quarta-feira, agosto 27, 2014

Arlete perdeu a renda arrastão

A vida fora de casa é completamente outra. Foi isso que Arlete pensou às duas da madrugada, numa estradinha lateral, que margeava o quarteirão onde ficava a casa do homem com quem estava saindo. Dentro de casa há o aconchego, chegou a refletir, há a privacidade. Pode-se, sim, sentir o arrepio entre quatro paredes, a pele lisa, o sopro quente do verão vindo de uma das janelas abertas, mas ao lado fora... Ela olhou o relógio. Sim, usava um relógio. Apesar de tudo, tinha o pulso coberto. Trazia também a bolsa a tiracolo, e ia sobre uma sandália baixa. Isso era outra coisa que a preocupava. Por que não saíra de casa com uma das tantas sandálias de salto? Sempre gostava de mostrar-se elegante e, naquele momento, saltos altos ajudariam muito. Dentro de casa houvera uma brincadeira. Do mesmo modo que se portava na esquina de duas ruas desertas, também estacara numa posição sedutora, na confluência de duas paredes da sala. Mas estivera entre paredes, apenas o seu homem a se encantar. Aliás, ela também encantara-se consigo, e acontecera aquela sensação incontrolável. Lembrou-se das amigas e das festas. Eles, os homens, adoram uma brincadeira depois que bebem, elas comentavam. Eles dizem uma mulher nua é adorável, e vocês encantam, apesar de tudo. Apesar de quê?, ela agora se perguntava, pois não era mulher como as outras, como as atrizes dos filmes, da TV? Uma mulher bonita jamais fica em dificuldades, sempre haverá quem lhe estenda um manto bem cortado, um vestido de desfile, e gostará de vê-la passear destemida. Arlete sabia que não é bom mostrar-se por inteira. Existe um jeito de disfarçar algo que poderia tornar-se demais. Ereta, a bolsa, a sandália, tudo em harmonia. E já eram duas e quinze da madrugada. Quem iria levá-la? Não se preocupe, dissera ele, tudo está combinado em todos os detalhes. Mas não existe chance de algo dar errado?, ela perguntara. Você quer que algo dê errado?, respondera ele com outra pergunta. Não sei se a pessoa que vai parar e se aproximar será a do combinado, ela temia. Não é sua função levantar essas questões, você ganhou para isso, está lucrando, portanto cumpra o seu papel, a voz do homem soara uma ordem. Ela nada mais dissera. O homem a conduzira de automóvel até a confluência das duas ruas e a fizera saltar. Já passavam vinte minutos. Maria Rita. Ela, Arlete, lembrou-se de Maria Rita. Maria Rita nada temia, gostava mesmo era de dinheiro. Caso o depósito estivesse na conta, cumpria aquilo para que fora contratada. E boca fechada. Existe um jeitinho, um disfarce, algo que é do seu próprio corpo, ela, Maria Rita, afirmara, ninguém nota, e as mulheres adoram andar nuas, ainda acrescentara. Nunca nada de mal lhe acontecera, nem no dia que fora descoberta com aquele tecido vazado, que se usa em meias arrastão, tecido que lhe contornava o corpo inteiro, pernas, tronco, braços e pescoço, tudo traçado pela renda preta transparente. Maria Rita nada comentou, apenas contabilizou o ganho e dormiu tranquila, sabia que tudo se resolveria. Mas Arlete não era Maria Rita, e alguma preocupação não lhe deixava sossegada. Até que veio o táxi, parou e piscou os faróis. Por que não se aproximava?, bastaria abrir a porta e entrar. Ter que caminhar mais vinte metros... Ou o motorista queria vê-la desfilar. Isso, devia gostar de ver uma mulher desfilando. E tanto mais nua! Será que tinha certeza de que ela era uma mulher mesmo? Há muitas pessoas fofoqueiras por aí. De vestido, diria que apontava, o corte, uma inovação. Mas só a pele e tudo por um triz, ainda tendo de fazer movimentos... Ah, outra coisa, não podia transpirar. A transpiração colocaria tudo a perder. O líquido que serve como adesivo é do próprio corpo, um segredo que Maria Rita lhe revelara. Mas o líquido não pode entrar em conflito com outras secreções. Ainda havia aquela história do namorado que esfregou um creme ao redor das duas coxas de Arlete. Esse creme vai lhe provocar, e muito. E provocou, provocou uma... Não, isso não, mas neutralizou o adesivo por boas doze horas. Amanhã tenho um desfile, Arlete pensou, nada de cremes, tenho que estar perfeita, as impropriedades bem escondidas, ou disfarçadas, como sempre. Por que os homens gostam de nos colocar em perigo?, falou a si quando percebeu cintilâncias. Estrelas também tremeluzem abaixo das nuvens. Correu e entrou no táxi. Após sentar-se, sentiu umidade no acento. O creme? Arlete suspirou pela renda arrastão de Maria Rita.

sábado, agosto 23, 2014

E que incêndio!

