quarta-feira, março 28, 2012

Nem tocou no assunto

Margarida, escute o que aconteceu ao seu amigo alguns dias atrás; você que gosta de histórias, vai adorar.

Eu chegava à rua onde moro, eram mais ou menos três da manhã. Acabei de estacionar quando uma mulher se aproxima:

“Você pode me informar onde é o ponto do ônibus para a zona sul?”

“Fica na primeira transversal, basta descer esta rua e dobrar a direita que você o verá”, apontei a ela a direção.

Ela, porém, não se deu por satisfeita:

“Será que o local é perigoso?”

Olhei seu rosto. Era bonita e ia lá pelos trinta e poucos ou quarenta anos.

“Não, esse bairro é boêmio, sempre há gente na rua.”

Naquele momento, ouvimos um vozerio vindo da direção que eu lhe apontara.

“O que é isso?”, fez cara de preocupada.

“São pessoas se divertindo. A Lapa é aqui perto, sempre há música e festa.”

“Saí agora da casa de uma amiga, ela é idosa, sabe; se fosse mais jovem, pedia pra ficar até o amanhecer.”

“Moro aqui faz tempo, o local é muito seguro, nunca ouvi falar de problema algum.”

“Posso pedir a você mais um favor?”, continuou retendo-me sobre o passeio.

Olhei em volta, desconfiado. Será que a mulher armava algo contra mim? Sei que você dirá, Margarida: – és tolo, não vês que ela gostou de você? – Mas, naquele momento, achei a moeda grande demais.

“Pois não, se eu puder ajudar”, respondi curto, sem demonstrar facilidade.

“Será que me deixa ir ao toalete?”

O que eu deveria responder? Ela me acompanhou. Subimos o prédio. Saímos do elevador. Abri a porta do apartamento e fiz que entrasse à minha frente. Mostrei o banheiro.

“Agora você está mais distante do ponto de ônibus”, falei quando reapareceu no curto corredor que antecede a saleta, já havia ido ao toalete.

“É mesmo”, sorriu.

“Deseja mais alguma coisa?”

“Gostaria de beber um copo d’água.”

“Que tal água de coco? Tenho na geladeira”, ofereci.

“Ótimo, adoro.”

Sentou-se na poltrona de dois lugares e esperou pelo copo.

Após experimentar, completou: “uma delícia.”

Permaneceu uns minutinhos com o copo na mão direita, olhou-me e suspirou.

“Estou tão cansada.”

Sentei na cadeira em frente e esperei.

“Você ficaria aborrecido se me deixasse permanecer aqui até de manhã?”

Eu já esperava pela pergunta.

“Não fico aborrecido, não”, como já estava sem saída, completei: “se quiser, pode descansar na cama, é de casal.”

Pedi licença, fui ao quarto e me troquei. Ao voltar, ouvi sua voz de novo:

“Já que você me deixou ficar, será que teria uma camiseta pra emprestar.”

Só para provocar emprestei-lhe uma camiseta curta, mal lhe chegava às coxas. Mas ela tirou a roupa e vestiu a camiseta sem demonstrar vergonha alguma.

Foi minha vez de ir ao banheiro. Encontrei sua roupa dependurada no apoiador, que fica perto do boxe. Estavam lá todas as peças, inclusive calcinha e sutiã.

Quando voltei ao quarto, ela já dormia. Deitei ao seu lado e adormeci também.

Não me pergunte, Margarida, o que aconteceu entre nós. Você é uma mulher experiente, há de já saber o fim da história. Só mais um detalhe. Antes de dormir, escondi-lhe a calcinha.

Ao se despedir pela manhã, beijou-me e apenas falou: “obrigada, volto qualquer hora dessas, ok? Anotei o número do seu telefone.”

Sobre a calcinha, Margarida, nem tocou no assunto.

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