domingo, abril 26, 2020

Não vai ficar grudada!

Gosto de andar pra lá e pra cá, ver meus amigos e conhecidos, vestindo uma sainha, blusinha ou um macaquinho. O macaquinho é melhor, peça única, por baixo o top, uma faixa branca, as pernas de fora, paisagem ensolarada a ser apreciada. As moscas gostam de se aproximar do mel, de beliscar aqui e ali, até que ficam grudadas, é como se debruçar sobre um precipício. E eu coladinha ao mel, minhas pernas morenas lustrosas.

Que susto! Ainda bem que meu amigo me salvou. E que amigo. Parei na Conselheiro Lafaiete, resolvida, a conversar com o porteiro de um dos prédios. Esses homens adoram uma mulher nua. Aliás, eu não estava nua, mas passou uma menina de biquíni, a caminho da praia. O homem arregalou os olhos. Na falta da menina, que não sabia e continuou não sabendo da existência dele, o porteiro voltou-se pra mim, olhos ainda arregalados, todo aquele sabor de loucura que a possibilidade do sexo traz. Já fazia um tempinho não desgrudava, ameaça latente, perguntou enfim se eu costumava ir a alguma festa. Gosto de forró, disse eu. Imaginem, uma dança quente, o homem agarra a mulher e a leva de um lado a outro, o par sempre grudado, o macho a apertar, a apertar até não poder mais. Tenho uma amiga que goza com isso. O tal porteiro, sangue quente, eu podia perceber, insistia às minhas coxas, apontava. Não sei se se dava conta de que eu me sentia nua. Como vou me cobrir, nuinha no Posto 6? Ensaiei algum movimento, mexi as mãos, ajeitei a parte superior do macaquinho, a bolsa a tiracolo, já acabara o serviço. Se fosse um artista de TV, acho que ia com ele pro apartamento escurinho, o ar desconhecido, cheiro de novidade mesmo em construção antiga.

Uma vez fui a um prédio onde se precisava puxar a grade dourada do elevador, só assim ele subia, não sei por que senti o arrepio, o mergulho no desconhecido. Levava uma roupa a uma senhora. Um homem bonito abriu a porta, disse que eu entrasse. Ai, imaginem.

Falei que tinha de ir, o porteiro piscou os olhos, sentiu que nada poderia fazer em relação ao seu desejo. Às vezes ficamos frustradas, porque nosso desejo não é realizado. No caso da entrega, o homem tão bonito e deixei escapar. No caso do funcionário do edifício, ao contrário, a mulher bonita, pernas de fora, o macaquinho a cobrir-lhe pequena parte do corpo, e ele sem poder fazer nada. Não se agarra uma mulher em Copacabana.

Do outro lado da rua passou o meu amigo. Foi o tempo de eu gritar oi e correr até ele. Este não vai me fazer mal, a praia dele é Ipanema, lá pela Farme de Amoedo. E tão bonito o meu amigo. Melhor com ele do que os olhos invasivos do porteiro.

Depois de me deixar na General Osório, todos os homens estavam a me olhar, e eu a beliscar o mel.

Cuidado Ivânia, não vai ficar grudada!

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