabei gostando da brincadeira.
“Sabe a moça da propaganda, a que fica de calcinha e sutiã ao fazer um pedido ao marido? Sou eu”, sorri e dei mais uma voltinha.
“Acredito, mas acho que você não vai passar no teste”, sentenciou.
“Por quê?”, fiz que ia chorar, enquanto parava e inclinava o corpo para frente, na direção dele.
“Estou vendo cinema de graça.”
“De graça? Pois está saindo tão caro!", sorri e o beijei.
Dali para frente, fizemos amor. Foi tudo de bom. Tanto para mim quanto para ele. Havia muito não gozava com um cliente.
No final, pediu: “volta para casa apenas com a túnica que dei a você?”
“Curtinha, assim? Vou dar cineminha pra todo mundo.”
“Levo você de táxi.”
“Como vou saltar?”
“No seu prédio não há uma entrada de automóvel?”
“Há, sim, entro por ela quando faço compras.”
“Então? Pago mais cinqüenta.”
“Mas você devolve minha roupa? Eu a levo na bolsa.”
“Claro, por que iria querer seu vestidinho?”
“Sei lá, às vezes aparece cada um...”
“Posso fazer uma pergunta indiscreta? É mais uma fantasia”, sua voz soou baixa, humilde.
“Claro, pois faça.”
“Você já foi presa alguma vez?”
“Presa? Pela polícia?”
“Isso.”
“Não”, falei com ar de preocupação. Será que ele era da polícia e iria me prender? Para voltar ao clima anterior, acrescentei: “mas já houve um cliente que me deixou pelada na rua, de madrugada.”
“Como você fez?”
“Aí você já está querendo saber demais”, simpática, aproximei meu rosto ao seu.
“O que custa você contar?”
“Morro de vergonha. Mas vamos fazer o seguinte, você me dá o seu endereço eletrônico que eu mando por escrito.”
“Jura?”
“Juro, e eu tenho um estilo para escrever... Você vai adorar!”
O táxi parou. Entrei. O motorista, sempre discreto, já conhece meus trajetos. Jandira me havia ligado fazia trinta minutos e comunicado sobre o cliente que eu deveria atender naquela tarde.
Após rodar por toda a Presidente Vargas, o automóvel contornou a Candelária e parou no sinal com a Primeiro de Março. Alguns minutos a mais atravessamos o trecho da perimetral sobre a Praça 15. Dois ou três minutos depois eu desembarcava na Marechal Câmara, em frente ao hotel onde costumo atender a maioria dos meus clientes.
“Ei, moça”, um homem me surpreendeu quando quase já atingia a porta do hotel. Parei, automática. Mas não era quem estava agendado. Este me esperava na suíte 410.
“Ei, moça, você combina encontros pela Jandi, não?”
“Sim, mas você precisa ligar para ela, não fale comigo agora, por favor”, deixei o homem para trás e atravessei a porta.
Na suíte encontrei o cliente, como de costume.
Duas horas depois, tendo cumprido meu papel com esmero, saí do hotel, sozinha. O cliente descera um quarto de hora antes. Na calçada, porém, o mesmo homem que me abordara na chegada.
“Moça, por favor, qual o seu preço?"
“Já falei, os encontros precisam ser agendados através da Jandi, não falo sobre preços."
“Você tem um expediente, não? Que tal sair comigo por fora, pago o que eles pedem e você fica com as duas partes.”
A proposta era vantajosa, mas perigosa quando se trata de alguém desconhecido.
“Prefiro que você ligue para a Jandira, tenho o número, basta dizer que deseja ser meu cliente, ela marca pra daqui a pouquinho. Não diga que estou a seu lado.”
“Não quero nada com sua agenciadora, mas direto com você.”
Eram quartro da tarde, muitas pessoas transitavam pelo passeio, nós atrapalhávamos o caminho. Ameacei deixar o homem falando sozinho. Ao dar dois passos, ele me seguiu, fez um gesto de que ia me segurar pelo braço. Mas recuou.
