Lembro uma amiga distante, de outra cidade, onde trabalhei.
Ela trepava com o namorado às onze da manhã, morava num terceiro andar. Ele
mostrava que era possível serem vistos de outras casas, dos terraços vizinhos.
As pessoas têm mais o que fazer, ela dizia, cheia de tesão.
Na sala, de novo, o canapé. Arrepio. Bom andar nua. Bom
também o namorado, ótimo quando senta no canto da cama, com o peru duro que só,
e pede vem cavalgar, vem. Aproximo-me,
vamos devagar, será que vai doer?, brinco. Ele passa a mão nos meus grandes
lábios, ainda estão secos, repara. Calma, dois minutos e tudo será goiabada com
catupiry. Ele ri. Ri e me come. Uma vara que não esmorece. O homem me ama, sou
morena, ou negra, não sei, sei que me ama.
Sozinha, no canapé, lembranças me deixam no arrepio. Não
preciso me tocar, pego um livro, abro e começo a leitura. Vou nua dentro das
páginas. Uma mulher é sequestrada por três homens. No começo, um apenas. Quer
ser tatuado. Ela sabe marcar, e marca bem. Ele a quer na sua casa, ela recusa.
Marcaram encontro num bar, ela não o conhece. No final, ele acaba
convencendo-a. Ela precisa de dinheiro, ele paga o dobro. Chegam os outros
dois. Violência pura. Mas o narrador dá indício de que há algo por trás. A
história vai acabar mal para os três capangas.
Em cidade pequena, quando se tem namorado, dá até pra sair nua, ou apenas um paninho leve sobre o corpo. Ele para num canto escuro da estrada, me come, voluptuoso. Vou adorando a incerteza.
Uma vez saí nua do carro, fiquei molhadinha, antes mesmo que me tocasse.
Noutra levou, de lembrança, minha calcinha. Mas o namorado do apartamento é
sério, trepa bem, como gente normal, e não vou dar ideia.
Cruzo as pernas, sobre o canapé, dentro da leitura. Por que
gosto de ler nua? Deve haver uma explicação. Treze e trinta. Largo o livro, ainda
sem saber o fim da tatuadora, vou à cozinha. A fome, fome nua. Comida na
geladeira. Há o micro-ondas. Tudo muito fácil. Ui, a campainha. Susto. Olho no olho mágico. É a vizinha. Acho que a
diarista da vizinha. Já estive com ela uma vez, fazia a faxina e me pediu um saco plástico, estava de biquíni! Agora vem vestidinha. Abro a porta. Oi, como vai.
Bem. Desculpe incomodar, é que vi a luz acesa, aí nunca tem ninguém. Sorrio.
Ela continua é você, a gente já conversou, tudo bem? Tudo bem, digo. Dessa vez
não quero nada, só vim dar um oi. Oi. Sorrio. Não deixo que me veja nua. Mas a
mulher tem bom faro. É bom esperar o namorado, preparada. Acaba a frase e dá
uma grande gargalhada. Não tenho resposta. O jeito é rir junto com ela. O
namorado hoje é o apartamento. Homem, só à noite, e não vou estar. Ela ri também.
Sempre se dá um jeito, há muitos homens por aí, completa e se vai. Tchauzinho.
Volto ao apartamento. Que mulher enxerida, e logo em Copacabana, onde as
pessoas são discretas, na Bulhões de Carvalho.
Sento no sofá, o prato e o garfo nas mãos. Minha amiga
trepando no terraço. As pessoas têm mais o que fazer! Meia hora depois, ainda
minha amiga. Perco, como ela, a vergonha.
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