É bom saber pensar e brigar. Não se pode ficar apenas no pensamento e no desejo. Ganhar cinco mil reais me vai ajudar muito a resolver alguns problemas. Se o que preciso comprar se pode chamar de problemas. Vi, na praia, a garota. Devia ter entre os vinte e vinte e cinco anos, quem sabe mais um pouquinho. Ela vinha com a mochila às costas e... de biquíni. Não caminhava na areia, rente à beira-mar, mas no calçadão. Ou na rua, não sei bem. Acho que era domingo e ela andava na rua. Um meio certo de arranjar namorado, caminhar de biquíni na rua. Mas será que era isso o que ela desejava? Não sei, pode ser que não. Tenho certeza de que ela ia de biquíni, calçava tênis, e a mochila às costas. Isso me deu uma tremenda ideia. Sempre há aqueles que querem sensações mais intensas, e eu conheci um desses. Um senhor agradável, simpático e generoso. Gostou de mim à primeira vista. Foi num dia desses, de céu nublado, quando se sai à tardinha em busca da última nesga de claridade e do sopro fresco que vem do mar. Parei num quiosque, na orla de Copacabana. Queria água mineral. Ele já estava lá, vestia calça comprida, uma camisa com a bandeirinha da França no peito e sorria. À mesa, um coco; já havia terminado de saborear a água. Sente aqui. O convite, dele. Aceitei, sentei e tomei toda a garrafinha de água mineral. Conversamos. Uma conversa vazia, dessas que se estabelecem entre duas pessoas recém-conhecidas. Depois que fui embora, esqueci-me do homem. Mas já no dia seguinte o encontrei de novo. Dessa vez, de bermuda, mais informal. E o encontrei também no domingo. Foi nesse dia que vi a moça de biquíni e mochila às costas. Ele me convidou ao cinema. Vamos ver um filme logo mais, pode ser um besteirol, apenas para espairecer. E lá fomos. Gentil o homem, pagou o cinema, o lanche. O filme? Não importa. Como ele dissera, um besteirol. Ficou com o meu número. Não custou a me convidar para jantar. À noite as coisas são mais sérias. Não sei de quem a frase. Mas o homem seguiu-a à risca. Levou-me a uma cantina, ali na Fernando Mendes. Boa a comida. Tomamos vinho. Escolhido por ele. Tudo sob medida. Depois de tanto, o que me restava? Acabei no seu apartamento. Bonito, o homem, para quem já passa dos sessenta; um bom amante, apesar dos sessenta. Nada comentamos sobre nossas diferenças, incluindo aí a idade. No final, o homem perguntou se eu tinha conta em algum banco. Sabe como é, vivo sozinho, não se sabe o dia de amanhã. Sorri. Voltei a casa, enlevada. Ganhara eu na loteria? Seria verdade o que eu ouvira, ou ele mentia? Na semana seguinte, deixei por escrito o número de uma conta de poupança que havia muito esquecida. Até fora ao banco para saber se ainda existia. Sim. Existia. E o banco estava pronto para acolher a parte do seu lucro. O homem depositou. Numa primeira vez, um dinheirinho. Passaram-se alguns dias, dobrou (ou triplicou?) a quantia. Apareceram dois mil. Não sou mercenária. Não arranjo namorado para ganhar dinheiro. Mas já que surgiu, aproveitemos... E o homem é um conquistador nato. Fala como se sonhasse, e logo o sonho torna-se realidade. Outro dia contou sobre umas fantasias, coisas que a princípio pensei que viu no cinema. Depois, porém, achei que ele mesmo pudesse ter inventado. Então, como sou sempre presenteada, não posso deixar escapar o homem. E acho que agora até mesmo o amo. Não há quem não ame uma bolsa plena de notas de cem acompanhada de um sorriso lisonjeiro. Não é minha a frase, mas de uma diarista, e acho que não falou com essas palavras. Mas a ideia é a mesma. E volto às fantasias do homem. Primeiro, amarrou-me nua a uma cadeira. Amarrada e com a boca lacrada por um largo esparadrapo. No dia que se seguiu, dois e quinhentos a mais na minha conta. E muitos beijos, carícias, e nada de ejaculação precoce (ele sabe namorar). Hoje, talvez mais do que amarrada, ou muito solta, não sei bem, eis-me nua, a bater à sua porta. A condição para ganhar os cinco mil: preciso estar nua por inteiro, batendo à sua porta. Não só vir e bater. Tenho de partir também nua. Então, o plano. A tal moça de biquíni com a mochila às costas. Eu, nua, com a mochila às costas. Agora, falta-me o desfecho. Escondê-la, a mochila. Nua, entro; nua, amo-o; nua, vou-me. E a mochila... Ah, a caixa de incêndio. E que incêndio!

