Todas temos um caso do vestido. Não se trata de amor
furtivo, ou mesmo de romance às escondidas com homem casado. Mas caso de vestido
mesmo, comprido ou curto, no corpo ou fora dele. Até Drummond teve o seu. No
caso de nosso poeta maior, fato narrado por ele em poema. Mas o meu caso de
vestido é mais simples, e ocorreu às custas de um admirador que veio de longe à
minha cidade só para me namorar. Foi num sábado à noite, inverno em
BH, apesar de final de junho nem tão frio. O namoradinho me pediu que saísse de
vestido. Apenas isso? Claro que não. Ele queria algo mais, ou algo de menos.
Todos compreenderam, não? Na verdade o seu desejo era apenas o vestido a me roçar a
pele. Vesti então um de tecido grosso, abotoado à frente. Os botões, dourados e convidativos ao despropósito, envolviam-me numa nebulosa de sensualidade. E lá fui eu e o rapaz a passear
pela noite, a parar em um ou dois bares e beber uma taça de vinho, ou mesmo uma
cerveja, não lembro ao certo. Depois de deixarmos o último bar, voltávamos ao
meu apartamento. Uma praça, no entanto, interpôs-se a nosso caminho. Duvida cruel: atravessá-la ou contorná-la? Acabamos escolhendo a
primeira opção. Caminhamos entre árvores, canteiros, parquinho infantil e bancos. De repente, o namoradinho
parou e abraçou-me. Confesso que o abraço provocou-me, ligeiro arrepio
percorreu-me o tronco. E, quando menos eu esperava, ele pôs-se a
desabotoar-me. Será que não vês que é inverno, posso contrair uma doença,
afirmei lícita. Mas era tal a artimanha do namorado e tal a minha sensação de
gozo que acabei por permitir. Não passou muito tempo para eu estar nua à
meia-noite e meia na tal praça, ao ar livre e sob o calor de tantas mãos que disputavam todas as partes do meu corpo. Não pude
sentir frio. Temos um apartamento aconchegante, alertei, não é possível que
queiras fazer sexo comigo em meio à noite aberta. Mas o jovem mostrava-se
impetuoso. Disse que não havia problema, pois seu apetite era suficiente para
dois jantares, um ali, o outro no meu
apartamento. Confesso que foi boa a refrega. Entreguei-me a um homem pela
primeira vez em meio a uma praça, em BH. Nem mesmo em minha cidade de origem,
quando ainda namorava às escondidas, despi-me entre árvores. Portanto, ia eu nua, em
plena capital de Minas. No final, quando já nos preparávamos para abandonar a
praça que nos servira tão bem ao amor, confessei, queria que encontrássemos um
buraco. Um buraco?, assustou-se. Isso mesmo, assegurei, um buraco. Mas
não te foi suficiente a praça? Foi, mas preferia um vão, uma abertura entre
dois galpões, ou mesmo um nicho entre sobrados, estaria mais exposta; tanto
maior o perigo, pleno o gozo. Pleno o gozo?, ele repetiu. Isso mesmo, eu disse.
Não queria te dizer, mas ainda estás nua, não reparaste?, ele apontou o meu
corpo. Eu, nua?, fingi surpreender-me, e agora, o que faremos?,
acrescentei. Não sei, foi a resposta
dele, a cidade é tua, conheces todos os vãos e desvãos, deves conhecer um que nos leve ao teu vestido! Só então reparei que ele falava sério. Meu
vestido?, onde? Ora, o teu vestido, repetiu mais uma vez, onde? Estava num galho de árvores, mas qual? são tantos... Recordei, para acalmar o namorado (ele parecia mais alarmado do que eu) uma amiga também mineirinha, mas de Muriaé. Ela é maluquinha, adora sair de madrugada, quando perde o sono, a dirigir pelada. Não tiveste medo de que te acontecesse algum imprevisto, perguntei-lhe, um pneu furado, ou outro qualquer enguiço, quem sabe o surgimento inesperado de um policial? Imprevistos podem acontecer, e não digo que tenha me livrado de todos, respondeu-me, um deles me foi até bom, e tão gostoso... Minha amiga mineirinha adora os homens, quer gozar com todos. Ela é que está certa. Amanhã te compro outra roupa, cortou-me a narrativa o namorado. Amanhã?,
retorqui, precisas comprar hoje, como subo dezoito andares nua? Ainda é noite e, apesar de curto,
empresto-te o casaco, ofereceu-me. Não, nada de casaco, toca-me mais uma vez, vai, faze aqui mesmo a tua segunda janta, vem que já faço a minha terceira, depois tomamos uma decisão; conto-te um segredo, tenho a sorte da mineirinha.
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