“Quanto sua agenciadora pede? Quatrocentos, quinhentos?”
“Seiscentos.”
“Pago setecentos mais cem para o seu transporte de volta.”
Sua oferta me fez pensar. Setecentos não era coisa à toa. Rapidamente, falei – porque sabia que se demorasse desistiria: “temos de ir primeiro a um caixa eletrônico, você deve fazer o depósito na minha conta.”
“Ok, qual é o seu banco?”
Caminhamos até o caixa mais próximo. Havia poucas pessoas na fila, logo se deu a transferência de valores.
“Agora vamos”, me segurou por um dos braços. Entramos num táxi.
O homem fez o taxista atravessar a ponte em direção a Niterói.
“Por que tão longe?”, sussurrei, “não posso ficar com você por mais de duas horas, vão procurar por mim.”
“Ficamos o tempo que seus clientes costumam usar, não há problema.”
Descemos do táxi dentro de um motel, numa das praias de fora.
Estou acostumada a diversos tipos de homem, mas naquele momento tremi um pouco. Como através da agência nunca tive problemas, comecei a achar que agindo sozinha poderia ficar em maus lençóis, literalmente.
Logo que entramos na suíte, falou:
“Tire a roupa.”
“Mas assim, sem fantasia?”, suspirei sem graça.
“Claro que haverá fantasia.”
Tirou da pasta uma túnica exatamente igual à da moça que eu vira enquanto esperava o táxi.
“Vista”, ordenou, “mas sem nada por baixo”, viu?
Vesti a blusa.
“Suba na sua sandália alta e ande como se estivesse desfilando, você tem de fazer de tudo para que eu não note que você está sem calcinha.”
“Acho que vai ser impossível, sou muito alta e a sandália ainda me deixa maior, mas já que é a sua vontade...”
Me coloquei na posição e comecei o desfile. Reparei que ele recolheu minhas roupas, mas fingi nada ter visto. Andei de um lado a outro, passos de modelo, sorria sempre que passava por ele. Acabei gostando da brincadeira.
“Sabe a moça da propaganda, a que fica de calcinha e sutiã ao fazer um pedido ao marido? Sou eu”, sorri e dei mais uma voltinha.
“Acredito, mas acho que você não vai passar no teste”, sentenciou.
“Por quê?”, fiz que ia chorar, enquanto parava e inclinava o corpo para frente, na direção dele.
“Estou vendo cinema de graça.”
“De graça? Pois está saindo tão caro!", sorri e o beijei.
Dali para frente, fizemos amor. Foi tudo de bom. Tanto para mim quanto para ele. Havia muito não gozava com um cliente.
No final, pediu: “volta para casa apenas com a túnica que dei a você?”
“Curtinha, assim? Vou dar cineminha pra todo mundo.”
“Levo você de táxi.”
“Como vou saltar?”
“No seu prédio não há uma entrada de automóvel?”
“Há, sim, entro por ela quando faço compras.”
“Então? Pago mais cinqüenta.”
“Mas você devolve minha roupa? Eu a levo na bolsa.”
“Claro, por que iria querer seu vestidinho?”
“Sei lá, às vezes aparece cada um...”
“Posso fazer uma pergunta indiscreta? É mais uma fantasia”, sua voz soou baixa, humilde.
“Claro, pois faça.”
“Você já foi presa alguma vez?”
“Presa? Pela polícia?”
“Isso.”
“Não”, falei com ar de preocupação. Será que ele era da polícia e iria me prender? Para voltar ao clima anterior, acrescentei: “mas já houve um cliente que me deixou pelada na rua, de madrugada.”
“Como você fez?”
“Aí você já está querendo saber demais”, simpática, aproximei meu rosto ao seu.
“O que custa você contar?”
“Morro de vergonha. Mas vamos fazer o seguinte, você me dá o seu endereço eletrônico que eu mando por escrito.”
“Jura?”
“Juro, e eu tenho um estilo para escrever... Você vai adorar!”
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