segunda-feira, agosto 18, 2014

Pergunta de adolescente

Você ainda com essas perguntas de adolescente, ele disse. Eu estava de pé, em frente à sua porta. Olhei para o homem, com ligeiro sorriso. Ele me observava, embora não se voltasse direto ao meu corpo. A pergunta era se queria ir comigo à festa de uma amiga. Pergunta de adolescente? Não devia convidá-lo, refleti, com tanta gente querendo a minha companhia. Ele tem vinte anos a mais do que eu e a festa, segundo o entendimento dele, era para jovens. Sua presença destoaria da maior parte das pessoas. Ainda tentei explicar que também haveria gente mais velha, mais madura, quero dizer. Provavelmente são os pais de algumas das meninas, completou. Entre, convidou-me e abriu um pouco mais a porta. Vamos conversar um pouco, acrescentou. Na verdade, ele temia que algum vizinho me descobrisse à porta. Eu vestia apenas uma camiseta, que me descia até as coxas.

Esse vizinho já de alguns meses conversa comigo sobre livros. É só me ver lendo alguma coisa que começa a relatar os autores que admira. Em alguns pontos, o homem acha que sou muito madura; em outros, diz que me comporto ainda como adolescente, sobretudo quando o convido para alguma saída noturna. Certa vez chamei-o para ver Thor, o último filme escrito a partir de uma história em quadrinhos. Mas esse tipo de filme é para adolescentes, afirmou. Quis contra-argumentar, o que tem ser um filme para adolescentes?, se a gente gosta... Mas o meu vizinho não gosta de se ver rodeado por moças e rapazes, colegiais, como ele diz. Fui ao cinema sozinha. Arranjei um admirador com quem acabei ficando mais de duas semanas. E rolou bons momentos. Mas meu vizinho me veio oferecer Em busca do tempo perdido.

Li o primeiro volume. Dias depois bati à sua porta com a intenção de conversar sobre o livro. Ficamos duas horas discutindo. Ele falava e olhava para as minhas pernas. No final, ofereceu o segundo volume.

Na semana seguinte fui eu que me ofereci a ele. Com o pretexto de continuar conversando sobre Proust, voltei ao apartamento. Não passou muito tempo e eu já estava nos braços do homem. Quando acabamos, não me vesti. Sentei pelada no sofá e continuei a conversa, com a maior naturalidade. Esse Swann não era muito esperto, ressaltei, fazer tanto por uma mulher e, apesar de ela ser uma prostituta, ele a tratava como uma dama de respeito. Meu vizinho contestou, não se tratava de considerá-la prostituta, eram os costumes da época, e em meio à nobreza ainda remanescente era assim que se vivia. Tudo bem, rebati ainda sentadinha e de pernas cruzadas, mas acho que havia outras mulheres, ele não precisava ter se submetido tanto. O homem ofereceu-me um refrigerante. Aceitei. Depois trouxe um doce, sobremesa feita pela diarista durante à tarde. Comi de bom grado. No final, levantei-me, beijei-o em sinal de despedida, abri a porta e saí. Ei, espere, falou. Mas eu já entrava na porta em frente, a porta do meu apartamento. Lancei-lhe mais um beijinho e fechei.

