O ex-namoradinho, muito engraçado, gostava de histórias
picantes. Telefonou pra perguntar como estou passando. No final, antes de se
despedir, disse que qualquer dia desses vem aqui à minha cidade me roubar a
calcinha. Até que namorar com ele foi bom, mas não sei por que terminamos; o
motivo, acho eu, foi o excesso de trabalho. Isso mesmo, quando se trabalha
demais não se tem tempo pra mais nada, a não ser descansar, dormir, acordar
tarde nos dias de folga. A habilidade do
homem em me roubar calcinhas era verdadeira, me surrupiou até mesmo um
biquíni, e eu estava na praia da Joana. No entanto, não demorava a me encher de
presentes, tantas coisas, pequenos quadros, enfeites para mesa de centro,
azulejos pintados, pratos comemorativos (vejam que gosto!), cordões, pulseiras e,
é lógico, calcinhas. Eu, safada que só, adorava o homem. Que ele venha um dia
desses, tudo bem, a aventura será estimulante.
Duas ruas além de onde moro, há um senhor que vive sozinho.
Faz pouco tempo, porém, descobri que ele é casado, a esposa não mora aqui na
cidade, mas com a filha em Rio das Ostras. Toda vez que passo diante da casa
dele, sinto seus olhos espichados a me acompanhar os passos. Outro dia o tal
senhor me chamou. Como nossa cidade não é das maiores, é um lugar onde as
pessoas costumam se cumprimentar, parei e esperei que ele desse o recado. Veio com uma história exótica, mas não demorei a perceber que era uma cantada, e muito original. Quando dei por mim, estava enredada nas suas palavras. Com uma fisionomia séria,
ele contou sobre sua vida sexual. Eu deveria ficar surpresa, pois o homem
apenas me cumprimentava e, de repente, me para na rua para falar de suas trepadas.
Teve alguma sutileza, mas foi completamente compreensível que ele me convidava.
“Tenho namorado”, afirmei falsamente.
“Não faz mal”, contrapôs, “quem tem um pode ter dois, e vai
lucrar mais.”
Aqui entra a parte dele.
“Você vai ganhar muitos presentes, caso aceite a minha
companhia. Esta não será todos os dias, prometo, uma ou duas vezes na semana. E
lhe asseguro que ninguém saberá.”
Pelas palavras, o homem parecia um erudito. Fez um recurso
sobre a razão naturalista, pode-se dizer assim. Seu discurso não levava em
consideração razões morais.
Com educação, escutei suas palavras. O homem prometia
dinheiro, vantagens, presentes. Caso eu assim o desejasse, poderia aproveitar.
“Namoro por sentimento”, disse eu secamente.
“O sentimento está na beleza, na riqueza, na oportunidade de
aproveitar a vida, pense nisso, não precisa me responder hoje”, agradeceu minha
atenção.
“A senhorita é muito afável”, disse antes de eu ir embora.
Naquela semana evitei a rua onde morava todas as vezes que
tive de sair e meu caminho era aquela direção. Preferia seguir por uma
transversal e dobrar a terceira, uma rua depois da dele. Contei o assunto pra
um amigo com quem eu saía vez ou outra. Eu e esse amigo transávamos, mas não
éramos namorados nem tínhamos pretensões futuras, apenas aproveitávamos o
momento. Ele achou a história engraçada.
“Na certa é um homem carente, que procura comprar uma mulher
com dinheiro, caso você dê margem de manobra ele não vai desistir”, chegou a me
falar. Ri e rolamos na cama, no último momento eu ia por cima.
O senhor mandou um presente. Não queria aceitá-lo, mas achei
que não deveria recusar, não gosto de ser indelicada. Abri e me assustei. Uma
pulseira dourada. Corri a uma loja de joias pra me certificar. O joalheiro me
assegurou: é ouro, e dos bons. Aceitar o presente seria concordar com o convite
e com as propostas do homem. Fui à sua casa, bati à porta que antecedia o
jardim. Ele veio atender. Agradeceu minha visita e insistiu que eu entrasse.
“Tenho pouco tempo”, aleguei, “uma consulta médica.”
Mesmo assim aceitei. Entrei. Ele me trouxe um café.
“O senhor já sabe o motivo da minha visita, não é mesmo?”
“Oh, imagino”, ele sorriu. “Tenho mais uma coisa pra você.”
Levantou-se e correu a um cômodo além da sala. Voltou em
alguns segundos trazendo numa das mãos uma caixinha de camurça.
“Veja, é o complemento da pulseira, estava esperando você
para completar o presente.”
Ele deixou que o cordão se desenrolasse e trouxe até junto
de mim.
“Mas...”, tentei dizer.
“É ouro verdadeiro, não é daqui do nosso país.”
Era um cordão comprido, a corrente, grossa, devia valer uma
fortuna, ainda havia uma medalha que não consegui distinguir o motivo, de tão
nervosa que estava.
“Não posso aceitar”, falei um tanto desolada.
“Não diga isso”, sorri, um sorriso triste e compreensivo,
“no começo as pessoas se surpreendem, é assim mesmo.”
“O senhor já presenteou outras pessoas?”, curiosa, olhei com
ar de desafio.
“Sim, é comum eu oferecer presentes, e, assim como você não
são todas que aceitam”, acrescentou.
Deixei a pulseira com ele e não aceitei o cordão. O homem
não insistiu, pareceu compreender minha vontade.
Parti com um pouco de remorso. Meu coração bateu um pouquinho mas forte. Quem sabe eu já estava criando um sentimento por ele. Além disso, eu estava precisando de
dinheiro e aqueles presentes resolveriam todos os meus problemas. Mas existe
uma coisa chamada liberdade, e ela eu não queria perdê-la. Se eu pudesse receber os presentes e continuar livre... Mas pra frente, talvez, a gente poderia conversar.
Eu vestia tênis, calça legging, um camisão que descia até as
coxas, por baixo uma faixa de lycra que me segurava os seios (na verdade um
top), meu cabelo pintado todo de preto balançava ao sabor do vento. Era noite e
eu estava na ponta da praia. Olhei o relógio e me perguntei se ele viria.
Passavam, vagaroso, os veículos. Os bares e restaurantes estavam cheios.
Um automóvel trafegava lento. De repente, parou ao meu lado. O vidro
desceu e alguém me chamou lá de dentro. Era quem eu esperava. Abriu a porta e
me convidou a entrar. Assim que entrei e fechei a porta, o barulho externo
tornou-se distante, uma fantasmagoria. Ele aproximou o corpo e me beijou.
“Não falei que viria?”, sorriu e me beijou mais uma vez, "vim
roubar sua calcinha", brincou, quem sabe.
Abracei com força seu corpo.
Abracei com força seu corpo.
“Vamos, pode fazer de mim o que quiser”, estava eu eufórica.
“Trouxe um biquíni que é uma coisinha à toa”, acrescentei em tom divertido.
Ele deu a partida. Dali em diante, foi o paraíso.
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