Sentem-se na pele alguns respingos do mar, eu tão
arrepiada, é noite. O prazer do sal ilumina-me as narinas, meu corpo geme um arrepio comprido. Corro à beira d'água, tão próxima, envolta no abraço de meu próprio corpo.
Talvez algum morador antigo, acostumado a poucas luzes da vila consiga vislumbrar minha silhueta. Arrisco-me. Não quero a roupa úmida, mareada de oceano. Melhor a pele apenas, o corpo a suspirar saraivada de
gotículas. Experimento o gozo que vem do mar. Minha a amiga a correr a orla, a saciar o desejo nu do namorado. Eu não chamo namorados. Flerto com o céu, com as perigosas águas marinhas... Talvez alguém me espreite ao longe, namore uma improvável imagem,
fantasma de mulher a surpreender desavisados. A noite é longa, deito-me
à borda de um barco que descansa sobre dois cavaletes, um barco que mostra quão impossível é o navegar; o madeiro talvez me levasse a mediterrâneos desconhecidos, Ulisses às avessas, rainha de uma ilha fora do mar. Houve numa das noites, acho que a primeira da estada, uma menina a
espreitar-me, queria meus segredos, sob a luz azul da lua pisou sobre meus pés de areia, um modo de arranjar caminhos seus. Disse que não o fizesse, pois os anos marcam todos os corpos, e ela teria os seus. Ninguém segue rastros impunemente.
Os homens da vila têm namoradas que os acompanham no automóvel. Vão nuas as namoradas. Não calculam o comprimento da saia, vão nuas de coxas, de pernas volumosas, e ainda gostam de beber cerveja. Os homens da vila não enxergam estrangeiras, apenas granjeiras que ciscam em terreiro próprio, interminável o carcarejo. Vamos em pele também nós, as estrangeiras. Eles não trepam em línguas que não dominam. Ou melhor, nem reparam que há outras línguas. Jogam os homens, um jogo de azar, um jogo de acasos. Estiro minhas pernas, a malha a fazer-se corpo; os braços estirados; soltam-me dois seios rijos. Onde a blusa que me tingia a pele? Posso voltar nua à pousada? Deito sobre as areias, não espero príncipes. Eles não desembarcam, trancam-se em seus castelos. E eu tão casta. E nenhum castiçal a iluminar-me a face.
Os homens da vila têm namoradas que os acompanham no automóvel. Vão nuas as namoradas. Não calculam o comprimento da saia, vão nuas de coxas, de pernas volumosas, e ainda gostam de beber cerveja. Os homens da vila não enxergam estrangeiras, apenas granjeiras que ciscam em terreiro próprio, interminável o carcarejo. Vamos em pele também nós, as estrangeiras. Eles não trepam em línguas que não dominam. Ou melhor, nem reparam que há outras línguas. Jogam os homens, um jogo de azar, um jogo de acasos. Estiro minhas pernas, a malha a fazer-se corpo; os braços estirados; soltam-me dois seios rijos. Onde a blusa que me tingia a pele? Posso voltar nua à pousada? Deito sobre as areias, não espero príncipes. Eles não desembarcam, trancam-se em seus castelos. E eu tão casta. E nenhum castiçal a iluminar-me a face.
Não queria companhia naquela sexta-feira. Toda a cidade reunia-se nos bares. Eu me queria sozinha. Namorada à flor da pele, casada consigo mesma, lua interminável de mel. Caminhei até a orla, longe as vistas ébrias, os homens que querem as mulher duas horas. Peno adentrar o mar. Mar misterioso. Leva minha nudez às escondidas. Minha amiga mergulhava nua para o namorado. Ela, fingida, abandonada, envolta nas sombras escondidas da lua. Nada a esconder, falo de mim. Quero torta a madrugada, como meus cabelos despenteados. Longe dos homens, longe eles de mim. Certa vez abracei-me, apertei-me aos seios. Sufoquei-me. Senti então minhas mãos frias, gastas de desejos, os calos a arranhar-me a pele. Amei-me, e não às escondidas. Suguei meu corpo, embora não alcançasse outros orifícios além da própria boca. E como era doce meu suor. Jamais gostei de doces, salgava a carne quando menina, e a carne era meu corpo.
Do mar sem ondas rema aparente calmaria. O luar em prata derrama-se sobre o espelho. É noite, quero dançar num vão entre os hotéis. agora há um namorado a
espreitar-me; aliás, dois, o segundo hospeda-se com mulher e filhos, logo
descobre que não amou outra tanto quanto ama a mim. Sou carrossel a girar, presa pelos cabelos, quatro mãos a disputar-me. Dois passos e volto-me à praia. São de ondas o outro carrossel. Se entro no mar? Não sei. Sei que estou sempre a amar,
sei que sou interminável mar onde alguns batéis não são capazes de navegar. Perco minhas roupas e ninguém a esperar-me.
Um automóvel na areia. Descobre-se tão fácil a sereia que deita ao amor. Oh, talvez um farol ao largo evite o naufrágio. Mas a
sereia ainda é peixe, espera a transformação. Não venhas agora, quero ainda demorar-me sobre
o dorso de um cavalo-marinho. Queres a mim ou deita-te com minha metade? Dou-te a
outra metade, mas não alardeie o troféu. E depois arranja um jeito a mim. Sem o mar serei sempre estrangeira. Quero
gozar sã e salva. Disfarça a morte o gozo da mulher de bordel.
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