No dia seguinte, à mesma hora, dez da noite, bati de novo à sua porta. Você?, pareceu surpreso, já acabou o livro?. Não, não vim falar sobre livros, acho que esqueci alguma coisa aqui ontem, não? Ele foi lá dentro buscar minha camiseta. Você ainda está agindo como uma adolescente, falou ao devolvê-la. Vai dizer que não gostou? retruquei baixinho e sorri fingindo inocência. Percebi, então, que ele tinha companhia. Não demorou a fechar a porta.

quinta-feira, agosto 14, 2014

Você gosta de fantasia

Você gosta de fantasia, não é mesmo? Mas venha devagar, vamos nos concentrar, poucos os movimentos, ou mesmo nenhum, apenas você pulsando dentro de mim. Isso, assim, vou por cima, sento, que tal nós dois paradinhos?, eu mordisco; você me infla, ok? Ouça. Lembra a brincadeira. Você me quis pelada lá fora, na estrada. Avisei. Se ele me encontra vai ser um banquete, ó, não escapo, você vai dançar, pois o homem é tarado por mim. Ele sempre me olhou de soslaio e, imagine, quando eu dava as costas ele me comia com os olhos. Era por causa da minha bunda. Isso, você está pulsando direitinho, e eu, mordiscando, apenas esses movimentos sutis, vamos tentar gozar assim; quanto mais demorarmos, tanto melhor. Escuta. Então, ele me encontrou. A tal brincadeira; eu, pelada dentro da noite. Tentei me esconder, mas ele me viu. Vinha dirigindo o primeiro carro da madrugada. Acho que demorei a me abaixar. O homem reparou o vulto, freou e desceu para conferir. Se fosse um ladrão?, perguntei depois; era um vulto de mulher, afirmou. Mulher também pode ser perigosa, rebati. Ele disse estou acostumado. Eu, na frente dele, na lateral do carro, a blusa tão curtinha, do umbigo pra baixo tudo de fora, ideia tua, lembra?, levaste o restante contigo, e demoraste, não foi?, o homem ali, me comendo com os olhos. O que houve?, ele quis saber. Não é momento pra perguntas, eu contradisse. Como você vai fazer pra voltar pra casa assim, nua?, ele. Será que penso em voltar?, respondi.  Você está pelada para mim?, o tal motorista duvidava. Quem sabe, retruquei. Mas ele não sabe pulsar, assim como você. Quanto a mim, nem tempo tive de mordiscar. O homem era bruto, quero dizer, é bruto. Me segurou pelos ombros, foi descendo as mãos, e ainda me deixou sem a pequena blusa. Lançou minha única roupa mato adentro, para além do acostamento da rodovia. Como me apertou. Espera, não deve ser assim, falei. Não tenho muito tempo, estou a trabalho, ele disse, e logo vão notar o veículo no acostamento, vão querer saber o que aconteceu, tenho hora, na empresa tudo é cronometrado. Mas não estou aqui pra isso, ressaltei. Como, não? Você aparece nua na minha frente e agora vai fugir, insistiu. Quem sabe, posso estar aqui apenas para provocar, lancei a questão. Eu queria ganhar tempo. Provocar?, duvidou, uma mulher nua além de provocar quer algo mais, finalizou. Então colocou o pênis fora da calça. Eu quis me livrar, mas ele me segurava com força. Você está acostumado a estuprar as mulheres, insinuei. Estuprar?, a palavra fez que enfraquecesse a força das mãos. Confesso que eu podia ter corrido, escapado, mas estava tão nua. Isso não é estupro, tentou se convencer, você sempre se mostrou pra mim, me deu confiança, me deu até esperança de um encontro, e não esqueça que apareceu nua em frente ao local onde sempre passo às cinco da manhã, todas essas suas ações não aconteceram por acaso, argumentou. Trata-se de uma brincadeira, falei, brincadeira do namorado, ele me deixou aqui nua mas volta para me pegar, eu disse cerimoniosa. Brincadeira?, não se brinca com essas coisas, falou alarmado, não é possível que você tenha um namorado que te deixa nua por aí. Mas fui eu que dei a ideia, falei, tentava salvar a situação, não queria que ele pensasse mal de você. Se foi tua a ideia, continuou com a argumentação, é porque pensava em mim, queria que eu te encontrasse. Será?, sorri depois da interrogação. Lógico que sim, acrescentou, já tive várias namoradas, e muitas agiram como você; a mais recente vivia no carro atrás de mim, não saltava, esperava eu deixar o último passageiro pra ir comigo até a garagem; no caminho eu enfiava o carro num desses cantos da estrada e tirava a minissaia que ela usava pra me provocar, o pano  não media um palmo, a pele já estava toda arrepiada, ela não demorava a se derramar em gozo. Ele, então, me apertou com força, puxou meu corpo pra junto do seu, senti seu pênis entre minhas pernas. Espere, pedi, me leve pra dentro do carro. Você quer no carro, repetiu, ok, vamos pro carro. Entramos, me deitou num dos bancos, o carro todo escuro, assim como a noite. Aí aconteceu. Foi tudo muito rápido, ele não demorou a gozar. Quanto a mim, saiba, homens desse tipo não esperam pela mulher, não são como você, que agora pulsa dentro de mim com mais intensidade enquanto te mordisco com a vagina, enquanto conto toda a história. Vamos gozar os dois, juntos. Vamos explodir. E sei que você não vai me levar a mal por ter estado nas mãos de outro, ou melhor, por ter dado pra outro. Você ainda quer que eu conte mais? Ele me deixou nua na estrada, disse que tinha de ir, não podia se arriscar a perder o emprego, de modo algum. Pediu que eu esperasse. Ligaria a um amigo, que me traria roupas. Falei que podia ir, que não se preocupasse. Sei me virar sozinha, afirmei segura. Sabe?, ainda ironizou. Então, partiu. Não sei se chamou alguém pelo telefone. Aí você chegou, e me levou nua no carro, e já a manhã se anunciava. Gostou, não é mesmo?, está até a sentir maior o tesão! Agora goza, vai, despeja tudo dentro de mim, mas paradinho, viu, assim como eu, e aproveita, já estou soltinha...

