terça-feira, dezembro 27, 2011

E o rapaz nem notou

“Você não quer ir a uma festa hoje à noite?”, meu coração acelera-se ante a aproximação inesperada do rapaz.

“Onde?”, disfarço.

“Na Bay’s.”

“Na Bay’s?”

“Isso mesmo, você não gosta de lá?”. ele fala.

“Gosto, mas tenho namorado, acho que ele vai querer fazer outra coisa hoje à noite.”

“Que pena.”

“Mas não estou dizendo que não vou, verei o que posso fazer”, faço cara de corajosa.

“Ah, que bom! Sempre vejo você aqui na praia a essa hora, pensei em convidá-la”, olha nos meus olhos e depois abaixa o olhar na direção dos meus seios. Faço um movimento como se fosse submergir. “Você está sempre dentro d'água, até parece uma sereia.”

Digo que tentarei dar um jeito para ir à sua festa. Ele é interessante, e eu já o observo faz tempo. Quanto a ter namorado, pura mentira. Neste momento, não o quero próximo a mim.

Depois de me chamar de sereia mais uma vez, despede-se e se vai. Continuo meu banho de mar no Remanso, agora mais tranquila.

Contaria mais tarde à Jane. Não sobre o susto, mas sobre o convite. Ela conhece melhor do que eu os rapazes deste lugar. Caso eu ache conveniente, vou.

Permaneço na praia, dentro d’água. Mal sabe ele que posso ser considerada uma sereia de verdade.

No verão passado, uma senhora cinquentona me revelou seu segredo, que também passou a ser o meu. Quando ainda era bem jovem...

“Sempre tive o costume de usar biquíni, e dos bem pequenos. Certa vez mergulhei numa praia, a água estava tão fria! Você acredita que o choque do meu corpo com a temperatura baixa da água do mar me provocou um orgasmo? Sério. Acredite. Foi uma sensação tão intensa que jamais esqueci. Repeti o mergulho muitas outras vezes, mas jamais consegui sentir a mesma coisa. Cheguei até a tirar o biquíni dentro d’água.”

“Você ficou nua dentro d' água?”, assustei-me.

“Fiquei e às vezes ainda fico.”

“E o biquíni?”

“Enrolo num dos braços, faço de conta que é uma pulseira.”

“Ninguém nunca notou?"

“Não! E já conversei nua com um ou outro homem. Eles não percebem. Mas não espalhe, viu. Agora quando tiro o biquíni é porque passei a gostar de tomar banho de mar nua, também é uma espécie de orgasmo...”

Depois que ela se foi guardei o segredo só para mim, bem escondidinho.

No dia seguinte, bem cedinho, vim à praia e, pela primeira vez, usei uma pulseirinha de pano no meu braço direito. Adorei. Passei a repetir a ação todos os dias.

Agora, acho que me viciei. Não há um dia em que venha à praia e não fique pelo menos uns dez minutinhos nua. Meu orgasmo!

E o rapaz, o do convite, nem notou...

2 comentários:

Prof. Roque disse...

Muito bom seu conto, ou quase crônica de praia. Adorei o estilo leve de prosar. Visite meus espaços: www.proferoque.spaceblog.com.br, www.gostodeler.com.br (colunistas = Roque Weschenfelder) e www.recantodasletras.com.br/autores/roquealoisio

Fanzine Episódio Cultural disse...

Donzelas do Apocalipse

Sem pai, sem mãe,
Sem leite materno...

Seu estômago vazio
Pediu por comida:
Com uma arma carregada
Roubou uma vida.

Escondia-se na escuridão,
Disfarçava-se na luz.
Foi a uma igreja...
Rezar, pedir perdão?
Não! Para roubar um pedaço de pão.

O mundo o condenou.
Amor e carinho
Jamais encontrou.

A sociedade o execrou,
A margem da vida o adotou.
Foi condenado a percorrer
Um longo e tortuoso caminho:
O seu exílio.

Mas, não estava só!
De ambos os lados,
Lindas e afrodisíacas donzelas
O seguiam:

A angústia e a fome
A solidão e a morte.

Do livro (O ANJO E A TEMPESTADE) de Agamenon Troyan.