quarta-feira, fevereiro 18, 2015

Chá de cadeira

Estava na cafeteria, na Rainha Elizabeth, havia pedido um expresso e um croissant, quando apareceu a Hellen.

"Oi, que bom encontrar você, posso sentar aqui?", perguntou e sentou antes de eu responder.

"Oi, tudo bem?, que bom te ver", tentei ser simpática.

“Quer dizer que ele te deu um tremendo chá de cadeira?”, perguntou, ardilosa.

“Chá de cadeira?”, fiz de conta que não entendi.

“É porque ele é muito assediado. Você precisa ver, todas as mulheres vão atrás dele.”

Engoli a seco e comecei a pensar no perigo que eu corria.

O namorado quase me caíra do céu. Tinha um escritório no mesmo prédio onde trabalho com moda. Sempre me cumprimenta e faz olhos compridos às roupas que uso.

“Você tem bom gosto”, óbvia, a opinião dele.

Como Helen soube do chá de cadeira?, pensei.

“Ele usa uma pasta larga, não é mesmo?”, ela continuou. “Não sei o que leva lá dentro, mas é grande para um advogado.”

Gelei. Será que ela sabia? Como?

“Oi, meu amor, que bom você ter vindo, tenho um tempinho”, ele levantara e viera me beijar. O escritório de um bom gosto incrível. E há um divã.

“Pra que o divã?”, cheguei a perguntar à primeira vez.

Ele apenas sorriu. Não demorei a entender.

“Dizem que ele dá muitos presentes a todas as namoradas”, Helen afirmou eufórica.

“Você já o namorou?”, demonstrei ciúme e curiosidade.

“Quem dera, nunca tive tamanha sorte”, suas palavras revelavam certo ar de frustração.

Ao dizer que tinha um tempinho, eu já entendia o que ele desejava. Me levantava, girava meu corpo no ar e depois me deitava no divã. Num desses dias de namoro fez a proposta.

“Você espera por mim?, não demoro. Assim, quando estiver de volta faço mais carinho em você.”

“Espero na minha sala”, sugeri.

“Não, por favor, fique esperando aqui.”

“Tenho também de trabalhar.”

“Você trabalha pelo telefone, pois ligue daqui.”

“Ok”, acabei cedendo.

“Quero ter certeza de que você não vai embora”, acrescentou.

“Não vou, prometo.”

“Levo seu vestido. Assim você não vai poder sair.”

“Meu vestido?”, chegue a suar ao ouvir a proposta. “Quer dizer que vou ficar pelada, aqui?”

“Isso, o que há de mais?”

“E se você não volta?”

“Você acha que vou abandonar meu escritório?”, ele riu, como se fosse algo mais absurdo do mundo. “Trata-se apenas de um jogo.”

“Não sei, isso parece brincadeira de criança”, retruquei.

“É bom ser criança em alguns momentos, não?”

“Não sei. Lutei tanto para amadurecer.”

“Ok, então vá a sua sala. Foi apenas uma proposta indecente. Ah, lembra a pulseira?, encontrei o ourives. Encomendei uma pra você”, sorriu no fim da frase e veio me beijar.

“Ok, doutor”, falei com ironia, “pode levar meu vestido. Eu espero.”

Ele se foi todo feliz. Resolvi tudo que tinha de resolver, pelo telefone. Meus clientes jamais saberão que, apesar de trabalhar com moda, liguei para eles inteiramente nua. Meu namorado? Demorou quase três horas para voltar. Me deu um tremendo chá de cadeira! Mas a pulseirinha, que linda...

Veio a garçonete com o meu expresso e o croissant; perguntou a Hellen o que desejava. Mas ela estava interessada na minha vida mais do que eu. Oh, pensei, por que nada pode ser perfeito?

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