quinta-feira, agosto 07, 2014

Você está tomando o momento de alegria

Você está tomando o momento de alegria, ele disse, e que alegria!

Você acha mesmo?, perguntei, quem sabe, o meu forte é representar.

Ajeitei a blusa, que me vinha até o umbigo. Verifiquei a bolsa. Virei para a direita, depois para a esquerda, sorri mais uma vez. Estou tomando o momento de alegria, repeti.


Eu chegara à casa dele às 7 da noite. Fazia calor, era verão, tudo parecia transbordar, inclusive o nosso ardor. Ele me abraçou e me beijou. Olhou a minissaia que eu vestia. Sorriu.

Você está linda!, fez um longo gesto, como seu eu fosse uma rainha.

Dei uns passinhos e me sentei na poltrona. Cruzei as pernas e esperei por ele.

A casa estava arrumada, a janela aberta mostrava o mar ao longe. Havia uma mesinha logo depois da poltrona e sobre ela um livro. Peguei-o e comecei a folheá-lo. Era um romance de uma escritora americana.

Lendo romances, afirmei voltando os olhos a ele.

É para aprender a lidar com vários tipos de situações amorosas.

Como a nossa, suspirei.

Isso, como a nossa.

Você está achando difícil?

Não, é um livro fácil.

Não falo do livro, mas da nossa relação.

Difícil, não, diferente.

Ele ficou parado junto ao braço da poltrona. Eu ainda segurava o livro.

Lembrei que na praia ele às vezes ficava envergonhado, acho que temia encontrar alguém que o visse ao meu lado.

Lembra a praia?, deixei escapar.

O que tem a praia?

Você sempre parece assustado. Já pensou, pode aparecer um amigo seu, e você ao lado de um ou melhor, de uma... como devo dizer?

Nada disso, não concordo, até gostei, sabe; você é corajosa, anda quase nua.

Nua?, você não sabe o que é andar nua.

Então, já que é você quem sabe, vou deixar você nua hoje...

Vai?, perguntei e me encolhi na poltrona, fiz de conta que procurava uma proteção, mas sabia inexistente.

Vou!, fingia ser um lobo mal, abriu a boca como se fosse me comer inteira.

Veja, mostrei a ele. Curta, a saia, não?

Já tinha reparado. Como você consegue?

Ah, isso é o que todos desejam saber. Acho que por isso é que me namoram.

Todos descobrem que você vem apenas com essa sainha sobre a pele?

Quase todos.

E o que eles fazem?

Querem me roubar a saia, afirmei e sorri.

Sério?, você acabou de me dar uma ótima ideia.

Se isso satisfaz você, tudo bem.

Ele me abraçou, e não demorou a me deixar nua.


No final, alta a madrugada, falou: vou fazer o que prometi.

O quê?, fiz-me de esquecida.

Você, nua...

Ri, num ligeiro arrepio. Vai sair um pouco mais caro, retruquei.

Não ligo, pago.

E como vou esconder?

Ah, acho que você é muito boa nisso.


Desci no elevador de serviço. Lá embaixo, o táxi.

Moço, não repare, estendi-lhe a princípio uma nota de cem, estou tomando o momento de alegria; o resto, resolvemos no caminho.