quinta-feira, julho 24, 2014

Queres saber quem me levou para casa?

Viste as fotos? Foram tiradas ao entardecer, ao mesmo tempo em que fazias teu filme. Eu caminhava sobre a areia da praia. Pouco gente àquela hora, pois é inverno. Embora no Rio a temperatura quase sempre seja quente, nos meses de junho, julho e agosto ela se torna mais amena. Mesmo assim muitas pessoas continuam a frequentar a praia. E o entardecer é o período ideal.  A maioria caminha pelo calçadão, ou pedala na ciclovia, por isso a areia quase deserta, e mesmo despercebida. Eu estava à beira d’água, depois caminhei até um guarda-sol solitário, onde devia pousar por alguns instantes. Na verdade, caso eu desistisse ficaria no prejuízo. Após ganhar algumas notas de cem, eu não podia fugir, não é mesmo? Meu dever era desfilar para ser filmada. Mas não se via quem empunhava a câmera, porque filmava de longe, não queria chamar a atenção. Permaneci algum tempo sentada sob o abrigo. Depois, devagarinho, tirei o top; a seguir, o biquíni. Um garoto me trouxe o pagamento, tão discreto ele, nem olhou para mim. Eu, nua, e ele com vergonha. Levantei e caminhei em direção ao calçadão. Não era meu dever pensar em nada. Melhor a mente vazia, ou a lembrança de alguma coisa distante, algo de outro lugar ou de outro tempo. Pensa sobre um livro que tenhas lido, ou mesmo sobre um filme, assim será mais fácil, aconselhou-me uma amiga. Meus passos, firmes. No começo, os óculos escuros a cobrir-me parte do rosto. Sigo como se fosse a pessoa mais séria do mundo. Vou até perto do calçadão. Faltam dez metros, talvez doze, para o calçamento. Até ali estou incógnita, longe de algum quiosque. Ainda bem, os quiosques atrapalham, sempre há alguns bebedores de cerveja, sempre há quem olhe o mar. Não seria difícil descobrirem uma mulher nua. Não demorariam a dar o alarde, chamariam outros para ver. Fazer uma descoberta e nada dizer não tem graça. Dou as costas para a avenida e volto na direção do mar. Procuro o guarda-sol, mas onde mesmo? Preciso manter a calma, fazer de conta que nem é comigo. Sei que estás ansioso, talvez me perguntes, como vais fazer agora, nua e fora de rota? Calma, tudo há de se arranjar. Li em algum lugar que as mulheres bonitas atraem boa sorte. Portanto, longe o desespero. O que há de mal na nudez? Quem sabe haverá um admirador silencioso, fará uma foto e a guardará como lembrança, mostrará a mulher nua que encontrou na praia apenas ao amigo íntimo, recordação das férias que não mais voltarão. Vou à beira d’água. O marulhar chega ao meus pés. Tenho vontade de mergulhar, de vestir a capa transparente bordada de espumas, mas estou tão sequinha, bonita, o cabelo tratado. Melhor o corpo liso, melhor a nudez. Onde um amigo? E não é que alguém vem ao meu encontro? Uma mulher. Ri. Estende a mão. Está de biquíni. Um biquíni mínimo, mas vestida. Ri mais uma vez. Você precisa de ajuda?, pergunta. Não, digo com firmeza, estou ótima. Então tá. Vira-se e se vai. E eu a céu aberto, tão nua. Logo depois que a mulher desaparece, lembro das notas de cem, as notas que me mandaste pelo garoto. Sinto então o vento frio, um arrepio (ou uma carícia?), e o desejo das tuas mãos sobre a minha pele. Aí me vem uma cosquinha, bem lá no fundo, o dinheiro dobrado no saquinho plástico, guardadinho dentro de mim. Esse eu não posso perder. Viste mesmo as fotos? O que achaste? Apareceram na internet, quase ao vivo. São três; e nas três, eu nua. Na última, estou sem os óculos de sol. Não sei se posso negar que a mulher sem o top e o biquíni em Ipanema, ao entardecer, sou eu. Queres saber como fiz depois? Ah, lembras? Mulher bonita atrai boa sorte. E que sorte! As mãos, sempre as mãos, como as tuas.

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