Mas já no dia seguinte surgiria alguém para me fazer
acreditar que assim como Manuel Bandeira jamais foi um poeta menor, eu também
não era uma amante menor. O homem, de quase dois metros de altura, despertou-me de um enleio enquanto eu, sob o sol, nas areias da praia, era embalada por quase
um sonho, um sonho de claridade e de fundo musical orquestrado pelas pequenas
ondas da praia.
“Você não é daqui”, afirmou.
Ainda sonolenta, virei-me em sua direção, e por trás das
lentes de sol, falei:
“Quem dera, a vida toda nessa paz, nesse mar”, e me virei
para o outro lado.
“A paz também cansa”, falou e se afastou.
Esqueci-me do homem.
À noite ouvi certo alvoroço numa das casas. Parecia uma
festa. Alguém veio bater à minha porta.
“Você não quer participar de um festejo?”, era o mesmo homem
que aparecera de manhã, na praia.
“Você poderia ter a bondade de pelo menos dizer o seu
nome?”, franzi a testa após a última palavra.
Olhou-me, sério. Eu não tinha os óculos escuros para me
esconder àquela hora, e também não queria desviar os olhos.
“Enamorado, é o meu nome, mas todos me chamam de Amor.”
Dei uma gargalhada prolongada. Ele completou o meu
espalhafato com a sua risada, grave e mais contida.
“Verdade? Enamorado?”, repeti ainda tentando esconder os últimos traços de riso.
“Sim. Mais popular como Amor. Vamos?”, ofereceu-me o braço.
Aceitei.
Como o número de participantes era pequeno, o encontro podia
ser chamado de festa mais pela alegria dos presentes do que pela quantidade. Com
a minha chegada e a de Amor, completamos oito pessoas na casa. Cinco homens
e três mulheres. Ao entrar, recebi sorrisos de todos os lados.
“Você vai gostar da gente”, falou uma mulher.
Um dos rapazes expeliu a fumaça do cigarro para um dos lados
e me estendeu a mão. Os outros vieram-me beijar.
Reparei que um dos presentes tocava acordeom.
“Cheguei a aprender quando era criança”, falei.
“Quer”, ele fez o gesto de que me passaria o instrumento.
“Não, por favor, não lembro mais nada.”
“Rodolfo, toca pra gente”, uma das mulheres pediu.
Uma canção argentina começou a sair do instrumento. Em
poucos segundos quase todos estavam a dançar. Amor tomou-me por uma das mãos,
envolveu-me com seus longos braços e começamos nossos primeiros passos no
centro da sala.
Após mais ou menos uma hora, espaço de tempo em que uns
beberam cerveja e outros vinho, alguém sugeriu que nos fantasiássemos.
“Há um baú com vários trajes, no quarto dos fundos, são
objetos de teatro. Cada um pode se vestir do jeito que quiser, mas deve colocar
a máscara, assim não saberemos quem é quem.”
Todos se entusiasmaram com a sugestão. Tiramos a sorte e
fomos um a um ao tal quarto. Depois de pronto, cada um saiu pela porta lateral
que dava num corredor externo e foi aguardar o restante do grupo nas areias da
praia. Desse modo as identidades não foram reveladas.
As fantasias eram as mais engraçadas possíveis. Havia
bailarinas, palhaços, princesas, branca de neve, bruxa, dama antiga,
super-heróis e uma que era apenas um biquíni mínimo. Adivinhem quem escolheu
esta? Lógico que fui eu. Mas todos foram obrigados a vestir as máscaras, assim
nos confundiríamos e não saberíamos quem era quem.
De início não consegui descobrir Amor. Muitos vieram a me
cortejar, inclusive as mulheres. Ah, ia esquecendo, as máscaras tinham um
capuz que nos cobria os cabelos, isso tornou a identificação ainda mais difícil. Até
mesmo pelo corpo não foi tão fácil identificar as mulheres. Todos eram ótimos atores. Apenas o músico foi identificado com facilidade porque continuou a tocar no acordeom suas canções ora comoventes ora animadas.
A festa transferiu-se para as areias, com o mar a acompanhar com seu leve murmúrio o nosso alarido. Dançamos, ainda sob o som do acordeom. Algum tempo depois, cada um de uma vez tinha de fazer uma imitação para ser descoberta pelos demais.
A festa prosseguiu à beira mar com todos cantando e dançando. Mais bebida surgiu, trazida por uma mulher que não fazia parte do grupo. Era uma espécie de batida de várias frutas. Não passou muito tempo para que começássemos a nos agarrar. Mas não foi uma tentativa de formar casais. Ora recebíamos beijos que pareciam de homem, ora de mulher. Namoramos a três, a quatro e até mesmo a cinco.
A festa prosseguiu à beira mar com todos cantando e dançando. Mais bebida surgiu, trazida por uma mulher que não fazia parte do grupo. Era uma espécie de batida de várias frutas. Não passou muito tempo para que começássemos a nos agarrar. Mas não foi uma tentativa de formar casais. Ora recebíamos beijos que pareciam de homem, ora de mulher. Namoramos a três, a quatro e até mesmo a cinco.
A festa não terminou, ao menos pelo que me lembro. As duas
mulheres logo ficaram nuas. Depois de beber demais, acabei dormindo, e acho que
os outros também.
Acordei com os primeiros raios de sol. Dois ou três já
haviam se retirado, mas os outros permaneciam desmaiados sobre areia, e quase
agarrados entre si. Reparei que alguém me havia tirado a máscara e o top, mas
eu ainda vestia o biquíni de fantasia.
Levantei-me e ouvi imediatamente:
“Amor está pronto para cobri-la de beijos.”
Bocejei, minha cabeça doía. Tapei instintivamente os seios.
“Cobri-la?”, repeti enquanto respirava fundo e olhava na
direção do mar tentando-me refazer.
“Cobri-la. Gostou da erudição? Aqui todos somos clássicos, no
idioma e no teatro”, completou.
“Então, despir-me-ei”, eu disse. Soltei os seios, fiz descer o
biquininho e o larguei sobre a areia. Corri e mergulhei no mar. A água estava
quente.
Depois? Ah, depois... Cada um que use a sua imaginação.
Lembram o início? Sempre me considerei uma amante menor!
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